O desarranjo global no mercado de insumos agrícolas ainda vai demorar para ser totalmente superado, o que talvez só ocorra em 2025. Em meio à enxurrada de estoques, um efeito colateral da corrida deflagrada pela guerra da Ucrânia, os preços desabaram, provocando uma reação em cadeia.
Nas revendas e distribuidores, o elevado nível dos estoques nos distribuidores já caiu consideravelmente em comparação com o primeiro semestre, após renegociações entre revendas e produtores de insumos para devolução de parte do inventário e campanhas de vendas agressivas junto aos agricultores. Mas ainda não é possível dizer que a situação está totalmente equacionada.
Para Cristiano Figueiredo, chefe da área comercial da gigante indiana UPL no Brasil, os estoques de fungicidas e inseticidas estão próximos da regularização, mas o mercado de herbicidas ainda pode ser um desafio na temporada 2024/25.
“Vemos 2023 e 2024 ainda como anos de transição no mercado de insumos no Brasil e no mundo”, diz Bruno Fonseca, analista do Rabobank.
Apesar de o banco estimar uma alta de 8% no consumo de fertilizantes neste ano, a demanda deve continuar abaixo do nível de 2021. A expectativa era de uma retomada mais significativa considerando a queda de 50% nos preços, em média, de janeiro a setembro. Mas isso não se confirmou.
Com a retração no preço dos insumos desde o início do ano e incertezas sobre os preços das commodities agrícolas, os produtores têm adiado as compras até o último minuto à espera de uma relação de troca mais atrativa.
Foi assim nos preparativos para o plantio da soja e se repete nos meses que antecedem a semeadura da safrinha de milho. Além do preço baixo do grão, o atraso na semeadura da soja posterga as decisões sobre a segunda safra, que acabou sendo jogada para fora da janela ideal e, portanto, ficando com um maior risco climático.
“Os estoques de fertilizantes estão em níveis adequados, o que existe é um problema de demanda”, afirma Santiago Franco Jaramillo, CEO da Cibra, uma das maiores empresas do setor no País.
Os atrasos nos pedidos de insumos refletem um fator estrutural e outro circunstancial, na avaliação dele. Além de buscar sempre a melhor relação de troca, o agricultor conta com a certeza de que vai receber o produto no tempo adequado, mesmo pedindo em cima da hora — resultado de melhoras logísticas recentes e, talvez, de um aumento na competição no setor nos últimos anos.
Impacto global
Os distribuidores de insumos agrícolas no Brasil foram os primeiros a apresentar os impactos negativos dos altos estoques, formados a preços bem mais altos do que os valores de mercado atuais, resultando em perdas. No mercado brasileiro, por exemplo, a Nutrien fez uma baixa contábil de US$ 465 milhões relacionadas aos negócios de varejo.
Depois do tombo, as revendas endereçaram o problema e, aos poucos, os estoques foram reduzidos. Empresas líderes no setor, como a Lavoro e a Agrogalaxy, veem os inventários perto dos níveis adequados no final deste ano.
Mas se nas revendas o pior já passou, os impactos dos descompassos na cadeia de insumos agora parecem maiores na outra ponta da cadeia. Produtores de agroquímicos e fertilizantes evidenciaram os efeitos da crise de insumos no Brasil em seus últimos relatórios trimestrais. Mais do que isso, as multinacionais têm revisado seus guidances para baixo devido aos problemas no Brasil, derrubando ações nas bolsas internacionais.
É o caso da FMC que cortou em 25% a projeção para o Ebitda de 2023 devido ao desbalanceamento de estoques no Brasil e anunciou uma reestruturação. Na Syngenta, as vendas globais de sementes sofreram fortemente os impactos da divisão no Brasil — também reflexo do ajuste de estoques. O mesmo ocorreu com as vendas de defensivos químicos da gigante controlada pela ChemChina.
Na Corteva, vendas de sementes de milho abaixo do esperado levaram a empresa a reduzir o seu guidance para os resultados de 2023. A empresa citou também pressão sobre os preços devido a um aumento na importação de defensivos genéricos, queda nas margens dos agricultores e atraso nos pedidos dos produtores, que insistem na compra “da mão para a boca”, além da continuidade no processo de redução de estoques.
Perspectivas
Depois da queda livre no preço dos insumos, a expectativa é de recuperação para o próximo ano, potencialmente melhorando as margens na distribuição.
“Já vemos uma tendência de estabilização e recuperação nos preços de fertilizantes e agroquímicos. Vemos isso nos nossos fornecedores e isso vai chegar na ponta”, disse Ruy Cunha, CEO da Lavoro, em entrevista recente ao The Agribiz.
No curtíssimo prazo, também há uma expectativa de aumento nos volumes. Os atrasos nas compras dos produtores, que prejudicaram os balanços do terceiro trimestre, devem refletir aumento das vendas no quarto trimestre do ano.
Wilson Romanini, CEO da Vittia, uma das líderes em produtos biológicos, disse na semana passada que o último trimestre do ano deve ser forte na esteira da regularização do clima. O CEO da Agrogalaxy, Welles Pascoal, deu uma perspectiva semelhante, revelando que as vendas da empresa bateram recorde em outubro, atingindo R$ 1 bilhão.