Tendências

O milho pode desbancar a soja no Brasil? O JP Morgan acha que sim

Com dezenas de usinas entrando em operação, Brasil pode ter um excedente de 3,1 bilhões de litros de etanol entre 2025 e 2031, pressionando os preços do biocombustível

Produção de etanol de milho pode dobrar

O boom do etanol de milho no Brasil está apenas começando. Novos projetos que já estão no pipeline devem quase dobrar a capacidade de produção do biocombustível em dois anos, levando o País a um excesso de oferta que pode reduzir os preços do etanol abaixo da paridade com a gasolina por um período estendido. A avaliação é do JP Morgan, que mapeou as novas usinas e seus impactos nos mercados de biocombustíveis, grãos e ração.

Se todas as 29 usinas que já receberam autorização da ANP (Agência Nacional de Petróleo e Biocombustíveis) entrarem em operação nos próximos dois anos, como previsto, a capacidade de produção de etanol de milho pode mais que dobrar, com o acréscimo de 11,2 bilhões de litros.

Essa expansão resultaria numa demanda adicional de 27 milhões de toneladas de milho para processamento, um volume que supera a demanda atual para moagem, estimada em 20 milhões de toneladas pelo banco.

Considerando que alguns desses projetos podem não avançar, os analistas do JP Morgan adotaram como cenário-base um aumento de capacidade de 7 bilhões de litros de etanol, o que representaria uma expansão de 83% do parque atual.

Para abastecer essas plantas, seriam necessárias quase 17 milhões de toneladas de milho, afirmaram os analistas liderados por Lucas Ferreira em um relatório de 40 páginas sobre o futuro do etanol de milho no Brasil. Nesse cenário, a produção de etanol de milho chegaria a 15,5 bilhões de litros por ano, representando 37% da produção total de etanol no Brasil.

Para fazer esses cálculos, os analistas do JP Morgan consideraram que a produção de etanol de cana no Brasil deve permanecer estável em torno de 27 bilhões de litros (sem expansão da área plantada); a mistura de etanol anidro na gasolina aumentaria para 30% ante os atuais 27,5%; e a participação do etanol hidratado no mercado total de Ciclo Otto cresceria 1% ao ano até 2031.

Mesmo assim, o Brasil pode ter um excedente de 3,1 bilhões de litros de etanol entre 2025 e 2031. “Mesmo no nosso cenário de baixa oferta, com várias usinas não avançando, antecipamos que o Brasil enfrentará um excedente médio de 6% na oferta de etanol entre 2025 e 2031”, disseram os analistas do JP Morgan.

Milho no topo

Com a demanda adicional para moagem, o milho pode superar a soja como a maior cultura do Brasil até 2030, segundo o JP Morgan. Os analistas ressaltam o enorme potencial que o País tem para aumentar a produção do grão, seja elevando a produtividade ou expandindo a área plantada sem desmatamento.

“Comparando com a produtividade média nos Estados Unidos, de quase 12 toneladas de milho por hectare, o rendimento atual no Brasil, de 6 toneladas por hectare, representa um grande potencial de crescimento”, afirmam os analistas. Eles destacam, no entanto, que uma estimativa ao redor de 9 toneladas por hectare é mais realista, considerando as particularidades da safra brasileira.

O potencial para ampliar as áreas plantada também é muito significativo. Os produtores brasileiros plantam 22 milhões de hectares com milho — cerca de 17 milhões de hectares na segunda e terceira safras, após o plantio da soja na safra de verão. Como a área de soja no Brasil totaliza 47 milhões de hectares, quase 30 milhões de hectares poderiam ser integrados ao sistema de rotação de culturas.

“Assumindo de forma conservadora que apenas 50% dessa área pode suportar a segunda safra de milho e com um rendimento de 6 toneladas por hectare, o Brasil poderia produzir mais 90 milhões de toneladas de milho. Esse aumento seria mais que suficiente para atender à demanda das futuras usinas de etanol de milho, sem necessidade de desmatamento.”

E o DDG?

Como consequência, a produção de DDG (Distillers Dried Grains) — um ingrediente para ração com alto teor de proteína que é subproduto do biocombustível — deve quase dobrar dos atuais 6 milhões de toneladas para 11 milhões.

Os analistas do JP Morgan destacam que esse aumento na oferta deve ter impactos positivos para os produtores de carne, especialmente confinamentos de gado localizados próximos às plantas de etanol de milho, beneficiando principalmente empresas como Marfrig e Minerva.

Para o JP Morgan, é improvável que haja um excesso de oferta de DDG no mercado brasileiro, pois a demanda vem respondendo rapidamente em meio aos esforços das usinas de promover o insumo junto aos produtores de carne.

“Mesmo se a oferta ultrapassar a demanda levemente no curto prazo, as exportações podem ter um papel importante para balancear o mercado, com embarques a países onde a indústria de carnes está crescendo, como Tailândia e Vietnã”, observam os analistas.

A biomassa será suficiente?

Uma das principais preocupações da indústria é se haverá biomassa suficiente para abastecer todas essas usinas de etanol de milho. Segundo o relatório, a maioria das usinas de etanol de milho no Brasil depende da queima de seu próprio combustível para gerar eletricidade em suas caldeiras, que podem utilizar diferentes tipos de biomassa, desde sementes de algodão até eucalipto, valorizado por seu alto poder calorífico.

No cenário-base do JP Morgan, a demanda da indústria de etanol de milho por cavacos de madeira aumentaria de 19 milhões para 35 milhões de metros cúbicos. “Isso reforça a importância de garantir um suprimento confiável de biomassa”, destaca o banco.