Os prêmios de exportação pagos pela soja brasileira estão negativos em quase US$ 1 por bushel no porto de Paranaguá. Ainda que o enfraquecimento dos prêmios seja um movimento sazonal, esperado durante a colheita, desde o ano passado a intensidade da queda e sua duração têm chamado atenção do mercado — e tirado o sono de muitos produtores.
“Isso é um agravamento do problema de falta de capacidade de armazenamento de grãos”, diz Carlos Cogo, sócio da Cogo Consultoria em Agronegócio. “Até 2018, havia falta de capacidade, mas era algo razoavelmente administrável. Não era como agora”.
A queda nos prêmios de exportação não é novidade, assim como o déficit na estrutura de armazenamento do país. Mas, nos últimos 20 anos, os prêmios, em geral, oscilavam sempre no terreno positivo. Caíam para níveis perto de zero durante a colheita da soja, mas voltavam a subir logo depois, observa Cogo.
A dinâmica começou a mudar com a explosão da safrinha de milho. Entre as safras 2017/18 e 2022/23, a produção do cereal na segunda safra praticamente dobrou, passando de 54 milhões para 102 milhões de toneladas. “Prêmios negativos nessa intensidade começaram no ano passado e continuam neste”, afirma o consultor.
Em abril do ano passado, a soja brasileira chegou a ser vendida com um desconto de US$ 2 por bushel em relação aos preços praticados na Bolsa de Chicago. No final de 2023, voltaram para o terreno positivo à medida que a oferta da América do Sul diminuiu. Mas voltaram a ficar negativos em janeiro, mesmo com a piora nas perspectivas para a colheita brasileira. Ontem, fecharam em US$ 0,90 por bushel, segundo o Cepea.
“O grande ponto que explica os prêmios negativos é a oferta abundante”, afirma Luiz Fernando Roque, analista da Safras & Mercado. Apesar da quebra na safra brasileira, os produtores brasileiros ainda devem colher a segunda melhor safra de soja da história. “É um volume relevante”, acrescenta o analista, que vê os prêmios de volta ao terreno positivo apenas no segundo semestre deste ano.
Oferta abundante
A pressão baixista sobre os prêmios também é explicada pela safra na Argentina, que deve colher o dobro dos volumes do ano passado. “Mesmo com a quebra no Brasil, a oferta da América do Sul vai ser maior este ano, e a dinâmica do prêmio é regional”, explica Gutierrez. “Se a maior parte dos produtores conseguisse segurar a soja, esse movimento seria menos acentuado.”
Para Daniele Siqueira, analista da AgRural, a influência do déficit de armazenagem sobre os prêmios tem sido menor nesta safra em comparação com a anterior, exatamente por causa da redução na produtividade. Segundo ela, alguns produtores estão renegociando pagamentos que seriam feitos em março e abril para evitar vender a soja no pico da colheita.
“Os produtores brasileiros estão evitando vender grandes volumes porque os preços estão baixos, mas não há como segurar tanta soja por muito tempo”, afirma.
A analista também chama a atenção para o ritmo das compras pelos chineses mais fraco do que o verificado no ano passado. Depois de terem importado muita soja brasileira da safra passada, os estoques na China estão elevados, e os importadores seguem esperando que os preços caiam aos níveis que consideram interessantes.
“O preço da soja colocada nos portos chineses está abaixo de US$ 450 por tonelada, nível mais baixo em quatro anos”, diz.
Na mão de terceiros
A capacidade de armazenamento do Brasil corresponde a cerca de 80% da produção nacional de grãos e oleaginosas, segundo a Conab. Nos EUA, há capacidade para armazenar mais de 130% da produção anual, conforme mostram os dados do USDA.
Além disso, enquanto os agricultores americanos detêm mais de 60% da capacidade total de armazenamento nos EUA, os produtores brasileiros possuem apenas 15%. Isso faz com que os agricultores percam oportunidades para negociar melhor a sua colheita. Muitos ainda procuram armazéns gerais para estocar parte de sua produção, mas essa alternativa também implica em aumento de custos.
Embora o governo brasileiro tenha aumentado os incentivos para os agricultores construírem armazéns e silos em suas propriedades, com taxas de juros até mais baixas do que as dos empréstimos para compra de máquinas, o ritmo de crescimento da capacidade de armazenamento é mais lento do que o necessário.
Enquanto a capacidade de armazenamento aumentou 45% entre 2010 e 2023, para 201,4 milhões de toneladas, a produção de grãos e oleaginosas saltou 95%, para 320 milhões de toneladas na última safra, segundo a Conab.
“O produtor não sabe quanto ele perde por não ter armazenagem na fazenda. Se ele soubesse, faria o investimento”, diz Carlos Cogo. O valor a ser desembolsado é alto e demora para ser recuperado —entre sete e dez safras, segundo o consultor. O valor adicional na receita do produtor, no entanto, varia entre 9% e 12%.
“O payback é longo, mas é garantido. Risco zero para o produtor”, afirma.
Mais problemas
À medida que as receitas dos agricultores caem devido a preços mais baixos das commodities e prêmios nos portos, a tendência é que os investimentos em nova capacidade de armazenamento também recuem — ou pelo menos fiquem estagnados — no curto prazo nas fazendas, possivelmente aumentando ainda mais o déficit de armazenamento e continuando a elevar o preço dos fretes no pico da colheita.
“Enquanto os agricultores brasileiros não perceberem a importância de ter espaço para armazenar a produção, continuarão perdendo o melhor momento para as vendas”, diz Cogo.
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