Chegou a vez dos Fiagros de terra. Para a gestora AGBI, uma pioneira quando o assunto é levantar fundos de investimento para a compra de terras agrícolas, a recente queda no preço das fazendas abriu uma oportunidade de bons retornos para investimentos imobiliários rurais.
“Estamos no melhor momento”, disse Gustavo Fonseca, sócio-diretor da AGBI, que estreou no mercado de terras em 2012. “Temos encontrado bons ativos a preços mais baixos e com menor concorrência”, contou em uma conversa com The Agribiz. Segundo ele, há menos competição na compra de terras porque os grandes operadores estão focados na geração de caixa em um cenário de queda no preço das commodities e crédito mais restrito.
Depois de ter disparado nos últimos quatro anos — acompanhando a alta dos grãos —, o preço de propriedades rurais em regiões ainda consideradas como fronteiras agrícolas (como o sul do Pará, Tocantins e até algumas regiões de Mato Grosso) mudou de direção e agora está caindo.
“Tudo foi reajustado para baixo”, disse Fonseca. “Na safra 2021/22, estavam pedindo de 300 a 400 sacas de soja por hectare em fazendas de pasto degradado — e a soja estava cara. Agora, não é mais comum falar nesses níveis. Vemos negociações entre 200 e 250 sacas por hectare”, afirma.
O hectare produtivo, que chegou a custar entre 500 e 650 sacas, voltou a ser negociado entre 400 e 500 sacas de soja. Desde janeiro de 2022, o preço da soja caiu 14%. Desde o pico em março do ano passado, a commodity perdeu 37% do valor em Paranaguá, segundo o Cepea.
Menor liquidez
A acomodação no preço da terra começou em meados de 2022 e se intensificou neste ano, com áreas nas regiões de fronteira apresentando uma queda de preço mais rápida em comparação a áreas já consolidadas. No auge, fazendas na Bahia estavam sendo negociadas pelo mesmo preço de Mato Grosso. Agora, a histórica diferença de preço entre as regiões retornou. “Voltamos para um ambiente mais racional”, disse Fonseca.
Dados da S&P Global confirmam a percepção da AGBI. No segundo trimestre, o preço médio da terra no Brasil caiu 0,54% em relação ao primeiro trimestre e deve continuar em queda.
“A perda de liquidez é um indicativo de que o mercado pode recuar para um patamar de preços mais baixos”, disse a consultoria em relatório recente. A S&P reportou uma desaceleração no número de negócios no último trimestre, embora ainda calcule uma valorização de 4,6% em relação ao segundo trimestre de 2022 na média nacional. Em cidades como Barreiras, no oeste da Bahia, e Rondonópolis, na valorizada região da BR-163 em Mato Grosso, os preços caíram.
Oportunidades
Com o ambiente mais favorável, a AGBI acertou a compra do primeiro ativo de seu novo fundo, o AGBI III Carbon Fiagro Verde. O contrato de compra e venda da fazenda em Mato Grosso foi assinado há seis meses, e o negócio está em fase final de diligência, o que inclui não só a revisão de documentos, mas também análise de solo, engenharia florestal etc. “É um processo realmente longo”.
Outras duas fazendas, também em Mato Grosso, estão em negociação. Nesta semana, Fonseca volta para o Estado para uma nova avaliação que pode resultar em proposta firme. Com mais de 900 fazendas mapeadas no Cerrado, o banco de dados montado pela AGBI desde o início das operações, em 2012, é o principal ativo da gestora, diz Fonseca. “Conseguimos ser muito assertivos. Já vou direto para as fazendas que estão dentro da tese do fundo.”
Carbono
Todas as fazendas que integrarão o portfólio do novo fundo passarão por um processo de medição de carbono no solo. É um passo além na tese da gestora, que sempre contemplou a sustentabilidade. Com o mercado de créditos de carbono ainda incipiente, o retorno com esse ativo ainda é incerto, mas tem atraído investidores mais preocupados com a sustentabilidade.
“Alguns investidores de impacto tem olhado para o nosso fundo, mas o nosso objetivo final não é a sustentabilidade. O resultado vem da transformação do pasto degradado para a lavoura”, diz Fonseca. “Para nós, o carbono é o mecanismo que vai viabilizar maior liquidez e a certeza de que se trata de um projeto sustentado na transformação de pastagem degradada”.
De pasto a grãos
Desde a criação do primeiro veículo da gestora, em 2012, a tese da AGBI é levantar recursos para comprar pastagens degradadas, transformá-las em terras agricultáveis e vendê-las anos depois —normalmente dez anos— capturando a valorização no preço da terra na frente.
A conversão do pasto em área agrícola é feita por um arrendatário, que tem como estímulo uma carência nos primeiros anos e descontos regressivos no valor de arrendamento nos seguintes. A ideia é apoiar financeiramente o produtor para que possa investir na transformação da terra. Por isso, não há pagamento de yield ao investidor; o retorno é apenas sobre o capital investido. “Não se trata de um veículo de renda, mas sim de um veículo de desenvolvimento de longo prazo”, diz Fonseca.
O arrendatário pode comprar a terra ao final do período de investimento, normalmente dez anos, mas não tem preferência. Apesar do interesse do produtor em ficar com a fazenda, nos dois veículos anteriores da AGBI as propriedades foram adquiridas por grandes empresas com operação nas proximidades.
“Grandes grupos ofereceram preços mais altos do que o produtor”, conta. No primeiro veículo de investimento, formado via S.A. com recursos de familiares e de amigos em 2012, o retorno foi de 3,5 vezes o capital investido. O segundo, lançado em 2015 via FIP (Fundo de Investimento em Participações), teve um múltiplo foi de 2,4 vezes. O desinvestimento de ambos ocorreu em 2021.
Capital estrangeiro
Para o seu primeiro Fiagro, a AGBI já levantou R$ 80 milhões com investidores brasileiros e pretende chegar a R$ 150 milhões até o final deste ano —a segunda rodada começa em setembro. Um outro veículo espelho destinado exclusivamente a investidores estrangeiros vai coexistir com o primeiro. Nele, a meta é captar US$ 150 milhões (R$ 730 milhões pela cotação de hoje). A divisão em dois veículos tem o objetivo de facilitar ao regulador a identificação do que é recurso estrangeiro e de brasileiros.
“O fundo brasileiro vai ser sócio do estrangeiro e nós teremos 3% de todo o negócio para garantir o controle brasileiro das terras”, disse Mário Lewandowski, diretor de novos negócios. “A nossa estrutura de FIP permite a emissão de ações preferenciais e ordinárias. Isso faz com que a gente tenha volume de capital estrangeiro com o controle nacional”, acrescentou.
Para Lewandowski, que esteve na recente missão do ministro Carlos Fávaro a Abu Dhabi e Riad, o momento é “muito propício” para a captação de recursos estrangeiros visando a conversão de pastagens degradadas em áreas agricultáveis.
“Com a COP 28 em Dubai, o interesse pelos árabes por agricultura sustentável tem aumentado bastante”, disse. “Vemos muito apetite para investimentos em agro no Brasil.”