Depois de um ano de dúvidas sobre o futuro do RenovaBio, o programa de incentivo à produção de biocombustíveis pode ganhar novo fôlego em 2025. O sopro de otimismo ocorre em meio à promessa de punições mais severas em caso de descumprimento de suas metas, o que pode aquecer a demanda pelos CBIOs, os créditos de descarbonização comercializados dentro do programa, e até elevar os seus preços.
Sancionada no final de 2024, a lei 15.082/24 aumentou em dez vezes a multa máxima que as distribuidoras de combustíveis podem receber caso não cumpram as metas de compra de CBIOs estabelecidas pela ANP: o teto passou de R$ 5 milhões para R$ 500 milhões.
A nova lei também passa a tratar o não cumprimento das metas de descarbonização como crime ambiental, e distribuidoras inadimplentes podem até ter revogada a autorização de distribuição de combustíveis concedida pela ANP.
A medida é uma tentativa do governo federal de fortalecer o programa, posto à prova nos últimos anos em meio ao aumento do descumprimento das regras e das judicializações por parte das distribuidoras, com a ameaça de grandes nomes como Vibra e Ipiranga de deixarem esse mercado.
Negociados no mercado de balcão, os CBIOs são emitidos pelos produtores de biocombustíveis (etanol e biodiesel, principalmente) e devem ser comprados pelas distribuidoras — cada um possui uma meta definida pela ANP. Cada certificado representa 1 tonelada de CO2 evitado.
No ano passado, apenas 77% da meta de compra de CBIOs foi cumprida, de acordo com os dados apresentados pela ANP no início de janeiro, na terceira redução anual seguida. Em 2023, o percentual foi de 83% e em 2022, de 90%.
O descumprimento das metas resultou numa queda de aproximadamente 30% no preço médio dos CBIOs no ano passado, segundo cálculos da consultoria agro do Itaú BBA. Com o cerco mais fechado em torno das distribuidoras e uma oferta ligeiramente mais apertada de créditos, os CBIOs podem ter um aumento de preço em torno de 10% em 2025, situando-se perto de R$ 90 a R$ 100, segundo o Itaú BBA. No ano passado, a média ficou em R$ 81.
“O preço não deve chegar à média dos últimos dois anos, de R$ 110, mas o cenário em 2025 deve refletir alguma recuperação”, diz Lucas Brunetti, analista do ItaúBBA.
Concebido para estimular a expansão da produção de biocombustíveis, o CBIO é uma fonte de receita para as usinas, com uma participação de aproximadamente 6% no total, segundo cálculos da FG/A.
Saldo apertado
Em 2025, a meta para o cumprimento do programa é de 40,4 milhões de CBIOs, volume em linha com o projetado para as novas emissões neste ano pelo Itaú BBA, de 40,2 milhões de CBIOs. Além das novas emissões, há um estoque de 16 milhões de certificados ainda não vendidos comercializados nas mãos das usinas.
Mesmo assim, a oferta tende a ser apertada porque à meta deste ano somam-se 10,8 milhões de títulos que deveriam ter sido comprados no ano passado pelas distribuidoras e não foram, o que totaliza uma meta de 51 milhões de CBIOs para 2025.
“Olhando somente a meta de 2025, tenderia a uma situação de equilíbrio, mas as metas não cumpridas ao longo dos últimos anos foram se acumulando, o que traz um saldo final mais apertado”, afirma Cristian Quiles, analista da FG/A.
A expectativa é que o não cumprimento do programa cobre seu preço já a partir deste ano. Segundo os dados do Itaú BBA, empresas que representam 10% do market share na distribuição de combustíveis estão inadimplentes com o programa e, com isso, respondem por quase 30% do total da meta de CBIOs prevista para o ano.
“As distribuidoras inadimplentes com o programa devem ter uma meta de 14,7 milhões de CBios cada em 2025, e nós esperamos que uma parte disso seja realmente aposentada (atingida) por causa das regras mais rígidas”, destacou Brunetti.
Há quem aposte que o cerco mais apertado em torno das usinas vai resultar em uma judicialização ainda maior no Renovabio. Pelo menos é a ameaça apresentada pela Associação Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (ANDC) em entrevista recente ao JOTA.
Dividindo a receita
Vale lembrar que a lei 15.082/24 trouxe outra mudança relevante para o Renovabio, que passou a contemplar os produtores independentes de cana na receita proveniente da comercialização dos CBIOs.
A partir de agora, os agricultores deverão receber parcelas de, no mínimo, 60% da receita obtida pelas usinas com a venda dos créditos, o que representa uma vitória para os produtores independentes, que representam cerca de um terço da produção de cana no País, segundo a Orplana, a associação que representa o setor.