Queimadas

Área de cana afetada sobe, mas só o tempo dirá o tamanho do prejuízo

Plínio Nastari, presidente da Datagro, diz que agilidade na colheita das áreas afetadas pelas queimadas será fundamental para evitar prejuízos maiores

A área de cana-de-açúcar afetada por incêndios na última semana é maior do que a estimada inicialmente: pelo menos 80 mil hectares foram queimados, segundo a nova estimativa da Orplana (grupo que representa os produtores). O número subiu dos 59 mil hectares projetados na segunda-feira. No mercado, há quem fale em 100 mil hectares impactados.

Mas, como cana queimada não é cana perdida, muitas variáveis precisam ser consideradas ao estimar prejuízos — e muitas delas ainda são desconhecidas. Para Plínio Nastari, presidente da consultoria Datagro e principal referência em análises no setor, só com o passar do tempo será possível quantificar as perdas.

“Essa quantificação depende de quantos dias serão necessários para levar a cana do campo para a usina, o quanto vai dar de fermentação no campo… Não dá ainda para ter uma precisão”, afirmou Nastari ao The AgriBiz. “Mas o impacto com certeza existe e é negativo.”

Nos canaviais afetados, haverá perda de produtividade agrícola por causa da queima da cana que ainda não estava com o ciclo vegetativo completo. Também haverá perdas industriais devido à deterioração na qualidade da matéria-prima, pois começa a ocorrer uma inversão do açúcar na cana.

“A sacarose se transforma em glucose e a usina não consegue cristalizar para fazer açúcar, só produzir etanol”, explica Nastari. Se a cana queimada demora para ser retirada do campo, ela pode começar a fermentar. “Se levar para a indústria, pode haver contaminação dos processos e resultar em mais perdas industriais.”

Metade da safra já foi

Para avaliar o impacto na safra atual, também é preciso considerar que entre 60% e 65% do canavial já havia sido colhido antes do início das queimadas, neste final de agosto. Ou seja, apenas entre 30% e 35% da cana desta safra estaria sujeita a perdas pelas queimadas, caso tenham sido atingidas.

Mesmo assumindo que 100 mil hectares tenham sido queimados, e aplicando sobre eles um percentual de 40% de cana ainda a ser colhida, o impacto em volume seria de aproximadamente 3 milhões de toneladas, segundo Martinho Ono, CEO da SCA Trading. “É um volume insignificante perto da moagem total”, disse ao The AgriBiz. O Centro-Sul deve processar cerca de 190 milhões de toneladas este ano.

Para Martinho Ono, o principal impacto deve ser mesmo na qualidade da matéria-prima, que já vinha deixando a desejar e deve piorar ainda mais com os efeitos dos incêndios. “De agora em diante, vai ser mais difícil fazer açúcar”, afirma.

Outra incógnita são os impactos para a safra 2025/26. Caso as áreas atingidas já tenham sido colhidas, a produtividade agrícola deve cair e poderá ser necessário o replantio.

Para as usinas, os principais riscos estão na próxima safra, na visão do Bank of America. “Há preocupação sobre como ficarão as produtividades depois da degradação do solo e da cana, além do capex adicional que será necessário para recuperação das lavouras”, afirmou a analista Isabella Simonato em relatório. São Martinho e Raízen, afetadas pelas queimadas, operam em queda nesta quarta-feira.

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Em seu relatório quinzenal, publicado nesta quarta-feira com dados até 16 de agosto, a Unica (União da Indústria da Cana-de-açúcar) mostra que 49% da cana processada foi utilizada para fazer açúcar no acumulado da safra 2024/25, praticamente estável em relação à temporada anterior. O mix para o açúcar está bem abaixo das expectativas, que apontavam para um mix de até 52% neste safra devido aos investimentos recentes em capacidade de produção do adoçante.