Os mercados de soja e milho devem voltar ao regime pré-Covid, marcado por baixos preços e baixa volatilidade, até o final deste ano. O cenário foi traçado nesta terça-feira por Aakash Doshi, head de commodities do Citi na América do Norte. De Nova York, ele falou a analistas e clientes do Citi reunidos em São Paulo.
Para o segundo semestre (precisamente para o período entre seis e 12 meses a partir de agora), Doshi estima que a soja será negociada ao redor de US$ 11,50 o bushel —abaixo, portanto, do patamar de US$ 12 por bushel dos contratos com vencimento no segundo semestre negociados na Bolsa de Chicago.
Para o milho, a estimativa é de US$ 3,85 por bushel para o mesmo intervalo, também abaixo da curva futura. Nesta terça-feira, o contrato de milho com vencimento em dezembro fechou em US$ 4,70 o bushel.
Já para 2025, as projeções são mais desanimadoras. A soja pode cair abaixo de US$ 10 o bushel e o milho, para um patamar próximo de US$ 3,60 —níveis vistos em 2019.
Doshi listou cinco principais razões para o mercado baixista em Chicago. Vamos a elas:
- 1. Recuperação dos estoques nos EUA
A produção de soja e de milho deve ser superavitária este ano nos Estados Unidos, o que significa que os estoques terão um incremento importante nos próximos 12 a 18 meses, se não houver um novo choque climático.
Clima extremamente adverso, aliás, tem uma baixa probabilidade de acontecer no médio prazo, considerando a tendência apontada pelos principais modelos climáticos de passagem de El Niño para neutralidade durante a primavera no hemisfério Norte, ponderou Doshi.
Com produtividade em alta —sob a influência de um clima favorável— e crescimento na área plantada, a produção norte-americana deve crescer em 2024/25, disse o analista.
A relação de preços entre soja e milho está bastante favorável para a oleaginosa, o que deve estimular o aumento da área de soja em detrimento ao grão. Além disso, o recuo no preço dos fertilizantes, que já voltaram aos níveis pré-Covid e guerra na Ucrânia, deve incentivar o plantio tanto de soja como de milho.
Por fim, os norte-americanos podem ser estimulados a plantar mais soja pela redução de oferta no Brasil, seu principal concorrente no mercado externo.
Assim, a relação estoque/consumo de soja deve subir para 9% na safra 2024/25, com uma recuperação expressiva em relação aos valores de um dígito baixo no ano passado. No caso do milho, essa razão pode aumentar para 18% em 2024/25, em comparação com 15% na temporada 2023-24 e do patamar abaixo de 10% vistos entre 2021 e 2023.
- 2. A Argentina está de volta
A recuperação da produção na Argentina na safra 2024-25 deve mais do que compensar a queda na produção brasileira (estimada em 148 milhões de toneladas de soja pelo Citi). E, dependendo da evolução da nova política macroeconômica após a eleição de Javier Milei, a Argentina pode voltar com força ao mercado exportador.
Uma desvalorização da moeda argentina, produção de grãos em alta e um potencial pico na inflação na Argentina nos próximos três a seis meses podem significar uma venda de estoques por parte dos produtores argentinos e um retorno às exportações, avalia o analista do Citi.
- 3. Comércio forte no Mar Negro
Mesmo sem um acordo para manutenção do corredor para exportação de grãos pelo Mar Negro desde meados do ano passado, a Rússia continua aumentando as suas exportações de grãos, refletindo colheitas fartas e melhorias logísticas. Para 2024, o Citi espera que os embarques continuem crescendo, mesmo sem um acordo para o corredor de exportação no Mar Negro.
Até no caso da Ucrânia, onde a produção agrícola foi altamente castigada pela guerra, as exportações de trigo atingiram 11,25 milhões de toneladas no quarto trimestre de 2023, uma queda de apenas 1,9 milhão de toneladas na comparação anual.
Resultado: a oferta de grãos no Black Sea continua extremamente competitiva, adicionando mais um componente baixista ao cenário global. Os preços à vista de grãos na Rússia estão bastante estáveis e mais baratos do que nos EUA, lembrou Doshi.
- 4. Demanda global fraca
A demanda global é vista como estável, mas há riscos de enfraquecimento considerando um PIB fraco em 2024. O cenário base do Citi é de recessão na Europa e nos EUA, o que pode afetar mais a demanda por soja em comparação com outras commodities agrícolas.
Quanto à China, principal importador da oleaginosa, a expectativa é de um leve crescimento nas importações nesta safra, ao redor de 1% para 102 milhões de toneladas, com uma expansão um pouco maior em 2024/25, para 105 milhões de toneladas. “Mas esse aumento na demanda não será tão grande como o aumento na produção global no próximo ano”.
As importações de milho do país asiático também devem aumentar para 24 milhões de toneladas, ante 19 milhões em 2022/23, mas com potencial de crescimento limitado por uma alta de 10 milhões de toneladas na produção local, segundo estimativas oficiais.
- 5. Posição dos fundos
Os fundos devem manter uma posição vendida no mercado de soja e de milho. As curvas dos contratos futuros sugerem que os traders estão menos preocupados com um cenário de escassez de oferta.
“A posição comprada (dos fundos) que teve início no começo de 2023 para soja e milho virou para uma posição vendida. E esperamos que os fundos mantenham essa posição entre neutra e vendida”, disse o analista.