Fintech

BTG financiando pequeno produtor? A Syngenta tornou possível

Fábio Neufeld, head de soluções financeiras da Syngenta, vê potencial para sua fintech chegar a R$ 6 bilhões

Um pequeno produtor rural tomando crédito no BTG Pactual. A cena seria praticamente impossível há alguns anos, mas a Syngenta achou um jeito de tornar essa articulação possível, destravando uma carteira de crédito de potencial bilionário.

O Syde, fintech lançada há seis meses pela Syngenta, é um esforço da multinacional para conectar o mercado de capitais (dos bancos às gestoras de Fiagro, incluindo as agfintechs) com as revendas agrícolas parceiras.

Pela capilaridade da Syngenta, que vende seus produtos — diretamente ou via revendas e cooperativas — para um contingente de mais de 1,5 milhão de agricultores, a fintech facilita a originação de crédito no campo para as intuições financeiras.

Unindo as duas pontas, o Syde vislumbra chegar a R$ 6 bilhões em crédito em três a cinco anos, o que a equipararia em porte à tradicional área de soluções financeiras da Syngenta.

“Em três a cinco anos, o potencial é igual. É bem relevante”, disse Fabio Neufeld, profissional recrutado pela Syngenta para liderar o Syde, em entrevista ao The Agribiz.

Com passagens por Itaú BBA e Rabobank, o executivo é um antigo conhecido da área de estruturação de crédito agro na Syngenta. Quando estava no banco holandês, ajudou a estruturar o primeiro produto financeiro para a companhia de insumos agrícolas.

Pioneirismo

Quando o assunto é a aproximação entre agro e mercado de capitais, a Syngenta é uma pioneira. Em 2012, a multinacional suíça — hoje controlada pela ChemChina — emitiu o primeiro CRA pulverizado do mercado, levantando R$ 85,5 milhões com investidores pessoas físicas.

De lá para cá, a área de soluções financeiras da Syngenta já levantou R$ 11,5 bilhões no mercado de capitais, por meio da emissão de CRAs ou FIDCs. Só no ano passado, foram R$ 6 bilhões, distribuídos entre três FIDCs encarteirados por grandes bancos e uma operação de financiamento de estoques.

A área de soluções financeiras e o Syde aliviam o balanço da Syngenta e das revendas, é claro, mas o negócio também funciona como uma ferramenta comercial. “Às vezes, uma revenda pode ter restrição de capital de giro ou limite de crédito por produtor”, diz Neufeld.

Ao atrair um banco, Fiagro ou agfintech para dar o funding, a revenda parceira pode continuar vendendo e, por consequência, a própria Syngenta. Sem esse modelo, a venda poderia acabar em outra revenda que atua com um concorrente da multinacional.

Como funciona o Syde

Para o produtor rural, o Syde funciona como uma conta digital com serviços que incluem TED, boleto e, em breve, PIX (a infraestrutura foi viabilizada pelo serviço de bank as a service da QI Tech). Um agricultor só consegue se cadastrar no aplicativo se for cliente de uma revenda parceira da Syngenta.

A principal funcionalidade do Syde é a área de crédito. Nela, os produtores podem pedir uma avaliação para comprar defensivos e dizer quando querem pagar (o prazo safra é de um ano, aproximadamente).

Em menos de uma semana, os parceiros de funding voltam com uma proposta pré-aprovada, sinalizando a taxa de juros da operação. No futuro, o aplicativo também vai fazer algum juízo de valor sobre as propostas, sinalizando ao agricultor qual oferece as melhores taxas.

BTG Pactual e AL5 Bank (o banco digital da Amaggi) já são parceiros de funding do Syde, mas outras instituições devem entrar no ecossistema em breve.  Segundo Neufeld, dois fundos — incluindo um Fiagro de uma das principais agfintechs do país — devem se plugar ainda neste mês.

A Farmtech também está estruturando um fundo exclusivo para dar funding via Syde. “Estou falando com todas as agfintechs”, disse Neufeld, mencionando TerraMagna e Agrolend.

Modelo de negócio

No modelo de negócio do Syde, os parceiros ganham acesso à ampla base de agricultores que compram produtos da Syngenta. Em contrapartida, há um acordo de revenue share, com o Syde ficando com uma parte da receita.

Com o Syde, a Syngenta consegue diversificar as fontes de financiamento da agricultura. Usualmente, a companhia possui quatro formas para vender: à vista, barter (troca de insumos por grãos), a prazo e por meio das soluções financeiras (sejam os FIDCs que já existiam e agora também os parceiros da fintech).

O risco de crédito das operações viabilizadas por meio do Syde fica com o parceiro que empresta os recursos. Daí a importância dos modelos de análise criado pelos bancos e agfintechs.

Num momento em que a inadimplência na agricultura aumentou, reflexo da forte queda dos preços dos grãos e do desbalanceamento na oferta de insumos, os novos entrantes no crédito agrícola vão poder testar seus modelos de crédito. “Muita gente corajosa entrou nesse mercado. Vamos ver como esses modelos funcionam em um ano mais complicado”, resume Neufeld.