Em uma operação de escala inédita, a Agrogalaxy acaba de concluir uma captação de R$ 500 milhões para comprar defensivos agrícolas, ganhando poder de fogo para pagar as fabricantes de insumos à vista e negociar preços melhores.
Em um negócio de margens apertadas como é uma revenda — ainda mais em tempos como os atuais —, a capacidade de negociar bem com os fornecedores pode determinar a rentabilidade (e a sustentabilidade financeira) de uma companhia.
“Historicamente, o banco financia a indústria de insumos e a indústria de insumos financia o distribuidor. Logo, o distribuidor sempre ficou refém do funding da indústria, porque é ela que dá prazo de pagamento”, disse Larissa Pomerantzeff, sênior advisor do Aqua Capital e membro do conselho de administração da Agrogalaxy, em entrevista ao The AgriBiz.
Uma das arquitetas da transação, a executiva conhece do riscado como poucos nessa indústria. Pomerantzeff já esteve do outro lado do balcão. Por dez anos, trabalhou na Syngenta, de onde passou por várias posições na área financeira (da tesouraria à controladoria) até o ápice como CFO no Brasil, cadeira que ocupou por dois anos e meio.
Estruturada a quatro mãos com a TerraMagna — fintech comandada por Bernardo Fabiani —, a captação começou a ser desenhada em meados do ano passado, ganhando corpo a partir de setembro.
Em poucos meses, a TerraMagna se tornou a principal provedora de dinheiro novo para a Agrogalaxy, garantindo um funding que promete transformar a forma como as revendas compram defensivos agrícolas.
“Por maior que você seja, a sua capacidade de negociar com o fornecedor vai ter um empecilho no final do dia que é o componente de crédito comercial que ele te oferece”, resumiu Bernardo Fabiani, CEO da Terra Magna.
Ao levantar os recursos com a fintech, a Agrogalaxy começa a mudar essa lógica, descorrelacionando o funding para comprar os insumos do produto em si.
O instrumento
Para captar os recursos, a TerraMagna estruturou um FIDC exclusivo para a Agrogalaxy. Gerido pela Milênio Capital — parceira de longa da data da fintech —, o fundo começou a captar em setembro.
Levantando em tranches, o fundo chegou aos R$ 500 milhões recentemente. Entre os investidores do fundo de direitos creditórios, estão bancos como o BV (o antigo Banco Votorantim) e family offices que já haviam colocado crédito no primeiro FIDC da TerraMagna.
A captação mostra também que Fabiani conseguiu quebrar resistências de quem temia dar algum crédito atrelado à Agrogalaxy. O modelo de crédito da TerraMagna vem passando com louvor pelo batismo de fogo das últimas duas safras (2022/23 e 2023/24).
Enquanto players como a Nagro viram a inadimplência disparar, a investida de gestoras de venture capital como The Yield Lab e Softbank não só manteve os atrasos da carteira em níveis baixos como vem entregando uma taxa de retorno que impressiona.
Para a Agrogalaxy, a operação veio a calhar. “A semente já estava plantada, mas é quase aquele clichê: num ano de crise, aparecem as oportunidades”, disse Pomerantzeff.
Em seu FIDC tradicional, um veículo de cerca de R$ 700 milhões em patrimônio, a TerraMagna já tinha a Agrogalaxy como uma das revendas parceiras, mas o montante era menor e o dinheiro era usado para compras mais convencionais: sementes e defensivos.
Por que comprar defensivos à vista
Tradicionalmente, o grosso do crédito comercial às revendas é oferecido pelos fabricantes de defensivos agrícolas. Nas compras de fertilizantes e sementes, boa parte já era comprada à vista, contou Eron Martins, diretor financeiro e de relações com investidores da Agrogalaxy.
Com os recursos na mão, a rede de revendas pode comprar insumos com descontos maiores. A operação mexe com o relacionamento entre revenda e fornecedor.
A capacidade de um fabricante de insumos colocar uma faca sobre o pescoço da companhia se reduz. A empresa também pode privilegiar os fornecedores parceiros.
Mal comparando, é como um consumidor que decide comprar um carro. Se ele tiver o dinheiro à vista, as possibilidades são infinitas. Se não, vai o que couber no financiamento e, de preferência, com um banco parceiro da concessionária.
Ao negociar melhor com os fornecedores de defensivos agrícolas, a Agrogalaxy consegue gerenciar melhor as margens do negócio. Por isso, a rede de revendas e a TerraMagna consideram a captação como mais do que uma transação pontual. “É um programa”, ressaltou Fabiani.
À medida que o FIDC da Agrogalaxy ganhe maturidade —demonstrando que o retorno será atrativo para os investidores e a inadimplência, diminuta—, o fundo pode aumentar de tamanho.
“Esse é o bolso do poupador que, quase por definição, é infinito. Você capta mais demonstrando track record”, argumentou o fundador da TerraMagna. Neste mês de abril, quando os pagamentos dos produtores de soja estão concentrados, teremos uma primeira demonstração do desempenho do veículo.
Quanto representa
A Agrogalaxy não abriu quanto conseguirá economizar nas compras de insumos agrícolas, mas como a operação começou em setembro, certamente os ganhos de margens já começaram a aparecer no balanço.
Em 31 de dezembro, a linha de fornecedores de mercadorias da Agrogalaxy somava R$ 3 bilhões. A julgar por esse dado, os recursos do FIDC são bastante relevantes.
No longo prazo, a ideia da Agrogalaxy é ter recursos para comprar parte dos defensivos à vista em todas as safras, em um volume que seja suficiente para melhorar as margens.
Como regra, nunca fará sentido comprar tudo à vista. Se os preços dos defensivos desabam e há muito estoque como ocorreu no ano passado, a companhia ficaria sem margem de negociação.
“É preciso ter know how”, resume Martins, que antes da Agrogalaxy passou pela concorrente Lavoro e também por indústrias de insumos, em companhias como Adama e Agrex.
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Listada na B3, a Agrogalaxy está avaliada em R$ 359 milhões.