De São Joaquim da Barra (SP) — Para um menino acostumado a arar a terra do sítio do pai num trator 50X, bem longe da tecnologia de um atual John Deere, comandar uma empresa que tem a inovação como principal negócio não era algo que parecia óbvio. Mas o destino costuma surpreender e, aos 54 anos, Wilson Romanini ocupa a cadeira de CEO da Vittia, uma das maiores na produção de defensivos biológicos e fertilizantes especiais no País.
Wilson não é cientista, agrônomo ou biólogo. Formado em economia, assumiu os negócios da família com uma visão muito clara do que é mais importante para a sobrevivência de uma indústria: tirar pedidos, como brincou algumas vezes durante a visita de The AgriBiz ao complexo industrial da empresa em São Joaquim da Barra, no interior de São Paulo.
Nada mais natural para o filho de Plínio Romanini, o empreendedor que começou como um vendedor de adubos para, em 1971, fundar a Biosoja — hoje, Vittia. Mas, para fazer os pedidos crescerem e lucrar mais com eles, Wilson sabe que a inovação precisa estar em primeiro lugar, especialmente em um ambiente de preços deprimidos como o atual.
“Quando você traz uma inovação, ela consegue propiciar uma rentabilidade mais interessante por um certo período. Essa é a nossa tese”, disse Wilson Romanini em entrevista ao The AgriBiz na semana passada.
A Vittia tem trabalhado para isso. A empresa tem hoje 27 registros especiais temporários para testar novos produtos. Desses, cerca de uma dúzia são melhorias de formulação, mas existe um grupo de produtos totalmente inovadores, segundo Edgar Zanotto, diretor de marketing da Vittia.
“Aí vem a pergunta: você vai dar conta de fazer o controle 100% biológico na soja? Eu acredito que sim. E muito rápido”, afirmou. “Quando eu falo rápido, quero dizer em três a cinco anos. Para mim, é muito rápido”, acrescentou Zanotto, um dos fundadores da Biovalens, companhia de biológicos de Uberaba (MG) adquirida pela Vittia em 2017, pavimentando a rota dos defensivos biológicos para a empresa da família Romanini.
A Vittia guarda a sete chaves quais são as inovações em que está trabalhando. No mercado, a grande inovação aguardada para os próximos anos é um bioherbicida economicamente viável, ainda inédito. Sem isso, uma soja tratada apenas com biológicos seria impossível. Nessa corrida, certamente estão também outras grandes no mercado de biológicos, como Biotrop, Koppert, Simbiose e Gênica. Quem chegar primeiro terá um trunfo capaz de mudar o jogo.
Neste ano, a Vittia deve investir cerca de R$ 24 milhões em pesquisa e desenvolvimento, cifra praticamente estável em relação a 2023. No primeiro semestre, foram destinados R$ 14,3 milhões em pesquisas, realizadas por um time de mais de 40 profissionais no centro de inovação de 1,5 mil metros em São Joaquim da Barra.
“Caberia mais investimento? Sempre cabe. Mas existem limitações. Somos uma empresa nacional, de médio porte para grande. Vamos fazendo uma racionalização dos nossos recursos”, disse Romanini, defensor de uma postura “muito realista” nas mensagens ao mercado.
Como a Vittia enfrenta a crise
Romanini foi um vocal crítico da euforia que tomou conta da indústria de biológicos, especialmente após a venda da Biotrop, e advertiu os investidores sobre o longo processo de ajuste na cadeia de insumos. Em março, por exemplo, chegou a dizer que os preços dos biológicos continuariam sob forte pressão.
Agora, o CEO da Vittia ainda vê espaço para os preços de alguns defensivos biológicos caírem ainda mais, enquanto outros talvez já tenham alcançado o piso. “Alguns preços chegaram no limite de queda, e essa nova realidade deve gerar uma dificuldade de novos entrantes”, argumentou. É aí que surge a importância da inovação para possibilitar margens mais altas.
Nesse cenário, os lançamentos previstos para os próximos anos devem ajudar o mercado de biológicos a ganhar tração novamente. Em 2024, as vendas de biológicos no Brasil devem crescer entre 12% e 15%, abaixo das taxas superiores a 20% registradas antes da crise que atingiu o mercado de insumos no ano passado, segundo Romanini.
Depois de um primeiro semestre bastante difícil, o segundo semestre tem sido melhor, mas as empresas de insumos estão longe de ter um grande ano, reconheceu o CEO da Vittia. Para atravessar o momento delicado, depois de uma quebra de safra importante em algumas regiões, a palavra de ordem na empresa é critério na concessão de crédito.
A Vittia também aposta no bom relacionamento com os produtores, cooperativas e revendas com as quais trabalha. Hoje, cerca de metade das vendas são feitas aos produtores e metade por meio de distribuidores. “Sempre apostamos em processos funcionais mais simples”, disse.
Para o CEO, ainda está difícil traçar perspectivas para 2025. “Vai depender de muita coisa. Se tivermos uma produção de grãos satisfatória no hemisfério sul e no norte, com certeza vai ser um ano também desafiador. Mas estamos preparados para isso.”
Romanini refere-se a uma característica da Vittia normalmente bem recebida pelos investidores: a baixa alavancagem. Mesmo após uma forte retração no Ebitda, que ficou negativo no primeiro semestre, a empresa conseguiu manter a relação entre dívida líquida e Ebitda em um nível confortável, de 1,18 vez. “A Vittia está muito bem postada. Temos uma filosofia de realmente levar a empresa de uma forma muito equilibrada financeiramente”, diz.
Mas esse perfil, raro no agro atualmente, tem sido pouco valorizado. As ações da Vittia acumulam queda de 40% em 12 meses, o que levou a companhia a anunciar três programas de recompra nos últimos meses.
“Para nós, está muito claro que o melhor ativo que se tem para comprar hoje é a Vittia. A empresa tem um valor infinitamente maior do que está sendo vendida no mercado”, disse Romanini.
A aposta na qualidade
No campo, a empresa pretende continuar usando o que julga ser um grande diferencial em relação aos seus concorrentes: a qualidade de seus produtos.
Durante uma visita na fábrica de biodefensivos da Vittia, a maior da América Latina com uma capacidade instalada de 10 milhões de quilolitros por ano, Zanotto, um fitopatologista apaixonado, detalhou cada etapa do processo produtivo, que começa e termina no controle de qualidade.
A confiança na qualidade do produto — e na recompra pelo produtor — é, inclusive, apontada pelo CEO como uma das razões para a Vittia adotar uma estratégia comercial diferente de alguns rivais. “A Vittia não tem grandes planos de rebate, grandes planos de premiação. Acreditamos na venda, na eficiência e na recompra desse produto”, disse.
Em vez de políticas agressivas de remuneração aos vendedores, a Vittia escolheu a catequização. Um exemplo é o programa 100% BioVittia, em que o manejo biológico, somente com produtos da empresa, tem sido feito em 82 campos, de soja e milho a citrus e cana.
A ideia do programa é não apenas mostrar aos agricultores a eficiência de sua linha, mas também à própria equipe de vendas. “Eles têm que acreditar nos produtos que estão vendendo”, afirmou Romanini. “A falta de conhecimento é o principal entrave para vender biológico”, resume Zanotto.
Para uma fonte do setor, a estratégia da Vittia de ter um vendedor para todos os produtos do portfólio, que conta com mais de 100 SKUs, atrapalha o foco nos biológicos. A julgar pelas declarações de Romanini e Zanotto, a Vittia se preparou para esse desafio — financeira e estrategicamente.
A jornalista viajou a convite da Vittia.