Enquanto os boatos envolvendo a Agrogalaxy circulavam freneticamente no WhatsApp, a equipe de Julia Bretz já tinha esmiuçado os números da rede de revendas, com um nível de sofisticação que mostra porque a JGP — a gestora criada por André Jakurski — é uma referência em análise de crédito privado.
Numa análise que inclui um monitoramento constante da saúde de crédito corporativo, com dados diários da Serasa sobre protestos e diálogo constante com os executivos das companhias que compõem o portfólio, a sócia e gestora de crédito da JGP já tinha entendido que a situação da Agrogalaxy era muito mais saudável do que as mensagens apócrifas indicavam.
No penúltimo relatório gerencial dos dois Fiagros da gestora (JPGX11 e JGPT11), a mensagem era bem clara. “Nosso monitoramento diário da Serasa nos permite ter acesso imediato a apontamentos das empresas nas quais os fundos têm exposição, de modo a anteciparmos potenciais eventos de crédito […]. Esse acompanhamento não nos trouxe nenhum alerta para o Agrogalaxy”, dizia o relatório, acompanhado de números e gráficos que sustentam a conclusão.
Nesta semana, a JGP voltou à cena. Desta vez, jogando luz sobre outro assunto que tem circulado nas rodas de conversas entre gestores de Fiagro. Afinal, qual o risco de dar crédito diretamente ao produtor rural? Para entender o cenário, a área de crédito da gestora fez uma análise da volatilidade da rentabilidade dos agricultores em Mato Grosso.
“É claro que estamos dentro de um ciclo, mas estamos falando de uma parte do setor que está acessando o mercado de capitais mais profundamente pela primeira vez. Isso pode assustar alguns investidores e deveria acender a luz amarela”, disse Bretz ao The Agribiz.
A partir de premissas de custos financeiros elaborada pela JGP — a composição entre capital próprio, recursos subsidiados, sistema financeiro e barter pode ser acessado aqui —, a gestora calculou o que aconteceu com as margens de lucro dos produtores na safra 2022/23.
Na soja, os preços caíram 18% e os custos subiram 53%, o que fez a margem de lucro por hectare desabar 61%, dos impressionantes R$ 7,1 mil por hectare da safra anterior para R$ 2,7 mil.
“Mesmo que a base de referência seja alta, o educacional é que sem uma governança robusta e gerenciamento de riscos, o produtor fica exposto a uma volatilidade que pode ser arrasadora. Sem o devido planejamento financeiro, adequação de estrutura de capital e gerenciamento de liquidez, viradas de ciclo como a que estamos enfrentando neste ano podem determinar a descontinuidade operacional de muitos produtores”, alerta a JGP.
A situação para os produtores de milho pode ser ainda mais turbulenta, com margens até negativas. No cenário de preços do milho a R$ 55, a margem ainda ficaria positiva, mas em apenas R$ 603 por hectare. Numa simulação estressada de preços, em que a JGP faz as contas com o milho a R$ 30 por saca em Mato Grosso, a margem de lucro sairia de R$ 3,1 mil por hectare na safra 2021/22 para um prejuízo de R$ 1,8 mil por hectare.
“O segundo cenário, apesar de parecer bastante dramático, infelizmente, poderá ser concretizado para boa parte da produção de milho neste ano. Em consultas recentes a players do Mato Grosso, já auferimos vendas sendo feitas neste nível de preços (aproximadamente R$ 30/saca)”, completou a gestora, no relatório.
Sinal amarelo
Num mercado ainda novo como é o de Fiagro, é preciso muito cuidado para não traumatizar os investidores sob o risco de atrasar o crescimento de um negócio promissor. Para Julia Bretz, os sinais de inadimplência na indústria de fundos de agro já deveriam acender o sinal amarelo.
“Temos oito casos relatados na indústria. São dez Fiagros envolvidos nesses oito casos que mapeamos. Isso soma R$ 240 milhões. Quando você olha o PL de R$ 13 bilhões da indústria, estamos falando de 1,8% de inadimplência. É para acender a luz amarela nos investidores”, disse a gestora.
Não à toa, os dois Fiagro da JGP preferem créditos nos elos antes ou depois da porteira, sem exposição direta aos produtores. “Temos exposição através de revendas e cooperativas que agregam um pool de produtores, mas com governança própria”, diz.
No portfólio de Fiagro, a JGP tem papéis como os CRAs de revendas como Agrogalaxy, Nova Futura, Belagrícola e Fiagril; frigoríficos como Minerva, cooperativas como Coplana e Coagril, e FS, de etanol de milho.
Juntos, os dois Fiagro da JGP (um listado na bolsa e outro na Cetip) somam um patrimônio líquido de R$ 274 milhões. Na última distribuição de dividendos, referente aos resultados de junho, o JPX11 pagou o equivalente a 146% do CDI de uma aplicação tributável. O JPGT11, 149%. Os dividendos de Fiagro são isentos de imposto de renda.