Guerra comercial

Tarifas, câmbio e riscos: o agro em campo minado

As rotas comerciais das commodities se ajustam, e os fluxos tendem a se redistribuir, limitando os impactos sobre a demanda agregada

Donaldo Trum no Salão Oval da Casa Branca; impõe tarifas

Nós sabemos como as crises começam — geralmente com decisões políticas que desorganizam expectativas. O que não sabemos é como terminam. A história mostra que medidas protecionistas, como as tarifas elevadas recentemente pelo governo Trump, podem ser o gatilho de desdobramentos complexos e difíceis de controlar.

A justificativa oficial é proteger a indústria americana e corrigir desequilíbrios nas relações comerciais, especialmente com a China. Mas os efeitos colaterais são imediatos — e amplos.

Os mercados acionários globais reagem com volatilidade. Empresas com cadeias produtivas internacionalizadas enfrentam alta de custos e redução de margens. Investidores, por sua vez, reavaliam riscos diante da perspectiva de desaceleração econômica global.

É essencial lembrar que esses movimentos ocorrem em um contexto macroeconômico delicado. A economia dos EUA opera há décadas com déficits gêmeos: fiscal e externo. Em algum momento, esses desequilíbrios precisam ser corrigidos. E o ajuste costuma ocorrer por uma de duas vias: inflação interna — resultado da monetização dos déficits ou da elevação de preços via tarifas — ou desvalorização da moeda, que corrige a balança comercial ao tornar exportações mais competitivas e importações mais caras.

No caso atual, a inflação já começa a aparecer como canal de ajuste: ao encarecer bens importados, as tarifas elevam os custos ao consumidor e às empresas, pressionando o índice de preços em um momento em que o crescimento global já está enfraquecido. Isso coloca o Federal Reserve em um dilema clássico: como conter a inflação sem sufocar a atividade?

Enquanto isso, os mercados de commodities demonstram maior estabilidade. A lógica da oferta e demanda física continua atuando com força. Produtos agrícolas, energia e minerais seguem sendo necessários em diferentes partes do mundo. As rotas comerciais se ajustam, e os fluxos tendem a se redistribuir com relativa agilidade, limitando os impactos estruturais sobre a demanda agregada. A reorganização do mercado de soja é exemplo claro: o Brasil ampliou exportações para a China, enquanto os EUA redirecionaram embarques a outros destinos.

Essa diferenciação entre ativos financeiros e mercados físicos é estratégica. Quem compreende os fundamentos — ciclos produtivos, estoques, rigidez de demanda — navega com mais clareza. Em tempos de ruído político e incerteza econômica, são esses fundamentos que indicam o rumo.

Direto da mesa de riscos

Volatilidade! O operador de mercado vive dela — mas para a maior parte da economia real, ela é nociva.

É justamente aí que entra a importância de Políticas de Risco bem desenhadas. Espero que a sua esteja funcionando neste momento de stress.

Merece destaque o movimento do Real nas últimas semanas. O mercado já precifica o fluxo da soja como sazonal, e, somando-se a isso uma percepção de adiantamento da corrida presidencial do ano que vem, temos um cenário que pode ser exacerbado com facilidade.

Mas os últimos dias lembraram que o Brasil não é uma ilha: o movimento foi violento e contaminado pelo exterior. Além disso, não podemos esquecer que o incumbente sempre entra com a vantagem do poder na mão — e ninguém entrega isso de bandeja.

A leitura de mercado está longe de ser trivial. Mas uma coisa continua valendo: a sorte sorri mais para quem está bem-preparado.

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Rafael Harada, colunista de The AgriBiz, é sócio da Rural e cofundador da Virtus Advisors. Possui mais de 20 anos na gestão de riscos de commodities e câmbio na JBS, onde foi diretor global de gestão de riscos.