Reg.IA

Consórcio por agricultura regenerativa alcança 37 mil hectares — e bons resultados

Reg.IA ficou abaixo da meta de plantio de 50 mil hectares plantados, mas se aproxima do objetivo na produção de grãos devido à alta produtividade das fazendas participantes

Soja regenerativa

INDAIATUBA (SP) — Criar um protocolo 100% brasileiro para a agricultura regenerativa de grãos, fomentando preços diferenciados para a soja e milho regenerativos. Essa é a missão do Reg.IA, um consórcio formado por Bayer, BRF, Agrivalle e pela agtech Produzindo Certo, que iniciou suas operações na safra 2024/25. O projeto piloto chegou a 37 mil hectares, em 38 fazendas localizadas em cinco estados, a maioria em Goiás.

A área plantada ficou abaixo da meta inicial do projeto, que pretendia chegar a 50 mil hectares no primeiro ano. Não foi por falta de esforço, segundo Charton Locks, diretor de operações da Produzindo Certo. 

“A régua do Reg.IA tem um nível de exigências que precisam ser implementadas, e isso não é de uma safra para a outra. Apesar de termos chegado a 37 mil hectares, ficamos muito próximos da meta de produção de grãos, por causa da alta produtividade dessas fazendas”, explicou Locks, em evento realizado na noite de quinta-feira.

A produção final deve ser divulgada nos próximos dois meses, em um novo evento. Por enquanto, a estimativa do consórcio é de uma produção de 160 mil toneladas de soja regenerativa e 300 mil toneladas de milho regenerativo. 

Os grãos estarão disponíveis para comercialização dentro da plataforma do Reg.IA, que impõe um prêmio mínimo de 2% sobre o valor de compra de soja e milho não regenerativos adotados por cada empresa. Não há uma garantia de venda dessa produção.

“Não há uma expectativa de vender 100% da produção regenerativa no ano um. Por enquanto, o compromisso do Reg.IA e as entregas do programa foram suficientes para que os produtores acreditassem na iniciativa e investissem nela. Hoje, uma cultura de cobertura custa de R$ 300 a R$ 400 por hectare, contando só a semente”, frisa Locks.

Produtores presentes no evento endossaram o discurso. Mais do que preço, por enquanto, vale o conhecimento acumulado que o programa trouxe, de forma 100% gratuita, sobre o manejo regenerativo correto.

“Ainda existem muitas dúvidas, falta de conhecimento no campo. Às vezes, não estamos usando as plantas de cobertura corretas, por exemplo”, diz a produtora Thalita Tessmann, que planta grãos na Fazenda Antagordense, do Cerrado Mineiro. Os benefícios vão sendo colhidos aos poucos. “Fazemos esse trabalho de agricultura regenerativa há quatro anos e esse ano, por exemplo, já plantamos sem adubo, economizando 80% do nosso custo”.

Regenera The AgriBiz

O foco do protocolo permanece sendo a expansão. Além de atingir outras culturas, como sorgo e café, ainda que não existam planos em curto prazo para implantá-los. Em curto prazo, a iniciativa estuda uma expansão para outros países da América Latina, começando pela Argentina.

“Nós já temos a Produzindo Certo e vários outros parceiros na Argentina, é um caminho natural. Construímos o Reg.IA para ser latino-americano. Não temos uma data fechada, mas gostaria muito que isso acontecesse na próxima safra”, afirmou Locks.

Como o programa funciona

Todo esse trabalho teve início em agosto do ano passado, quando técnicos do Reg.IA começaram a visitar fazendas de grãos para apresentar o projeto e os pré-requisitos para participar dele. Foram duas modalidades de participação no programa: inscrevendo a fazenda inteira ou talhões específicos.

Quem quis habilitar apenas alguns talhões para o processo regenerativo teve de escolher áreas que tiveram cultura de cobertura pelo menos uma vez ao longo dos próximos três anos. Quem quis inscrever a fazenda toda teve de assumir o compromisso de fazer plantio direto com cultura de cobertura em pelo menos 25% dos talhões ano a ano.

“Nós vimos que mais de 70% dos talhões inscritos tiveram cultura de cobertura na safra anterior, mostrando que eles já estariam com um nível mais elevado de cumprimento do que a própria exigência do protocolo”, explicou Locks, a jornalistas.

Para participar do programa, os produtores assumiram o compromisso mandatório de continuar com o plantio direto e, além disso, tiveram de escolher mais uma entre quatro práticas sustentáveis: adubação orgânica, em que pelo menos 20% do volume de fertilizante venha de fonte orgânica; uso de defensivos biológicos, com pelo menos uma aplicação por ano; redução de uso de pesticidas químicos abaixo de 20% da média nacional; e rotação de culturas.

Regenera The AgriBiz

A rotação de culturas não será feita na safra, mas sim na safrinha, pelo menos fazendo um mix com o milho. “A grande maioria dos produtores aderiu a duas, até três práticas opcionais, já mostrando o compromisso deles com a prática regenerativa. Escolhemos esse conjunto de regras porque verificamos que é o que funcionaria no campo”, explicou Monalisa Mühl, coordenadora do Reg.IA.

Depois que os produtores toparam aderir ao projeto, a Reg.IA voltou às fazendas para fazer uma análise de sustentabilidade — em que foram analisados mais de 200 critérios com o apoio da Produzindo Certo — e uma análise de solo, em parceria com a ConnectFarm, uma startup especializada em análise de solo e agricultura digital. Também foi feita uma análise de pegada de carbono, em parceria com a Bayer.

Ao longo dos meses, foram coletados dados de pré-plantio, plantio e, no próximo mês, serão coletados os dados de colheita. “Onde estamos hoje? Apresentando dados de coleta de solo e diagnóstico socioambiental. A partir da semana que vem, devemos voltar para coletar os dados finais e validar quanto os produtores se comprometeram ao longo do programa”, afirmou Mühl.

Os resultados

Em uma rápida apresentação, Antonio Luis Santi, professor doutor da UFSM e co-fundador da ConnectFarm, apontou que as propriedades que fazem parte do Reg.IA têm um nível de estoque de carbono bastante parecido com o da base de dados da startup especializada em agricultura digital — com mais de 400 produtores em oito estados. 

Para uma camada mais profunda do solo, de 30 centímetros, a média do banco de dados da startup é de 84 toneladas de estoque de carbono (medidas em megagramas por hectare). Nas fazendas atendidas pelo Reg.IA, esse número é de 73,4 — porém, as 10 melhores fazendas têm um estoque de 106,9 toneladas.

No caminho para melhorar os números das fazendas que fazem parte do projeto, o professor citou, a partir de análises conduzidas, que mais de 90% das áreas podem ter redução na aplicação de calcário e 46% podem ter redução na aplicação de fósforo — sendo que, destas, 16% já têm o elemento químico em patamares muito altos. Outros 21% podem reduzir a aplicação de potássio. 

“Como podemos fazer isso? Com as rotações, que são exatamente as oportunidades de entrada de carbono no sistema de produção, somando as plantas de cultivo às de cobertura. Hoje, mais de 50% das áreas têm a presença da braquiária, com um volume de produtores já representativo usando esse cultivo em consórcio com o milho safrinha”, explicou. 

*A repórter viajou a convite da Produzindo Certo