Paris

Na Olimpíada de Paris, sustentabilidade é com o chapéu alheio

Paris anunciou que irá reduzir a oferta de carne nas refeições dos Jogos Olímpicos. O motivo? A carne seria uma ameaça ambiental

Recentemente, uma notícia me deixou entristecida, mas não surpresa: a organização dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 anunciou que irá reduzir a oferta de carne nas refeições do evento. A saber, são aproximadamente 13 milhões servidas de refeições ao longo dos 19 dias de jogos.

O motivo? A carne seria uma ameaça ambiental. A grave acusação vem na contramão de qualquer embasamento técnico-científico. Para afirmar isso, devemos partir do princípio óbvio de que animais não são carros.

Aliás, animais são organismos vivos intimamente conectados aos seus respectivos ecossistemas. A produção agropecuária se baseia em ciclos biogeoquímicos, como o da água e o do carbono. Já dizia Lavoisier: “nada se cria, nada se perde. Tudo se transforma”. Por isso, ao comparar animais a motores a combustão, que removem o carbono do solo para despejá-lo na atmosfera, o debate perde imediatamente qualquer racionalidade.

Em 2018, um amplo estudo por pesquisadores da Michigan State University concluiu que pastagens bem manejadas são capazes de aumentar o sequestro de carbono por conterem rica microbiota e seus componentes consequentes. Com isso, há maior armazenamento de água e maior produção de vegetação.

É importante notar que, de todo o carbono que há disponível, 65% está armazenado nos solos, 21% estão na atmosfera e 15% se concentra na estrutura de plantas e animais. Por isso, já que o carbono, que vale aqui dizer, é tudo, já que justamente ele virou o problema, é possível afirmar que o potencial dos solos em sequestrar esse mesmo carbono é imenso.

Olímpiadas, carne

Em outras palavras, a pecuária promove um importante papel na remoção de carbono da atmosfera e o aloca no solo e pastos.

O Brasil vem paulatinamente reduzindo sua área de pastos degradados como uma resposta à pressão econômica da atividade pecuária, afinal, fazendas degradadas não dão dinheiro. Nesse caso, o pecuarista ineficiente acaba abandonando a atividade e cedendo essa área para alguém que, de fato, produza sobre ela. Há estudos que apontam que de 2000 para cá, a representatividade de pastos degradados caiu de 31 para 17,5% do total de pastagens no Brasil.

Também vale lembrar que, por aqui, as áreas de pastagem caíram de 190 milhões de hectares para os atuais 160 milhões de hectares nas últimas décadas.

O Brasil também tem se mostrado eficiente em reduzir a idade de abate dos animais e isso faz com que emitam menos metano ao longo de sua vida.

Por fim, a história da humanidade e o estudo evolutivo mostram que o homem só evoluiu de homo erectus para homo sapiens através da ingestão de carnes. Sabe-se amplamente que a carne é aliada estratégica da prática esportiva por servir de eficiente fonte para a geração de massa muscular, especialmente para atletas de alta performance. Além de fonte proteica, aminoácidos essenciais e o complexo vitamínico B está especialmente contido na carne vermelha, além de minerais como ferro, zinco, selênio, fósforo, sódio e magnésio.

A pecuária é uma excelente maneira de produzir alimentos e também para adotar como estilo de vida, a melhor forma que eu conheço de usar e melhorar qualidade do solo, o ponto exato em que se debruça a própria civilização.

Iniciei a coluna afirmando que me entristeci e agora explico o motivo: é triste que um evento tão tradicional, tão amplamente divulgado e conhecido se valha de informação não científica para promover sustentabilidade com o chapéu dos outros.

Fica aqui a minha sugestão ao comitê organizador: que tal se todos os participantes do evento se locomovessem em meios de transporte que não emitam carbono? Considerando que a nossa própria respiração emite esse elemento, mesmo que todo mundo fosse de barquinho a remo, seria bem difícil.

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Lygia Pimentel, colunista de The AgriBiz, é médica veterinária, economista e sócia-fundadora da Agrifatto.