Logística

“De Sinop para baixo, a Rumo é mais competitiva que o Arco Norte”

Maior operadora de ferrovias do País sofreu com o atraso na comercialização de soja, mas manteve investimentos para aumentar sua vantagem em Mato Grosso

O atraso na comercialização de soja não atrapalhou apenas a vida das revendas que precisam receber a fatura dos insumos. O comportamento do agricultor também bagunçou o preço dos fretes, dificultando as operações da Rumo — a maior operadora de ferrovias do País.

Em um bolsa cada vez mais contaminada pela crise fiscal, a situação dos fretes agrícolas adicionou pressão sobre as ações da controlada da Cosan. Enquanto o Ibovespa cai 9% no acumulado do ano, os papéis da Rumo recuam 13%, com a companhia avaliada em R$ 36 bilhões.

Nas últimas semanas, no entanto, a disparada do dólar ajudou a destravar as vendas de soja, trazendo benefícios indiretos para as operações da Rumo, notaram os analistas liderados por Pedro Bruno, da XP Investimentos, em um relatório enviado a clientes na semana passada.

Em maio, o volume transportado pelas ferrovias da Rumo somou 7,1 bilhões de TKU (toneladas por quilômetro útil), um salto de 6,5% na comparação com o mesmo período do ano passado e de 8% em relação a abril.

“A safrinha passou por revisões para cima recentemente, o que deve diminuir a preocupação dos investidores com o volume de transporte e com o preço do frete para 2025”, apontaram os analistas, reiterando a recomendação de compra para as ações da Rumo.

Apesar dos baixos preços dos grãos, o guidance da empresa para 2024, de um Ebitda entre R$ 7,2 bilhões e R$ 7,7 bilhões, parece viável considerando que os contratos de take or pay garantem uma boa demanda para a companhia, acrescentou a XP.

Ver quanto desse cenário benigno vai, de fato, se concretizar, é tarefa para o segundo semestre. Em entrevista ao The AgriBiz, Eudis Furtado, vice-presidente comercial e de desenvolvimento de negócios da Rumo, reforçou a busca da companhia por eficiência e competitividade.

A ferrovia em Mato Grosso

Especialmente no Mato Grosso, região em que a companhia detém a primeira concessão estadual para uma ferrovia no Brasil, as oportunidades da Rumo são relevantes.

No trecho que vai de Rondonópolis a Lucas do Rio Verde, a Rumo vai se conectar à Malha Paulista, facilitando o acesso ao porto de Santos. Os primeiros efeitos dessa nova construção devem ser sentidos a partir de 2027, quando fica pronta a primeira fase do projeto, que envolve uma construção de 200 quilômetros de ferrovias a partir de Rondonópolis.

Considerando o projeto inteiro, que deve ficar pronto em 2030 e envolve a construção de 740 quilômetros de ferrovias, o benefício aos produtores de grãos vai chegar a, em média, US$ 5,50 por tonelada graças à redução do trecho rodoviário, que vai cair dos atuais 600 quilômetros para cerca de 100 quilômetros.

Na nova rota a ser estabelecida pela Rumo, a distância percorrida por rodovias — o frete mais caro para o produtor — será de 40% a 45% menor do que o trecho pelo chamado Arco Norte.

Pelo Arco Norte, o percurso é de 28,5 mil quilômetros, enquanto pelo Porto de Santos a distância fica em 23 mil quilômetros. “A gente tem uma eficiência de US$ 4 a US$ 5 por tonelada quando você fala de abastecer a Ásia, 60% da exportação do Brasil”, diz Furtado.

Para chegar a esse objetivo, ainda há um longo caminho — e bilhões em desembolsos. Só neste ano, a maior parte dos R$ 5 bilhões em capex da Rumo vão para a construção do projeto em Mato Grosso. No ano passado, o orçamento de investimentos foi de R$ 3,5 bilhões.

Benefício no etanol

Além de conseguir escoar grãos, a Rumo também vai ganhar mais competitividade no transporte de etanol de milho. Com a conclusão das obras, a operadora ferroviária vai ficar mais perto de Nova Mutum e Lucas do Rio Verde, onde ficam usinas da Inpasa e FS, respectivamente

Com o projeto, a Rumo vai encurtar as distâncias até a refinaria de Paulínia (SP). “O Mato Grosso é deficitário em derivados, ou seja, gasolina e diesel. Então, a gente descarrega o vagão com etanol em São Paulo e carrega com diesel e gasolina e sobe para abastecer. O trem só roda praticamente cheio”, emendou Eudis.

A logística de fertilizantes também será beneficiada. “A gente desce com o grão para exportar, limpa o vagão, recebe fertilizantes no terminal e volta para entregar para o produtor. Com isso, ficamos ainda mais eficiente”. Atualmente, a Rumo traz para o Mato Grosso em torno de 3 milhões de toneladas de fertilizantes por ano.

No Estado líder em produção agrícola, a Rumo tem aproximadamente 40% de market share, considerando soja, milho e farelo de soja. A companhia vê espaço para avançar ainda mais em outros Estados. Em Goiás, a participação é de 26% no mercado. A companhia também olha para alternativas que possam trazer maior eficiência em outros estados-chave, como o Tocantins.

“Você vai me perguntar se eu consigo ser mais eficiente para escoar uma produção no Maranhão do que a via pelo Arco Norte e eu te digo que não. Essa é uma soja, por exemplo, que não conto no meu plano. Agora, tudo que está no Mato Grosso, de Sinop para baixo, e toda soja do Goiás, e uma parte do Tocantins, a gente vê muito mais competitividade saindo por Santos e conseguimos ser líderes em custo”, diz.

Mais capacidade em Santos

Além de investir em aumento de trechos ferroviários no país, a Rumo também tem feito investimentos de olho no aumento de capacidade no Porto de Santos. Há um déficit de armazenamento nos portos, alvo de reclamações de dez entre dez exportadores.

Recentemente, a Rumo anunciou uma parceria com a DPW, empresa dos Emirados Árabes, para construir um novo terminal, com capacidade de 9 milhões de toneladas de grãos e 3,5 milhões de toneladas de fertilizantes. O investimento compreende um desembolso total de R$ 2,5 bilhões, que sai integralmente do caixa da Rumo. “A gente arrendou a área e vai fazer o investimento por um período pré-determinado”, diz Furtado.

Esse terminal é um TUP (Terminal de Uso Privativo), ou seja, não é um terminal da União. Portanto, não precisa de licitação, sendo necessário apenas o licenciamento ambiental. Depois do aval dos órgãos ambientais, são mais 25 a 30 meses de obras. A expectativa da Rumo é terminar as obras em 2027.

“Vem em conjunto com a nossa chegada daquele novo terminal, então de forma que a gente mantenha essa coordenação de capacidade. Não adianta abrir capacidade em um pedaço e não ter no porto”, diz Furtado.

Para construir essa capacidade de investimentos, a companhia reciclou capital ao vender dois ativos. A Rumo se desfaz da participação nos terminais T16 e no T19 (ambos no porto de Santos) à CLI, companhia controlada por IG4 e Macquaire.

A operadora ferroviária também vendeu a participação de 50% que possuía no T39, que mantinha em sociedade com a Caramuru. A participação da Rumo foi vendida para a Bunge e para a Zee-Noh, uma cooperativa japonesa, por R$ 600 milhões.