UE-Mercosul

Às vésperas da Black Friday, o açougue do Carrefour está em risco

A expectativa é que, a partir de segunda-feira, as principais lojas do Carrefour comecem a ter problemas de fornecimento, disse uma fonte

Às vésperas da Black Friday, o Carrefour Brasil corre risco de ficar com o açougue desabastecido, atrapalhando as vendas da maior rede de supermercados do País em uma das semanas mais emblemáticas para o varejo.

O culpado pelo eventual desabastecimento tem nome e sobrenome: Alexandre Bompard. Na quarta-feira, o CEO global do Carrefour fez um aceno ao protecionismo dos agricultores franceses, anunciando que não vai mais comprar carne oriunda do Mercosul.

A declaração não incomodou apenas a indústria frigorífica brasileira. Em Brasília, representantes do governo federal saíram em defesa da carne nacional e apontaram a hipocrisia do executivo francês.

“Que raio de empresa é essa que prega coerência somente em um país? Não dá para ser bonzinho pela metade. Para o Brasil, pode comprar a mesma carne que não serve na França”, ironizou uma fonte.

Nos últimos dias, o ministro da Agricultura, Carlos Favaro, ligou pessoalmente para os principais frigoríficos do País. As conversas giraram em torno do apoio à decisão de suspender as vendas para as lojas do Carrefour no Brasil.

Ontem, a JBS parou de vender ao Carrefour, uma decisão que também inclui as lojas do Atacadão. “Na sexta, só entregou o que já estava em trânsito. A ordem é não faturar mais nada. 100% dos pedidos foram cancelados”, disse uma fonte.

A postura da JBS deixou o Carrefour numa sinuca. Afinal, a Friboi responde por cerca de 80% de toda carne bovina comprada pela rede varejista no Brasil. Além disso, outros fornecedores importantes aderiram ao boicote, depois de saberem da simpatia do ministro Fávaro e, em última instância, do governo Lula.

Na sexta-feira, o colega Pedro Arbex, do Brazil Journal, relatou que Marfrig e Masterboi (relevante no fornecimento das lojas no Nordeste) também pararam de vender. The AgriBiz confirmou as informações.

Procurado, o Carrefour Brasil negou qualquer problema e argumentou que o abastecimento está normal. Para uma fonte da indústria ouvida nesta sábado, os problemas ainda vão começar a aparecer.

A expectativa é que, a partir de segunda-feira, as principais lojas da rede varejista comecem a ter problemas de fornecimento. Não à toa, já existe um movimento interno no Carrefour (especialmente no Atacadão) para pressionar Bompard a fazer um recuo estratégico, com algum mea-culpa.

Nos últimos dias, Stephane Maquaire, CEO do Carrefour Brasil, chegou a telefonar para Renato Costa, presidente da Friboi, para entender a situação. A reposta foi taxativa. “Se não houver retração, param de fornecer”, narrou uma pessoa que acompanha a crise.

Na conversa, uma das sugestões do Carrefour teria sido enviar uma nota para amenizar a situação, mas executivos de frigoríficos brasileiros já avisaram que não basta um executivo da operação brasileira falar.

Neste momento, só Bompard resolve a crise que ele próprio criou. Uma ligação dele ao CEO global da JBS, Gilberto Tomazoni, já ajudaria a desarmar a bomba, avaliou outra fonte. “Mas se vier uma resposta só do Carrefour Brasil, aí detona a crise de vez”, frisou um executivo.

Para quem acompanha o processo, Bompard ainda tem uma alternativa. “Se eu fosse ele, diria algo assim: ‘o que eu quis dizer é que vamos prestigiar a produção local e fomentar a economia local’”.

Assim, em cada país em que atua, o Carrefour prestigiaria a produção local. Nessa hipótese, o executivo francês deixaria de tratar a carne bovina do Mercosul como um produto que não segue as normas ambientais, amenizando o problema.

Ao que tudo indica, as declarações coordenadas dos executivos franceses (antes do CEO do Carrefour, a Danone já havia dado problema) precedem uma derrota histórica para a agricultura francesa, que vive de subsídios.

Mais do que em qualquer momento, a aprovação do acordo entre União Europeia e Mercosul parece próxima, e poderia ser sacramentada no início de dezembro, durante a Cúpula do Mercosul.

“Isso tudo é choro da derrota. O acordo EU-Mercosul vai sair”, previu uma fonte. As últimas duas pendências entre os blocos (a criação de um sistema de arbitragem para resolver disputas e os limites à retaliação cruzada) foram resolvidas. “Alemanha, Itália e Espanha são a favor. Vai passar mesmo sem a França”.

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Procurados, JBS e Marfrig não comentaram.