Opinião

A nova locomotiva da demanda global por grãos

Exportações brasileiras de grãos e farelo de soja devem crescer em 100 milhões de toneladas na próxima década

Não dá para contar a trajetória bem-sucedida do agronegócio brasileiro nas últimas duas décadas sem considerar o papel fundamental exercido pela China.

Até aí não há nada de novo: o brutal processo de ascensão social do país mais populoso do mundo impulsionou o consumo de carnes e arrastou consigo a demanda de grãos, abrindo a oportunidade para que o Brasil aumentasse a área plantada de soja em mais de duas vezes num período de 20 anos e se transformasse no maior produtor e exportador global.

Acontece que está para começar um novo capítulo nessa história. Como mostramos no artigo anterior publicado em The Agribiz, a demanda chinesa por grãos continua vigorosa, mas dificilmente continuará crescendo com o mesmo fôlego —o que é natural considerando o amadurecimento do seu mercado. A boa notícia é que não ficaremos sem uma nova locomotiva para puxar a demanda internacional de grãos.

Nossas projeções mostram que mais de dois bilhões de pessoas devem ascender na escala de riqueza global na próxima década, num processo similar ao que aconteceu com os chineses nos últimos 20 anos.

Produção agrícola brasileira deve repetir, nos próximos dez anos, o crescimento que apresentou nos últimos 20 | Crédito: Shutterstock

Esse novo contingente vive majoritariamente em países como Índia, Bangladesh, Nigéria e outros mercados asiáticos, africanos e do Oriente Médio. Sua ascensão, porém, será numa velocidade menor do que no caso da China, que nas últimas duas décadas contribuiu majoritariamente para que 1,5 bilhão de pessoas saltasse de níveis de renda, em média, a cada cinco anos. Agora poderemos acompanhar esse novo contingente superior a dois bilhões de pessoas subindo na faixa de renda per capita a cada dez anos.

100 mi de toneladas em dez anos

Não é só o crescimento econômico que deve impulsionar a demanda global de commodities na próxima década. Existe ainda o crescimento populacional, ainda que essas taxas estejam se tornando rapidamente negativas na maior parte do mundo.

Além disso, as políticas de transição energética favorecem o aumento da participação dos biocombustíveis como o etanol (ponto positivo para a demanda de milho); o biodiesel e o HVO (que favorecem a demanda de soja); e o SAF (Sustainable Aviation Fuel para abastecer aeronaves, que pode ser proveniente tanto da soja quanto do milho).

Por fim, existe uma tendência declinante nos níveis de autossuficiência na produção de alimentos como soja, milho e proteínas em geral, tanto em termos globais como particularmente no caso da China e dos demais mercado asiáticos. Em outras palavras, cada vez mais os países estão recorrendo às importações para alimentar suas populações, reforçando o trade.

Evidentemente, devem ocorrer imprevistos e incertezas ao longo do caminho, assim como tivemos de 2002 para cá uma grande crise econômica (em 2008) e a maior crise sanitária dos últimos 100 anos com a Covid-19. Mas, se não houver percalços tão significativos, nossas projeções indicam que o Brasil continuará fazendo nos próximos dez anos aquilo que fez nos últimos 20.

Estamos iniciando o que deve ser um novo ciclo de commodities.

A área plantada de grãos continuará crescendo, ainda que num ritmo menor — até pelo fato de que as terras se tornam cada vez mais caras e os investimentos, mais arriscados. Para compensar uma expansão de área mais moderada, o nível de tecnologia no campo tende a continuar subindo.

Nossas projeções indicam que as exportações brasileiras de soja, milho e farelo devem crescer perto de 100 milhões de toneladas na próxima década — e isso apenas para manter as atuais participações do país no mercado internacional desses três produtos.

Para a cadeia do agronegócio, isso representa mais oportunidades e grandes desafios em todos os setores do Agro. Mas fomos capazes de chegar até aqui, apesar das muitas dificuldades. Temos tudo para continuar seguindo adiante.