Depois de passar mais de 14 anos em multinacionais, liderar o lançamento da primeira plataforma de sementes transgênicas no Brasil e de criar (e vender) duas empresas, Mário Carvalho poderia ter desacelerado. Mas, há dez anos, montou o seu terceiro negócio, que hoje está entre as maiores empresas de sementes do País.
A goiana Seedcorp|HO tem dois grandes diferenciais: a presença em toda a cadeia de sementes (do germoplasma à venda) e três sócios de peso — o grupo argentino DonMario (GDM), dono do maior banco de germoplamas no País, a Bunge, líder global em esmagamento de soja, e a UPL, uma das maiores fornecedoras de defensivos agrícolas.
A Seedcorp nasceu como uma plataforma para multiplicação de sementes, em Goiânia, e foi passando por transformações com a entrada dos sócios. A primeira aconteceu em 2017, numa fusão de iguais com a GDM, o que permitiu uma mudança na rota da companhia e adicionou a extensão HO (nome do grupo argentino que controla a GDM) ao seu nome.
Além da capitalização e do sobrenome, a GDM proporcionou à empresa criada por Carvalho tornar-se também uma empresa de genética. Ao receber um banco de germoplasma da GDM, a Seedcorp adotou um modelo totalmente verticalizado, inédito no País.
A fusão também deu fôlego para a expansão regional da Seedcorp|HO, cuja presença estava limitada ao Centro-Oeste. “A empresa tomou outra dimensão”, lembrou o empresário. Passou a atuar em todo o Brasil, no Paraguai, Uruguai e Argentina.
Hoje, no Brasil, a Seedcorp|HO ocupa a “terceira ou quarta posição” entre os produtores de sementes e detentores de genética, atrás apenas de Bayer e da própria GDM, que é um concorrente apesar de possuir uma fatia na sementeira brasileira. “A gente quebra o pau no campo”, brincou o CEO. “Eles são acionistas, mas cada um tem a sua estratégia.”
Com uma participação de mercado de aproximadamente 8%, a Seedcorp|HO está muito próxima da TMG, mas à frente de empresas globais como Syngenta e Basf, diz Carvalho.
Ele atribui o sucesso ao time de executivos que montou —a grande maioria com origem em multinacionais do setor— e ao modelo de negócios baseado na meritocracia. “Eles também são donos. Todos os diretores têm um percentual acionário. Então, num evento de liquidez, eles também são beneficiados.”
A entrada de Bunge e UPL
Com o passar dos anos e o novo modelo de negócios, a Seedcorp|HO atraiu o interesse de mais gigantes. No ano passado, Bunge e Advanta Seeds, empresa de sementes da UPL, compraram uma participação de 20% cada na companhia. Dessa sociedade, que completa um ano na próxima semana, as sinergias estão só começando, diz Carvalho.
No caso da associação com a Bunge, um grande benefício para a Seedcorp é um maior acesso aos produtores. “A Bunge deve ter 30 mil clientes no Brasil. Eu tinha 1.850. A Bunge tem grandes investidas no setor de distribuição, é dona da Origeo, da Sinagro e da Pantanal. E a Seedcorp passa a ser um fornecedor próximo dessas investidas da Bunge”, disse Carvalho mencionando grandes varejistas agrícolas.
A Seedcorp tem hoje 90 vendedores no campo, além de 20 colaboradores que trabalham no posicionamento dos lançamentos entre os produtores —a empresa vende sementes com marca própria e licencia genética para multiplicadores. Na área de pesquisa e tecnologia, são cerca de 40 pessoas.
No caso da UPL, as trocas podem acontecer no desenvolvimento de um novo mercado para a Seedcorp|HO. “A UPL também tem um germoplasma de sorgo e, possivelmente, vamos começar a vender sorgo”, revelou. Sem contar nas contribuições dessas grandes corporações para a governança e nas discussões de conselho.
“É hora de fazer o simples”
A Seedcorp|HO teve um faturamento de R$ 636 milhões em 2023, uma retração ante os R$ 778 milhões do ano anterior devido à queda de aproximadamente 30% no valor de comercialização das sementes, em média. “Foi um ano difícil para todos no mercado de insumos”, disse.
O Ebitda da empresa somou R$ 80,4 milhões, com margem de 12,7%, um pouco abaixo da média histórica de 15%, segundo o CEO.
Com margens menores, as empresas agrícolas e os produtores devem adotar uma postura extremamente cautelosa na próxima safra, com corte de custos. A expansão de área de soja na safra 2024/25 deve ser a menor em muitos anos, enquanto o nível de tecnologia no campo pode ser reduzido, mas sem mudanças significativas que causem perdas drásticas de produtividade, acredita. O ajuste, para ele, deve durar mais um ou dois anos.
“Muita cautela, menos risco. É hora de fazer o simples. Manter a sua estratégia e ter resiliência, porque vamos voltar. A agricultura volta rápido demais”, afirmou. “Já vi situações muito piores do que essa. Nos meus tempos de estrada, vi situações em que a ferrugem da soja destruiu tudo. Aquilo sim quase zerou o produtor.”
Crescimento orgânico
Enquanto a expectativa de consolidação no mercado de sementes aumenta, Carvalho afirma que a estratégia da Seedcorp|HO é o crescimento orgânico. “Eventualmente, podemos comprar um ativo no setor de multiplicação de sementes, por exemplo. Poderia fazer sentido porque compramos 2 milhões de sacas de sementes por ano. Mas isso não significa uma consolidação”, afirmou. “O nosso negócio é pesquisa, geração de demanda e venda.”
No caso de Mário Carvalho, o negócio é genética e criar empresas. A Seedcorp|HO é sua terceira empreitada. Seu início de carreira foi em multinacionais do agro, como a Manah (de fertilizantes) e a Monsanto, onde mergulhou no mercado de sementes. Lá, ele liderou a implantação da tecnologia Roundup Ready, a primeira variedade de soja transgênica no País. Deixou a Monsanto em 2000 para fundar a Sementes Goiás, que hoje pertence à Nutrien.
Em menos de dez anos, criava em parceria com um fundo a sua segunda empresa, a Soytech Seeds, que, ao contrário de sua primeira sementeira, era focada em genética. Três anos depois, vendeu a companhia para a Bayer, onde ficou durante dois anos para comandar o phase out. Logo depois, criou a Seedcorp|HO junto com outros três sócios.
“Prometi para a minha esposa que esta será a última”, brinca. Será que ele para por aí?