A frustrante produção brasileira de açúcar nesta safra foi um catalisador importante para a mudança na posição dos fundos de hedge, passando de vendidos para comprados. Uma mudança que levou os preços a dispararem quase 30% em cerca de dois meses na Bolsa de Nova York.
Mas esse não é o único fator que está direcionando o mercado futuro. A Índia é outro elemento importantíssimo nessa equação.
Para incentivar a produção do adoçante na Índia, segundo maior produtor mundial, o preço do açúcar tem buscado a paridade do etanol naquele país, chegando a 22,20 centavos de dólar por libra-peso, observou Plínio Nastari, fundador da Datagro, durante evento do setor que a consultoria promove anualmente em São Paulo. Em meados de agosto, o contrato estava em torno de 17 centavos de dólar por libra-peso.
Mas a situação é mais complicada do que um jogo de preços. Como a produção de etanol na Índia é altamente influenciada pelo governo, sobram dúvidas a respeito do montante de açúcar que será colocado para exportação em meio ao aumento da mistura do biocombustível na gasolina.
Em agosto, a mistura de etanol na gasolina chegou a 15,8%, ante 12,7% no início do ano. O consumo de gasolina no país está, hoje, 7,1% maior do que no mesmo período do ano passado.
“Inicialmente, estimava-se que o açúcar convertido etanol ficaria um pouco abaixo de 4 milhões de toneladas, mas agora já se antevê que serão convertidas 5 milhões de toneladas só neste ano”, afirmou Nastari nesta segunda-feira.
A conta só deve crescer. A mistura de etanol na Índia pode superar 18% ainda neste ano, colocando o país muito perto da meta de 20% em 2025.
Com isso, a produção indiana de açúcar deve ser de 29,4 milhões de toneladas, estima a Datagro. Desse total, a previsão da consultoria — corroborada por outros dois executivos indianos ao longo do dia — é de que o governo autorize a exportação de apenas 1 milhão de toneladas. A confirmação (ou não) só será anunciada oficialmente entre fevereiro e março do ano que vem.
O complexo jogo do açúcar (e do etanol) na Índia
A Índia, diferentemente do Brasil, tem a maior parte de seu etanol vindo de grãos. Hoje, 60% da oferta do biocombustível no país não tem origem na cana de açúcar, um importante fator para entender por que a Índia já superou o montante ‘encomendado’ por empresas de petróleo no país: elas requisitaram 9,16 bilhões de litros de etanol anidro e o setor hoje já oferece 9,7 bilhões de litros.
Desse total, 3,9 bilhões de litros vêm da cana-de-açúcar, enquanto os demais 5,7 bilhões de litros vêm dos grãos, principalmente milho. Os grãos já respondiam por mais da metade da oferta no ano passado e, neste ano, chegaram a 60%.
O etanol é comprado por cinco companhias de petróleo, sendo três governamentais e duas privadas. As compras são feitas por meio de um processo de licitação multianual, que prevê quantidades trimestrais de etanol compradas a um preço fixado pelo governo — que pode variar de acordo com a matéria-prima. Por exemplo, o preço do milho foi revisado em janeiro de 2024 para incentivar a produção de etanol de milho.
“A Índia gasta US$ 200 bilhões por ano importando combustível. O etanol ajudou a reduzir essa conta entre US$ 4 bilhões a US$ 5 bilhões e deve aumentar para US$ 10 bilhões neste ano. Ou seja, 5% do combustível deve vir de fontes renováveis, principalmente milho”, disse Anup Kumar, diretor geral da Sucden India, companhia especializada em trading de commodities.