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O enigma chinês: O que os frigoríficos devem esperar em 2024

Para o Rabobank, importações chinesas de carne bovina devem crescer 6% com aumento no consumo no food service

Uma pergunta paira sobre a cadeia de carne bovina quando se discutem perspectivas para 2024: como a demanda chinesa irá se comportar? O país asiático é um destino chave para quase todas as commodities agrícolas, mas a desaceleração da economia chinesa acaba tendo impacto maior (e primeiro) no consumo de carne, mais sensível à renda e à inflação do que as outras proteínas.

Foi o que aconteceu em 2023. Alguns soluços na economia chinesa e medidas de desvalorização cambial para conter a inflação pressionaram o mercado de carne bovina, derrubando os preços em dólares. A perspectiva para 2024, no entanto, é de melhora, uma boa notícia para players como Minerva Foods.

O Rabobank, uma das principais referências quando o assunto é o mercado chinês, estima um aumento de 6% nas importações totais de carne bovina pelo país asiático no próximo ano. Isso corresponde a 200 mil toneladas adicionais, um volume próximo do que o Brasil embarca mensalmente para o país asiático.

“É um volume considerável que deve favorecer diretamente o Brasil”, diz o analista do setor de proteínas do Rabobank, Wagner Yanaguizawa.

A visão do banco é mais otimista que a do USDA (Departamento de Agricultura dos EUA). Em seu relatório anual sobre o mercado de carnes na China, o USDA projetou uma queda de 5% nas importações chinesas de carne bovina no próximo ano, com demanda estável e produção em alta.

Churrasco de carne na China

“Temos uma visão mais otimista com o consumo em food service”, resumiu Yanaguizawa. A demanda por carne em restaurantes já começou a melhorar no segundo semestre deste ano e deve continuar ao longo do próximo.

O Itaú BBA também tem uma expectativa positiva para a demanda chinesa em 2024. “A nossa dúvida é se a economia chinesa vai conseguir atravessar seus desafios sem mais desvalorização cambial. Se isso ocorrer, vai pressionar os preços da carne em dólares”, ponderou o gerente da consultoria agro do Itaú BBA, César de Castro Alves.

Exportações brasileiras

Impulsionadas pela maior demanda chinesa, as exportações brasileiras devem crescer entre 2% e 3% em 2024, projeta o Rabobank. Com isso, os embarques devem retornar aos níveis de 2022, que foi recorde.

O comércio também será favorecido por um aumento na produção e custos competitivos. “Ainda temos um estoque de fêmeas importante para ser abatido no primeiro semestre”, disse Yanaguizawa. Mas, como o nível de oferta de animais não deve ser tão elevado como o visto em 2023, ele espera que os preços do boi gordo fiquem mais próximos dos níveis registrados neste segundo semestre, quando iniciaram uma recuperação.

A visão é compartilhada por Alves. O analista do Itaú BBA espera um volume de abates mais estável no ano que vem, o que, alinhado ao cenário de demanda firme, deve manter a arroba em torno de R$ 250 a R$ 260 no mercado paulista. “Isso traz um fôlego para o pecuarista, mas ainda permite boas margens para os frigoríficos”, disse.

Competição australiana

A concorrência no mercado chinês deve ser mais acirrada. A Austrália, importante produtor de carne bovina, tem uma vantagem logística em relação ao Brasil quando o assunto é China e também está num período de matéria-prima abundante, o que a tornou mais competitiva.

“A carne australiana é hoje a mais barata do mundo, ultrapassando Argentina e Brasil, disse o analista nesta semana durante evento do banco a jornalistas. Nesse aspecto, a JBS é a companhia mais bem posicionada.

Nos nove primeiros meses deste ano, as exportações australianas de carne bovina para a China cresceram 27%, segundo o Rabobank. Embora o ritmo de crescimento previsto para 2024 seja bem menor, os australianos vão incomodar os exportadores brasileiros, garantiu Yanaguizawa.

A vantagem dos sul-americanos é que, mesmo com esse crescimento na oferta, a Austrália produz em menor escala: até setembro, o país exportou 170 mil toneladas para a China. O Brasil vendeu quatro vezes mais: 843 mil toneladas no mesmo intervalo.

Suínos e frango

A produção de suínos na China deve cair em 2024 depois de margens baixas este ano. Com um aumento no consumo, as importações devem aumentar 7,7%, beneficiando o Brasil, o único produtor com previsão de aumento na oferta. O país já se tornou o principal fornecedor de carne suína para os chineses.

Para o frango, a expectativa também é de retração na produção chinesa, afetada por uma queda nas importações de genética neste ano por causa dos surtos de gripe aviária em países exportadores, como os Estados Unidos.

Ao mesmo tempo, o Rabobank espera um aumento no consumo de processados na China, o que pode estimular importações. Os chineses também são os maiores importadores de carne de frango do Brasil, mas neste caso a dependência é menor. Enquanto a China responde por mais da metade dos embarques de carne bovina do Brasil e de 35% de carne suína, ela representa 14% do volume de frango exportado pelo Brasil.

O Rabobank vê um crescimento de 3,5% nas exportações brasileiras em 2024, estimuladas pela forte competitividade. Quanto à influenza aviária, o banco acredita que os acordos de regionalização firmado com os principais importadores devem reduzir os riscos para o setor em caso de contaminação em uma granja comercial.