Usinas

Para Tereos, incêndios em SP tiveram motivação criminosa

Pierre Santoul, CEO do grupo francês no Brasil, afasta envolvimento de produtores nos incêndios, que já causaram prejuízo de R$ 100 milhões à produtora de açúcar e etanol

Fuligem, piora da qualidade do ar, fumaça. Passar imune a esses efeitos em São Paulo nas últimas semanas foi quase impossível — um resultado da proporção que o fogo tomou no Estado. No acumulado da safra até agosto, queimaram cinco vezes mais hectares do que a média dos últimos cinco anos, de acordo com Pierre Santoul, CEO da Tereos. Na visão do executivo, tamanho impacto não vem apenas do clima seco, mas é também consequência de ações criminosas.

“Quando você analisa o perfil dos incêndios, pela quantidade de áreas onde o fogo pegou, tão próximos, não há dúvidas disso. Já passamos anos de seca similares, sem incêndios desse tamanho”, afirmou Santoul ao The AgriBiz, em evento realizado pela companhia na segunda-feira para discutir o futuro da descarbonização.

Não é uma opinião isolada. O secretário de Agricultura de São Paulo, Guilherme Piai, afirmou na semana passada, durante evento em São Paulo, que aproximadamente 90% dos incêndios registrados nas últimas semanas no Estado têm origem criminosa.

Diante da miríade de informações que tem se espalhado a respeito de possíveis culpados, Santoul se limita a dizer que não acredita que o próprio setor tenha se engajado nas queimadas, tendo em vista o saldo negativo para agricultores e usinas. “Ninguém quer colocar em risco seus ativos biológicos e a vida de seus colaboradores”, afirmou.

Apesar da proporção do fogo, nenhum colaborador da cooperativa francesa ficou ferido. Os principais impactos devem ser vistos nos índices de produtividade, além das consequências financeiras trazidas pelo fogo. 

Durante o último mês, 10% da área da Tereos (entre própria e de fornecedores) queimou, provocando um impacto financeiro de R$ 100 milhões — dinheiro usado principalmente para tratar novamente a terra que já havia sido preparada, além de perda de TCH e necessidade de replantio. Mas, há consequências maiores à vista.

Ao todo, 1,7 milhão de toneladas de cana foram afetadas pelas queimadas dentro da Tereos. Tendo em vista a capacidade de processamento de 100 mil toneladas por dia, foram necessárias duas semanas para processar toda a cana afetada. “Estamos processando cana que queimou em 23 de agosto”, citou o executivo. Segundo ele, não será possível aproveitar toda a cana afetada pelo fogo.

Menos açúcar

Outra consequência das queimadas é que o menor mix de produção de açúcar, que já vinha sendo comprometido por condições específicas desta safra. Santoul disse que a Tereos não deve conseguir chegar aos 70% de mix açucareiro sinalizado anteriormente. Há o risco, ainda, de a companhia ficar ligeiramente abaixo da média do ano passado, de 67% do uso da cana para a produção do adoçante.

Sob uma perspectiva de setor, a companhia se coloca na ponta mais pessimista de estimativas do setor relacionadas à produção para a safra atual, mantendo a perspectiva de 590 milhões de toneladas, podendo ficar ainda menor, num cenário mais estressado de clima na próxima safra, chegando a 525 milhões.  

O canavial no ano que vem

Além dos prejuízos atuais, a Tereos ainda vai colher consequências das queimadas por um bom tempo. Do lado mais imediato, ficam preocupações em relação à produtividade dos canaviais no ano que vem: nesta safra, a cana foi plantada após um ano de excelentes condições meteorológicas para o cultivo, um cenário que não deve se repetir em 2025.

Olhando em médio prazo, o ciclo de produção da cana — que dura, em média, sete anos — foi totalmente afetado onde houve incêndios. O replantio já está sendo feito em diferentes áreas, mas fato é que o ciclo agronômico da planta começou do zero, algo que também não é positivo na visão do executivo. 

Áreas de preservação ligadas à Tereos também queimaram. Santoul afirmou que 2 mil hectares desse tipo foram afetados. “Temos uma obrigação de reflorestamento pela Cetesb e vamos ter que reflorestar tudo isso. Vamos entrar em conversas para definir o prazo. É uma área significativa, vamos precisar de tempo”, afirmou.