Que a JBS sofreria com a deterioração das margens, poucos analistas duvidavam. Não à toa, as ações já caíram 50% em doze meses. No balanço divulgado no início da noite de ontem, a firma dos irmãos Batista veio com um resultado operacional abaixo do consenso, sinalizando que o cenário adverso ainda vai levar tempo para passar.
A margem no negócio de carne bovina na América do Norte, unidade responsável por quase 30% da receita, recuou ao menor nível desde 2016, refletindo o gado mais caro. No quarto trimestre, a JBS Beef fez uma margem Ebitda de apenas 2,1%. Antes da divulgação, o time de analistas liderado por Thiago Duarte, do BTG Pactual, projetava uma margem de 3,5%.
Num momento de economia global claudicante (o resgate do Credit Suisse não deixa mentir), juros nas alturas e inflação persistente, operar uma indústria sob forte pressão de margens sem atrair um comportamento reticente do investidor seria impossível. Estrutura de capital é o nome do jogo.
Custo da dívida
“Tendem a falar só de dívida, mas o que importa é a capacidade de pagamento, que depende do seu custo de dívida e prazo de amortização. Uma coisa é uma dívida com custo médio de 14%. Outra é um custo médio de 5%. É bem diferente”, disse Guilherme Cavalcanti, o CFO da JBS, em entrevista ao The Agribiz.
Em dezembro, o custo médio das dívidas da JBS estava em 5,7% ao ano. A parcela em dólar, que responde por quase 90% do endividamento total, marcava 4,6%, em média. A estrutura das dívidas (86% no mercado de capitais, com taxas previamente fixadas) dá previsibilidade.
“A despesa financeira está no nosso controle e não muda muito. Ela é da ordem de US$ 820 milhões por ano”, disse Cavalcanti. Além do serviço da dívida, a JBS gasta US$ 300 milhões com arrendamentos por ano. Em capex, são mais US$ 1 bilhão de manutenção e US$ 500 milhões para expansão — incluídos os aportes na Seara e na fábrica de salame dos Estados Unidos.
Geração de caixa
Com essas contas, Cavalcanti dá uma medida do conforto da JBS para atravessar a fase mais adversa do mercado. Para chegar ao breakeven de caixa, um Ebitda de US$ 3 bilhões ou um pouco menos já basta. Para se ter uma ideia da magnitude, a JBS fez US$ 6,7 bilhões no ano passado e não gera menos de US$ 3 bilhões por ano há uma década — a última vez foi em 2013, quando o Ebitda atingiu US$ 2,8 bilhões.
A geração de caixa da JBS reflete uma melhora substancial das margens ao longo dos anos, mostrando que a estratégia de agregar valor desde o IPO em 2007 vem funcionando. De lá para cá, a empresa deixou de ser apenas um frigorífico de bovinos para se tornar uma das maiores companhias de alimentos do mundo. As margens, que estavam próximas de 5% entre 2008 e 2012, ficaram mais próximas dos dois dígitos entre 2018 e 2022.
Repetir esse nível de margens parece um tanto improvável neste ano diante da piora do cenário macro e do ciclo da pecuária nos Estados Unidos — haverá menos gado disponível por um tempo razoável —, mas a grande dúvida mesmo é saber quando e em que nível as margens do negócio de bovinos na América do Norte vão se normalizar.
Novo normal?
A margem de mais de 20% da pandemia, sem dúvida, não volta mais, mas os 2,1% registrados pela JBS Beef no quarto trimestre talvez sejam muitos baixos. Se permanecer nesses níveis ao longo de todo o ano, a JBS poderia ver a alavancagem (dívida líquida/Ebitda) chegar a 3,2 vezes, como mostrou uma análise de sensibilidade publicada pelo BTG Pactual em fevereiro.
Para Gilberto Tomazoni, CEO global da JBS, as margens históricas da indústria americana de carne bovina são mesmo de um dígito, mas o nível normalizado das margens deve ser algo mais próximo de 5% — “mid-single digits”, segundo o executivo — do que dos atuais 2%. O prazo para isso, no entanto, é incerto.
Daqui a pouco, às 9h, começa a teleconferência da JBS com analistas para falar dos resultados.