Quando criou a InCeres, há dez anos, o agrônomo Leonardo Menegatti tinha o sonho de impactar agricultores em outras partes do mundo. Se há uma década o sonho parecia distante demais, nesta sexta-feira ganhou ares de realidade com o anúncio de compra da startup pelo grupo sueco Husqvarna.
A plataforma digital de agricultura de precisão da InCeres, uma investida da SP Ventures, será a base de uma vertente de negócios que a multinacional decidiu desenvolver para fornecer máquinas inteligentes a pequenos agricultores.
Hoje provedora de dados para planejamento de nutrição e manejo do solo, a InCeres deve, no futuro, reunir informações dos principais pilares da agricultura: clima, irrigação, proteção de cultivos, máquinas e, claro, o solo — onde tudo começou.
“Eu construí a arquitetura tecnológica da InCeres pensando exatamente numa plataforma capaz de unir todos esses negócios por meio de dados. Ela é perfeita para suportar essa visão de futuro da Husqvarna de integrar inteligência digital com as máquinas”, disse Menegatti em entrevista ao The AgriBiz. “Com esse deal, vamos ampliar o alcance da InCeres.”
Num comunicado divulgado nesta sexta-feira sobre a operação, a Husqvarna chamou a combinação da plataforma da InCeres com as suas soluções mecânicas de “disruptiva”.
O objetivo, no final do dia, é munir o agricultor de dados e ferramentas para que ele possa tomar as melhores decisões em busca de maior produtividade e rentabilidade. Com o crescimento da agricultura de precisão nos últimos anos, grandes empresas já estão bem servidas em quantidade de ferramentas — enquanto o pequeno agricultor continua carente de soluções mais apropriadas ao seu perfil.
“O desafio de levar assistência técnica a esse público é gigantesco. Você precisa de uma camada tecnológica muito bem trabalhada para atender as necessidades dele”, explica Menegatti. Esse será o próximo passo da empresa: investir no desenvolvimento de novas camadas de tecnologia que possam tornar a plataforma de dados mais acessível ao agricultor familiar.
Uma longa conversa
O valor da aquisição, que contempla a totalidade das ações da InCeres, não foi divulgado. Menegatti revelou, no entanto, que as conversas com a Husqvarna começaram há mais de dois anos nos corredores do Agtech Garage, em Piracicaba. Parecia que tudo ia dar errado.
“A Husqvarna começou a fazer uma avaliação do mercado e eu fui lá fazer um pitch. Eram várias outras empresas e eu era o último. Tudo atrasou e eu fiz o melhor que podia no tempo que eu tinha — e que era pouco. Precisava buscar os meus filhos na escola”, lembra Menegatti. “Mas deu certo, foi legal e a gente foi amadurecendo.”
Na primeira etapa das conversas, de validação estratégica, já ficou claro o alinhamento entre as empresas. A Husqvarna, fabricante de máquinas e implementos, tem foco no pequeno agricultor. E a InCeres, que vinha trabalhando com cooperativas, já sabia o tamanho do desafio de dados e automação para transformar algo complexo em simples, conta Menegatti.
É uma experiência que vem de longa data: mesmo antes de fundar a InCeres, o empresário já era um dos precursores em agricultura de precisão no País. Em 2002, quando pouco se falava no tema, Menegatti criou a APagri, uma consultoria agronômica especializada em análise de solo. Cresceu, ganhou escala, inaugurou o seu próprio laboratório de análise de solo.
Durante a gestão da consultoria, Menegatti identificou um gargalo, que deu origem à sua nova empresa. “Tive a visão do que seria a InCeres em 2007, quando o conceito de big data, computação na nuvem ainda nem existia”, conta. “Via que estávamos lidando com todos os dados de forma muito trabalhosa e que o nosso desafio era ter um grande banco de dados.”
Ao ver o potencial do negócio e criar o primeiro protótipo para processamento de dados, Menegatti decidiu separar essa nova vertente dentro da APagri. Depois de fazer um spin off, o empresário deixou suas funções na consultoria para se dedicar integralmente à InCeres.
Foi aí que apareceu a SP Ventures, gestora de venture capital fundada por Francisco Jardim, com um investimento de R$ 2,5 milhões na startup. Dois anos depois, quando a InCeres fez outra rodada, a SP Ventures dobrou a aposta. Agora, chegou a vez dos suecos.