Quando era gestora de uma propriedade de café na região do Cerrado Mineiro, uma das questões que mais me incomodava era a vulnerabilidade da cultura em relação aos eventos climáticos. Tudo era feito seguindo as orientações agronômicas, os gotejadores eram revisados a cada safra, as análises de solo estavam em dia, os implementos à disposição e a equipe era bem treinada. Mas eis que a falta de chuvas prejudicava o enchimento dos grãos e a previsão de safra era frustrada.
Quando olhava para as médias de chuvas mensais, o acumulado parecia estar dentro da normalidade. O que comecei a perceber é que a distribuição estava mudando. Chovia muito em um curto espaço de tempo. Além disso, aumentava a quantidade de dias por ano onde as temperaturas máximas estavam acima do normal, o que interrompia o ciclo de fotossíntese da planta, prejudicando a produtividade.
Estamos iniciando um novo ciclo que vai demandar outras habilidades dos produtores e empresários do agronegócio em geral. O planejamento das operações e decisões de investimentos precisam incluir os impactos de riscos climáticos e será preciso rever a genética, variedades, o uso de novos fertilizantes e insumos, a mecanização, os sistemas de manejo e as datas de plantio. A água e a temperatura média vão definir os mapas de produção.
Quando eu decidi deixar a gestão da fazenda de café, quis construir algo que pudesse ajudar a remunerar os produtores que eram sustentáveis e também os que quisessem melhorar o manejo e se regularizar perante os órgãos ambientais.
Hoje, sou cofundadora e CEO de uma climate tech, a SALVA, que busca viabilizar a transição do agronegócio para sistemas alimentares mais sustentáveis, resilientes e de baixo carbono.
Crédito mais barato
O acesso a crédito e linhas de financiamentos com taxas de juros mais baixas serão fundamentais para acelerar esse movimento e a tecnologia será responsável por garantir as conformidades e regularização das propriedades, além de trazer a escala e agilidade que o tema exige.
A educação será outro ponto importante, mas temos no Brasil produtores que buscam cada vez mais a capacitação e adesão às melhores práticas (é só observar a rapidez do crescimento do mercado de biológicos) e às práticas de agricultura climaticamente inteligente.
Mas os benefícios financeiros para esses produtores precisam chegar no curto prazo. Enquanto não tivermos um mercado de créditos de carbono bem estabelecido para a agricultura, o mecanismo mais eficaz será o acesso às linhas de crédito mais baratas, com pagamento por serviços ambientais prestados.
Entre 2013 e 2022, o Brasil perdeu quase R$ 290 bilhões da produção agropecuária. Em números globais, estima-se que as mudanças climáticas tragam um prejuízo anual de US$ 23 trilhões de dólares. Investir em mecanismos de adaptação e mitigação será essencial para a perenidade dos negócios, assim como a colaboração entre instituições financeiras, agroindústrias e corporações serão a base para manter os preços dos alimentos baixos e, ao mesmo tempo, remunerar os agricultores.
Nessa guerra contra a crise climática, todo exército é bem-vindo.
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Fiquei muito contente pelo convite que recebi para escrever uma coluna mensal no The AgriBiz. Atuo profissionalmente no agronegócio há cerca de 25 anos e tenho presenciado as imensas mudanças pelas quais o setor tem passado. Até a próxima coluna!