Enquanto muito investidor anda ressabiado com o agronegócio — evidenciando o risco de rachaduras nas pontes entre Faria Lima e campo —, um grupo de empreendedores acostumados a trafegar com desenvoltura pelos dois mundos acaba de lançar a Avra, uma aposta ambiciosa no desenvolvimento do crédito agro no mercado de capitais.
O negócio foi idealizado por uma dupla ex-Suno: Octaciano Neto, ex-secretário de Agricultura do Espírito Santo que se apaixonou pelo mercado de capitais, e Amanda Coura, especialista em análise e estruturação de crédito que antes da Suno passou por RB Capital e SRM Asset.
Os dois empreendedores não começam a jornada sozinhos. Uma das firmas de venture capital mais conhecidas no agro, a SP Ventures é sócia-fundadora da Avra, em mais um sinal da oportunidade que a gestora liderada por Francisco Jardim vê no crédito agrícola.
“Já tínhamos o desejo de trabalhar com o Octaciano há muitos anos. Quando ele começou a fazer essa transição para empreender, e tivemos a honra de conhecer a Amanda, ficamos muito impressionados com a capacidade técnica e análise”, contou Chico ao The AgriBiz.
A química e complementariedade entre os dois empreendedores da Avra chamou a atenção da SP Ventures, que será sócia da Avra diretamente, e não por meio de um de seus fundos de investimentos. “Podia ser uma empresa de eventos para casamento que ia querer estar junto”, brincou o gestor.
Construída ao longo dos últimos meses, depois que Octaciano e Amanda saíram da Suno, a Avra vai originar ativos de crédito no agronegócio, desde CRAs e CPRs até, eventualmente, um FIDC.
As soluções serão customizadas para cada produtor ou empresário rural e só depois de desenhadas serão oferecidas a fundos de investimentos, o que pode abarcar desde um Fiagro até fundos de crédito generalistas.
5 mil clientes
Para trazer as operações ao mercado de capitais, a Avra vai se valer do trânsito que Octaciano possui no meio rural (ele também é produtor rural no Espírito Santo), em uma aposta na redução da histórica subpenetração do agronegócio no mercado de capitais.
“A indústria ainda engatinha. Os CRAs foram criados há 20 anos, mas só temos 200 empresas emitindo. O potencial é muito maior, para termos de 5 mil a 6 mil emissores”, calculou Octaciano.
Para ele, falta uma relação “orgânica” entre Faria Lima e campo, e não basta calçar uma botina e visitar uma fazenda ou outra para ser alguém realmente rural. “Esses dois mundos não se conhecem”.
Na Avra, essa relação orgânica já existe. “Não são três pessoas de São Paulo que resolveram falar de agronegócio. É o contrário. Somos do agro e resolvemos falar de mercado de capitais”, comparou Octaciano.
Amanda também possui raízes no campo. Natural de Piracicaba (SP), onde está a escola de agronomia mais conhecida do Brasil — a ESALQ —, ela é filha de produtor rural. Piracicaba, aliás, será uma das sedes da Avra, o que vai permitir a formação de uma equipe com conhecimento agrícola.
Não é gestora
A partir dessas “conexões orgânicas” com o meio rural, a Avra quer resolver uma dor dos gestores da Faria Lima: a imensa dificuldade de originar crédito no campo, o que pode ter criado problemas nos últimos anos, deixando a indústria pouco diversificada e muito exposta às revendas, um negócio de margens geralmente baixas.
“Há uma concentração muito grande nas revendas. Se tem turbulência, o mercado inteiro balança. A gente quer trazer pluralidade de operações”, disse Octaciano, sinalizando a intenção de desenhar operações para emissores com rentabilidade maior.
“O produtor rural pode não ter balanço auditado, mas tem boa margem. Se não estiver alavancado, aguenta uma turbulência”, completou.
Além de oferecer uma nova abordagem na originação de ativos para os fundos de investimentos, a Avra vai ajudar no processo de educação financeira do produtor rural, transformando as siglas muitas vezes herméticas do mercado financeiro em operações compreensíveis que façam sentido para o empresário do campo.
“Não somos uma gestora. A Avra é uma empresa que conecta os dois mundos. Nessa conexão, podemos acessar vários tipos de mandatos. Dá para ser criativo na estruturação”, disse Amanda Coura.
Para Chico, o modelo de negócios da Avra possui uma vantagem na comparação com gestoras de recursos porque está livre da necessidade de alocação. “Víamos uma lacuna enorme para um player que oferecesse suporte totalmente independente, sem ter a obrigação de uma gestora. Alguém capaz de olhar para o produtor e oferecer o que é melhor para ele”.