
A cadeia produtiva da soja tem passado por transformações importantes nos últimos anos e a safra 2023/2024 não foi diferente. Projetada inicialmente em 164,7 milhões de toneladas, ela sofreu fortes reveses climáticos, especialmente no Centro-Oeste. Nossos números recém-divulgados em www.abiove.org.br/estatisticas/ a estimaram em 154,4 milhões de toneladas, ou seja, uma perda relevante.
Quando o quadro se tornou irreversível, a dúvida que se colocou foi sobre os impactos que isso teria para o balanço de oferta e demanda. Com o ritmo de exportações de soja em grão crescendo anualmente acima do esmagamento, o abastecimento doméstico parecia estar em risco e, com ele, a oferta de farelo e óleo.
Não foi o caso: a indústria brasileira teve um processamento recorde e fechou o ano em 55,8 milhões de toneladas, o que resultou na oferta de 42,7 milhões de toneladas de farelo e 11,3 milhões de toneladas de óleo.
Esses números foram sustentados, basicamente, por dois elementos: forte crescimento das exportações de farelo e um desempenho importante ante o aumento da concorrência internacional com os EUA e a Argentina.
Outro elemento relevante foi a elevação da mistura obrigatória de biodiesel para 14% desde março de 2024. As variações de 2023 para 2024 foram claras com a redução das exportações de 2,3 milhões de toneladas para 1,4 milhão de toneladas e o aumento das vendas internas de 8,7 milhões de toneladas para 9,9 milhões de toneladas.
Em suma, os contratempos na cadeia produtiva só não foram maiores porque houve fortalecimento da demanda por produtos. Neste ponto, ressalto o papel da demanda de óleo para biodiesel. Com uma geração de PIB e empregos 4 vezes maior por tonelada do que a exportação de soja in natura, o processamento de soja tem uma influência maior na economia local e na geração de renda. Assim, se a atividade industrial sofresse uma queda na mesma magnitude da safra, os efeitos seriam mais catastróficos.
Felizmente, não foi isso que aconteceu, conforme mostram os cálculos do Cepea em parceria com a Abiove (https://www.cepea.esalq.usp.br/br/pib-da-cadeia-de-soja-e-biodiesel-1.aspx). Neste aspecto, cabe mencionar a queda nominal de 20% dos preços desde janeiro de 2024 e os efeitos diretos nos custos das rações animais.
A nova safra
Para a safra 2024/2025, há boas perspectivas, com a expectativa de colheita de 170,9 milhões de toneladas, recorde histórico. Mais que isso, o Brasil produzirá mais que os EUA e a Argentina juntos — o segundo e terceiro maiores produtores. Uma marca de orgulho para todos que se empenham nesse setor.
O esmagamento é avaliado em 57,5 milhões de toneladas, novo pico, e deve gerar 44,1 milhões de toneladas de farelo e 11,5 milhões de toneladas de óleo. No farelo, os números ainda devem apresentar mudanças e oportunidades, visto que o estoque final pode chegar a 3,6 milhões de toneladas. Ou seja, a depender do crescimento interno e dos ventos (ou turbulências) internacionais, poderemos conquistar novos mercados.
Para o óleo, a surpresa veio pela mudança na decisão sobre a mistura de biodiesel. Programada para ser elevada para 15% desde 1º de março, foi mantida em 14% sem data de revisão. Isso certamente terá impactos negativos para o setor, que já estava preparado com a aquisição de insumos, e para o Brasil, com o maior dispêndio na importação de diesel fóssil, menor geração de empregos e aumento da poluição.
Sem dúvida, é um agravante para um segmento que vem sendo duramente penalizado pelas fraudes nas vendas de diesel comercial com menor mistura de biodiesel, as quais vêm sendo combatidas com o endurecimento da fiscalização. Além disso, as quedas nos preços do óleo refinado observadas desde janeiro deste ano abrem espaço para revisão dessa decisão.
De fato, o ano deverá apresentar condições propícias para novos avanços do setor, seja no mercado interno, seja nas exportações. Com estoques finais em volumes elevados, a qualidade dos produtos e a competitividade do setor, poderemos atingir marcas ainda mais impressionantes e colocar o Brasil em posição de destaque no mundo.