OPINIÃO

Do investidor ao gestor, do político ao influencer: a lição dos Fiagros

“Acompanho casas e gestores excepcionais que nunca fizeram uma defesa pública do agro, e tampouco da indústria de Fiagros"

Suno Fiagro

A indústria de Fiagros cresceu como um foguete nos últimos três anos. De zero a R$ 40 bilhões com quase 600 mil investidores, os fundos prosperaram em grande parte graças à credibilidade e força de distribuição da XP. Nenhum outro produto conquistou o coração e bolsos dos investidores brasileiros de forma tão rápida.

Nos últimos tempos, no entanto, temos visto quase todos os Fiagros listados sendo negociados abaixo do valor patrimonial. Uma sensação de medo do agro, absolutamente desnecessária, parece ter batido forte nos investidores, abrindo espaço para pechinchas com carrego superior a 20% ao ano, como mostra estudo da Suno Wealth.

Certamente, ainda veremos várias fases na indústria de Fiagro e ainda não é possível visualizar todas elas. Ainda estamos dando os primeiros passos, mas a verdade é que todos nós precisamos evoluir, sem exceção: investidores, gestores, assessores de investimento, influenciadores, distribuidores, entidades do setor e produtores/empresários rurais.

Não podemos perder de vista que há uma disputa pelo dinheiro do investidor. Quando um “influenciador de bitcoin” fala que o agro vai quebrar, ele quer que o investidor vá para as criptomoedas. E assim com todos os outros ativos.

Mas o agro é tão diverso que é impossível empacotá-lo com um rótulo só. Enquanto o preço da soja está indo mal, o preço do cacau e café conilon estão na máxima histórica e milho está no melhor preço dos últimos 12 meses. Enquanto falta chuva numa região, em outra chove muito. E mesmo assim, influenciadores ficam falando sobre o agro, mesmo sem saber a diferença entre um pé de café e um de abacaxi.

O investidor de Fiagros é majoritariamente de “varejo”, não conhece o agro e é muito suscetível a informações aleatórias. Morre com o “barulho da bala”. Ao ver o Curupira assobiando, logo vende a cota. E isso atrapalha o mercado. Nas últimas semanas, o Curupira atende pelo nome de recuperação judicial.

Há também a celeuma política. Historicamente, muitas lideranças do nosso setor aprenderam a reclamar de tudo, pois precisavam que “Brasília” renegociasse as dívidas. Esse modelo parecia fazer sentido até poucos anos atrás, pois o financiamento do agronegócio nacional era quase todo subsidiado pelo governo federal. Agora, o mundo mudou. O crédito privado já financia mais de 50% da demanda da atividade primária.

Nos novos tempos, quando a Aprosoja fala com Brasília com o objetivo de renegociar as dívidas, o pequeno investidor (um dentista de Sorocaba, por exemplo) ouve e fica com medo. Há menos de um ano, tivemos um exemplo claro de catastrofismo desnecessário. Em janeiro, a Aprosoja estimou que a safra de soja 2023/2024 seria de 135 milhões de toneladas de soja. Na prática, a safra foi de quase 150 milhões de toneladas.  A diferença acima impacta a percepção de risco do setor.

Em geral, o produtor rural acha que consegue influenciar os preços de commodities agrícolas nos grupos de WhatsApp, e se acostumou falar que a safra vai cair, que o sol está muito forte, que a produção não dará nada. É da cultura, da natureza do produtor, mas  isso também amplia a percepção de risco do mercado. É um tanto sui generis, mas o produtor se acostumou a falar mal do negócio dele.

E o problema não fica só no produtor. O gestor de Fiagro e as gestoras também precisam aprender a se comunicar melhor com o mercado. Muitas vezes, as gestoras se acomodam quando listam um Fiagro, até porque possuem um incentivo perverso: os fundos têm receita perpétua.

Acompanho casas e gestores excepcionais que nunca fizeram uma defesa pública do agro, e tampouco da indústria de Fiagros nas redes sociais. No mundo de disputa por investidores e os seus recursos, não basta fazer bem gestão de ativos e publicar relatório gerencial. É preciso comunicar, dialogar, colocar a cara.

Cada dia mais, os investidores têm uma infinidade de produtos para investir. E há muito produto bom no mercado. Trazer o dinheiro do investidor para o agronegócio depende de um esforço coletivo. Depende das gestoras, gestores, produtores e empresários rurais, distribuidores de valores mobiliários e entidades do setor.

Em recente estudo, a B3 informou que existem 5,1 milhões de investidores em renda variável e 17,7 milhões em renda fixa, num total de R$ 2,4 trilhões sob custódia. Destes, 2,5 milhões investem no agro um total de R$ R$ 594 bilhões em CRAs, LCAs e Fiagros. Ao comunicarmos melhor, defendendo o setor e melhorando a performance dos produtos, ampliaremos a destinação do dinheiro do investidor ao  agro brasileiro.

Mas não se enganem com os desafios. Eles serão superados e, em pouco tempo, os preços e as pechinchas dos Fiagros acabarão. Os fundos voltarão voltar a captar, e a indústria continuará crescendo, sustentada num tripé formado por conhecimento agronômico, capacidade de análise de crédito e comunicação.

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Octaciano Neto foi secretário da Agricultura do Espírito Santo no governo Paulo Hartung e diretor de agronegócios da Suno.