Mercado

Por que o Brasil tem o milho mais caro do mundo

Preço do milho disponível no interior de São Paulo supera valores nos portos dos EUA, Argentina e Ucrânia com forte demanda do setor de carnes e de etanol de milho

Colheita de milho | Crédito: Schutterstock

Por muito tempo dono do milho mais barato do mundo, o Brasil agora tem o grão mais caro entre os principais fornecedores — uma situação que expõe uma nova dinâmica de mercado que pode resultar em menores embarques do segundo maior exportador mundial daqui para frente.

O preço do milho disponível em Campinas, uma das principais referências no mercado brasileiro, estava em R$ 88 reais por saca na semana passada, o equivalente a aproximadamente US$ 255 por tonelada, segundo cálculos da consultoria AgRural.

No maior patamar desde 2022, o preço no interior de São Paulo supera os valores de exportação do milho nos Estados Unidos e na Argentina. Na semana passada, a tonelada do milho embarcado no Golfo do México estava em US$ 205, enquanto os argentinos exportavam por US$ 213 a tonelada, segundo a AgRural. Na Ucrânia, outro relevante fornecedor de milho, o preço nos portos era de US$ 238 por tonelada.

Na prática, apenas os consumidores locais estão pagando esses preços elevados pelo grão. No porto de Santos, na mesma data, o preço de exportação era de US$ 218 por tonelada, mais baixo do que na origem do que na Ucrânia, mas os valores podem ser considerados virtuais pois não há milho disponível no momento. O Brasil está fora do mercado de exportação de milho — os portos estão totalmente focados nos embarques de soja, e os agricultores estão plantando a segunda safra de milho, cuja colheita começa em junho.

O diferencial de base entre o milho brasileiro e o norte-americano se tornou positivo nas últimas semanas, numa situação incomum. Nos últimos anos, os preços do milho brasileiro raramente foram mais altos do que os dos Estados Unidos. Isso aconteceu em 2016, quando a produção brasileira despencou devido a condições climáticas adversas, levando produtores de carne a importar milho de países como Argentina e até dos EUA.

Nos últimos anos, a história tem sido diferente: sucessivos recordes na produção brasileira impulsionaram as exportações de milho, permitindo que o País superasse os EUA como o maior fornecedor mundial do grão em 2023.

No ano passado, a produção caiu devido a condições climáticas adversas, deixando os estoques mais apertados. Ao mesmo tempo, a demanda por ração permaneceu forte e os embarques continuaram em um ritmo satisfatório.

Nesse cenário, o aumento da demanda por um novo consumidor, a indústria de etanol de milho, deixou o balanço entre oferta e demanda ainda mais apertado. Na safra 2024/25, as usinas consumiram cerca de 19 milhões de toneladas de milho, ante apenas 4 milhões de toneladas há cinco anos, segundo dados da Unem, associação que representa o setor.

“Com a produção menor, boas exportações e as usinas de etanol de milho impulsionando a demanda, o setor de carnes ficou alarmado e começou a oferecer preços mais altos para incentivar os agricultores a venderem o milho que estavam estocando”, disse Daniele Siqueira, analista da AgRural. “E quando os agricultores veem compradores oferecendo preços mais altos, eles pedem preços ainda maiores. É uma bola de neve.”

O impacto na ração

As indústrias de aves e suínos começaram a sentir os efeitos do milho mais caro. O custo com ração — que representa cerca de 70% do custo total de produção de frangos e suínos— aumentou 11% no Brasil, segundo um indicador calculado pela Embrapa.

Os resultados do quarto trimestre da BRF e da Seara já mostraram uma redução nas margens em relação ao pico registrado no terceiro trimestre — embora ainda continuem em patamares historicamente bastante elevados devido a uma oferta apertada de carne de frango.

“O Brasil tem hoje o milho mais caro do mundo”, destacou o CEO da JBS, Gilberto Tomazoni, em entrevista para comentar os resultados na semana passada. Mas demonstrou otimismo em relação aos custos nos próximos meses.

“Se não houver eventos climáticos inesperados, tem mais possibilidade de o preço do milho cair do que subir. Podemos até ver uma redução nos custos”, disse Tomazoni, observando que abril e maio são cruciais para determinar o tamanho da safrinha, que responde por mais de 70% da produção total brasileira.

Até agora, as lavouras de Mato Grosso tiveram um bom início, segundo Siqueira. No entanto, outros estados produtores enfrentaram um mês seco e um risco maior de perdas por geadas neste outono, já que o plantio foi mais tardio neste ano.

Exportador de excedente

Com o alto grau de incertezas, os preços devem permanecer firmes até o início da colheita da safrinha, em junho. “Quando a colheita começar, os preços cairão. A dúvida é o quanto”, disse Siqueira.

Para André Pessôa, CEO da Agroconsult, os preços do milho no Brasil devem permanecer cerca de R$ 10 acima dos níveis do ano passado durante a safrinha. “Se a produção falhar devido a problemas climáticos, haverá um excedente menor para exportação”, disse ele em entrevista coletiva na semana passada.

“O Brasil ainda é um exportador de excedente”, completou Daniele. “Os Estados Unidos estão tomando o mercado com muita força. Se tiverem uma grande safra novamente, não tem para ninguém.”

Ao que tudo indica, ela virá. Na segunda-feira, o Departamento de Agricultura dos EUA informou que os produtores norte-americanos aumentarão o plantio de milho em 5% na safra 2025/26, atingindo a maior área desde 2020.

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