OPINIÃO

Uma revolução a caminho na gestão de risco de commodities agrícolas

Novo indicador da B3 para o mercado futuro do boi gordo e o Balcão Agrícola podem transformar a forma como se faz hedge de commodities no País

Imagem ilustrativa para hedge; preço de commodities | Crédito: Schuttertsock

Nas últimas semanas, pudemos celebrar algumas novidades importantes, que podem trazer avanços significativos para a gestão de riscos de commodities no Brasil. Tive a oportunidade de acompanhar o início de dois projetos e fico muito feliz que eles estejam caminhando muito bem, já que endereçam dores históricas.

A primeira novidade foi o anúncio pela B3 da troca do indicador utilizado para a liquidação financeira dos contratos futuros de boi gordo. A partir do vencimento de fevereiro de 2025, sai o indicador do Cepea e entra o da Datagro.

Este sempre foi um ponto de muito atrito entre a bolsa e os agentes do mercado e é considerado por alguns como um dos motivos pela queda dos volumes operados na última década, enquanto o setor de pecuária cresceu. Ficamos na torcida para que a Datagro traga confiança, robustez e transparência suficientes para atrair de volta a liquidez dos tempos áureos do contrato.

A segunda novidade foi o anúncio da entrada em operação do Balcão Agrícola do Brasil (“BAB”). Em essência, o BAB vai ser um ambiente de negociação de grãos em moeda local, com entrega física em pontos de recebimento no interior. Isso traz uma simplificação enorme na precificação normalmente cinzenta dos preços futuros da soja, por exemplo.

Até hoje, no curso normal de uma negociação de safra futura o produtor precisa saber o preço do contrato futuro de Chicago que é a referência para o período, a taxa forward do dólar e o basis da região, cuja variação pode facilmente atropelar a dos primeiros componentes.

Agora, o produtor poderá acompanhar no sistema as ofertas para a base específica, com preço em reais. A possibilidade da entrega física garante a convergência dos contratos para o mercado spot de verdade, evitando os conflitos potenciais de um indicador calculado por terceiro, como vimos no caso dos futuros de boi da B3.

Claro que a BAB enfrentará desafios para agregar liquidez, convencendo hedgers e especuladores a aderirem ao novo ambiente, mas acredito que o mercado dará seu voto de confiança.

O projeto se tornará ainda mais interessante quando forem abertas mais bases de recebimento pelo país. Isso possibilitará um trade inédito em ambiente organizado: o frete. Imagine ver na mesma tela os preços do Mato Grosso e do Paraná, por exemplo. Em teoria, a diferença entre eles deve se dar por questões de disponibilidade e custo do frete. Uma trading, empresa de transportes ou consumidor final poderá arbitrar essa diferença de preços apostando na convergência ou divergência entre eles e desmontar a posição antes da entrega física, numa proxy muito boa para hedge de frete.

Vamos torcer para o sucesso dessas iniciativas. Em poucos anos, o mercado pode estar bem diferente (para melhor) do que é hoje por causa delas.

Direto da mesa de risco

A eleição de Trump trouxe uma nova onda de incertezas aos mercados de commodities, impactando especialmente o complexo de soja. Após a confirmação de sua volta à Casa Branca, o óleo de soja teve uma forte alta com rumores de que a nova administração proibiria a importação de UCO (óleo de cozinha usado), aumentando a demanda interna pela soja. Embora os preços tenham corrigido logo depois, o temor de medidas inesperadas adiciona volatilidade.

Nos fundamentos, os estoques globais de soja devem seguir em alta, especialmente sem quebras de safra na América do Sul, onde Brasil e Argentina apresentam condições climáticas favoráveis.

Entretanto, a desvalorização do real contribui para sustentar os preços internos de soja e milho, compensando parcialmente a pressão de baixa. No milho, a demanda doméstica brasileira e em outros países sustenta preços relativamente estáveis. O cenário traz oportunidades de arbitragem para quem monitora o mercado a fundo.