A volta de Donald Trump à Casa Branca animou alguns investidores a comprar ações da SLC (SLCE3), apostando em um repeteco da guerra comercial de 2018 — evento que fez os preços da soja brasileira dispararem. Mas a empresa mantém uma postura mais cautelosa em relação aos impactos de uma eventual disputa comercial entre Washington e Pequim.
“A eleição de Trump trouxe uma perspectiva de que o quadro do primeiro mandato fosse se repetir, mas o cenário das commodities mudou bastante”, disse Aurélio Pavinato, CEO da SLC, em entrevista ao The AgriBiz. “Se existir uma nova guerra comercial, ela será bem diferente do que foi em 2018”.
Pavinato lembra que, na safra 2017/18, cerca de 30% das importações chinesas de soja tinham como origem os EUA. Na safra passada, esse percentual caiu para 20%. No algodão, também houve uma redução na dependência dos EUA: o algodão norte-americano, que representava 46% das importações chinesas antes da guerra comercial, hoje tem uma participação de 33% no total.
Nos últimos anos, o espaço dos EUA acabou sendo ocupado pelo Brasil — não só pela deterioração nas relações diplomáticas entre as duas maiores economias do mundo, mas principalmente por ganhos de competitividade das exportações brasileiras.
Além disso, a China aumentou os seus estoques, o que evitaria uma busca desenfreada pela soja brasileira caso o país asiático taxe a soja norte-americana, como aconteceu no passado. “A China não tem mais aquela pressão de sair comprando a qualquer preço”, ponderou Pavinato.
Avançando no hedge
Definitivamente, o maior grupo agrícola do Brasil não vem pautando o ritmo de suas vendas ao noticiário norte-americano.
Até 11 de novembro, a SLC travou 63% da produção de soja esperada para safra 2024/25, considerando também compromissos em contratos de arrendamento, ao valor médio de US$ 11,76 por bushel — acima dos preços futuros de Chicago (hoje, o contrato com vencimento em dezembro é negociado em torno de US$ 10).
O percentual de venda antecipada está praticamente em linha com o praticado pela companhia nos últimos anos e abaixo do limite de 80% antes do início da colheita imposto por sua política de comercialização.
Para a safra 2025/26, cerca de 34% da produção já foi travada, o que chamou a atenção na divulgação de resultados do terceiro trimestre. A empresa aproveitou bons momentos nos preços da commodity para travar os preços em US$ 11,33 por bushel.
“A soja é a cultura no mundo em que os estoques estão aumentando, e essa pressão (de estoques) deve perdurar para a próxima safra também depois da safra recorde nos EUA e da boa safra que virá da América do Sul”, avaliou Pavinato em call com analistas nesta quarta-feira.
“Achamos conveniente aproveitar alguns repiques de preço para iniciar o hedge de 25/26 e alguma posição de dólar também”, completou o CEO da SLC. A taxa média de câmbio fixada para 2025/26 foi de R$ 6,289, ante R$ 5,457 na safra 2024/25.
A companhia também comprou 80% do cloreto de potássio para a safra 2025/26, depois que os preços dos insumos se aproximaram das mínimas históricas. “Na nossa visão, não tem mais espaço para ajuste de custos para baixo. A safra 2025/26 novamente deve ser de margens apertadas para o setor. Para ter margens melhores, vai depender de como serão fixados os custos e da produtividade.
Potencial “excelente”
Depois de duas semanas de atraso no início do plantio da soja em Mato Grosso devido à demora no início das chuvas, a SLC conseguiu finalizar o plantio da oleaginosa dentro da janela ideal para o desenvolvimento da cultura, segundo Pavinato.
Na Bahia e no Maranhão, onde a SLC também tem fazendas, as chuvas ocorreram dentro do esperado, possibilitando o plantio no período desejado. Considerando todos os Estados onde está presente, o que inclui Goiás e Mato Grosso do Sul, o plantio está 77% concluído.
“O potencial da soja está excelente este ano”, disse. Também não houve grandes prejuízos ao calendário de plantio da safrinha. “Vamos plantar algodão na segunda quinzena de janeiro, o que é uma época muito boa. Mas o ideal seria distribuir ao longo de janeiro para reduzir riscos”, afirmou Pavinato.
A colheita concentrada da soja em poucas semanas no Mato Grosso também traz algumas preocupações para a qualidade do grão: se as lavouras forem atingidas por um período prolongado de chuvas, os trabalhos de campo podem atrasar e, ocasionalmente, levar a perdas pontuais de qualidade.
A SLC está aumentando a área plantada com soja da safra 2024/25 em 18%, o equivalente a 60 mil hectares. Desses, 46 mil hectares são de propriedades incorporadas recentemente ao portfólio da companhia e o restante (quase 15 mil hectares) refere-se a uma área originalmente de soja que, devido à seca na safra 2023/24, acabou sendo ocupada por algodão na primeira safra.
No total, a companhia deve plantar 734 mil hectares na nova safra, um crescimento de 11%. Todos os insumos já foram comprados, a um custo 5% menor em relação à safra 2023/24, refletindo reduções nos preços dos fertilizantes, defensivos e sementes.
O balanço do 3º tri
Ontem à noite, a SLC reportou um prejuízo de R$ 17,3 milhões no terceiro trimestre, revertendo um lucro líquido de R$ 167,3 milhões no mesmo período de 2023. A receita líquida recuou 1%, para R$ 1,6 bilhão, enquanto o Ebitda ajustado caiu 6% e atingiu R$ 463 milhões. A margem Ebitda caiu 1 ponto percentual, para 28%.
Os resultados foram impactados pela redução de 16% na produtividade de soja da safra 2023/24, que foi prejudicada por uma forte seca em Mato Grosso. A produção de milho safrinha no Maranhão também foi impactada pelo clima adverso.
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Por volta das 11h30, as ações da SLC caíam 2% na B3. Em um ano, os papéis acumulam queda de 5%. A empresa da família Logemann está avaliada em R$ 7,7 bilhões na Bolsa.