Crise

Agrogalaxy enfrenta sua hora mais escura — haverá amanhã?

Agrogalaxy não pagou R$ 70 millhões que devia aos detentores de CRAs e viu a parceria com a Biotrop esfarelar. Renúncia do CEO e debandada do board escalam a crise

Revenda agrícola da Agrogalaxy

A Agrogalaxy enfrenta sua hora mais escura. Depois de negar muitos boatos ao longo dos últimos anos, a rede de revendas controlada pelo Aqua Capital tomou uma decisão  drástica nesta quarta-feira que vai na direção contrária de tudo o que a companhia vinha tentando evitar: uma traumática recuperação judicial. (Mais tarde, nesta quarta-feira, a companhia oficializou o pedido de RJ, como você pode ler aqui)

Em um movimento que pegou a Faria Lima de surpresa, deixando gestores que possuem títulos de dívida da companhia em uma sinuca de bico, a Agrogalaxy atrasou um pagamento de R$ 70 milhões que venceu hoje, provocando arrepios na indústria de Fiagro.

O vencimento dessa dívida explica por que a companhia estudava a proteção judicial contra os credores por 60 dias. Como até lá a situação dificilmente se resolveria, a recuperação judicial foi inevitável. Às 17h, a companhia confirmou o pedido de recuperação judicial.

“Estou trabalhando para tentar reverter uma situação que parece não ter volta”, admitiu um dos mais importantes credores, que conversou com The AgriBiz pela manhã.

A falta de pagamento e o rumo escolhido para lidar com a crise provocaram um racha na companhia. No início da manhã, a Agrogalaxy anunciou a abrupta renúncia de Axel Labourt, que ocupava o cargo de CEO há apenas sete meses.

A saída do executivo argentino veio acompanhada de uma renúncia coletiva no conselho de administração, incluindo a de Welles Pascoal, CEO que antecedeu Labourt. A debandada intensificou dúvidas sobre os rumos da companhia e discordâncias em torno da recuperação judicial.

Neste momento, o sentimento é de que o último a sair terá de apagar a luz. Em outro duro golpe para a companhia, a Biotrop, fabricante de biológicos que ainda possui o Aqua Capital como sócio, desfez a parceria de fornecimento que mantinha com a Agrogalaxy, apurou The AgriBiz.

A rede de revendas é a maior cliente da Biotrop e já chegou a responder por 30% da receita, uma concentração que motivou intensas negociações durante o processo de venda da firma para os belgas da Biobest. Para fazer o M&A, aliás, o Aqua Capital havia se comprometido com um phase out, garantindo uma compra mínima de produtos da Biotrop pela Agrogalaxy.

A debandada do board

Do total de sete membros do conselho, cinco abandonaram a cadeira: Welles Pascoal, Benildo Telles, Larissa Pomerantzeff, Maurício Luchetti e Eduardo Terra deixaram o colegiado.

Os três primeiros são de alguma forma ligados ao Aqua Capital e os outros dois, independentes. Com a debandada, sobraram apenas os dois sócios da firma de private equity no conselho: Sebastián Popik e Tomas Romero.

Eron Martins, diretor financeiro, assumiu interinamente o comando, e a Agrogalaxy contratou Luiz Conrado Sundfeld para trabalhar na reestruturação financeira. Procurado pelo The AgriBiz, o consultor preferiu não comentar.

Desalento na Faria Lima

A crise da Agrogalaxy veio num timing péssimo para a Faria Lima. Depois de sinalizar por diversas vezes que uma recuperação do mercado de insumos agrícolas estava a caminho, uma narrativa que sempre esbarrou na realidade, a companhia pode ter arruinado as pontes com o mercado.

Há poucas semanas, em rodas de conversas durante a Expert, os gestores de crédito pareciam construtivos com a retomada da Agrogalaxy. Os credores do mercado de capitais, aliás, apostavam que este 18 de setembro seria um de divisor de águas para o bem, e não para o mal.

Inicialmente, os credores confiavam que a companhia honraria com os R$ 70 milhões de amortização que venciam nesta quarta-feira. A amortização devida é a primeira de um CRA de R$ 500 milhões que vence em 2027. Entre os credores, estão Fiagros de casas como XP Asset, JGP e Capitânia.

A situação delicada indica que as opções para a Agrogalaxy estão ficando escassas. Com o índice de alavancagem em mais de 10 vezes, a companhia vem sofrendo com o atraso nas compras dos produtores e a pressão dos fornecedores.

“Os fabricantes de fertilizantes que ainda davam prazo só querem à vista”, disse uma fonte. O atraso das chuvas em Mato Grosso também só piora a situação, jogando o início do plantio de soja para outubro.

Uma das ideias de capitalização é a venda do negócio de sementes, mas essas negociações também ainda não chegaram a um desfecho. The AgriBiz apurou que a Vinci esteve perto de comprar o negócio, mas as conversas esfriaram.

Nas últimas semanas, muitos aventavam que investidores japoneses estariam de olho na sementeira. O negócio de sementes, no entanto, também se tornou um problema, disse um banqueiro. Preocupados com a situação da Agrogalaxy, os fornecedores de sementes interromperam as entregas.

A surpresa também é grande porque o Aqua Capital vinha tentando recuperar o negócio de todas as maneiras, o que incluiu um aporte de capital de R$ 150 milhões e diversos financiamentos a custos módicos para dar fôlego.

Para a firma de private equity de Sebastián Popik, o desfecho negativo é certamente motivo de frustração. Nos bancos, que também são credores relevantes, a pressão ainda é forte para que uma recuperação judicial não ocorra, mas isso parece cada vez mais improvável. Procurada, a Agrogalaxy não respondeu até a publicação. (Colaborou Tatiana Freitas)