O pecuarista Pedro Merola, dono do grupo agropecuário Santa Fé, pegou os credores de surpresa nesta semana com um pedido para suspender o pagamento de dívidas, em mais um caso de recuperação judicial a caminho.
Com quase R$ 260 milhões em dívidas, a Santa Fé pediu uma cautelar à Justiça quando ainda não tinha qualquer execução relevante contra si, e enquanto os credores demonstravam abertura para negociações.
Inicialmente, a Justiça goiana negou o pedido. “Os documentos processados não são suficientes para demonstrar a necessidade, sem sombra de dúvidas, de antecipação do stay period”, argumentou a juíza Thalene de Oliveira, da Comarca de Santa Helena de Goiás.
Mas a negativa da primeira instância durou pouco. O advogado de Pedro Merola recorreu e, em uma decisão tomada nesta quinta-feira à tarde, o desembargador Eliseu Vieira, do Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO), concedeu a suspensão das dívidas por 30 dias.
Ao final desse prazo, a Santa Fé terá de ingressar com uma nova petição de recuperação judicial completa para levar a renegociação para frente. Caso a companhia não o faça ou o pedido de RJ seja negado, o que parece improvável, as dívidas voltariam a ser cobradas.
O bônus do CRA
Para os credores do mercado de capitais — basicamente, um CRA com pouco mais de R$ 50 milhões —, a recuperação judicial da Santa Fé deve ser menos traumática, num sinal construtivo das relações entre o empresário e os investidores.
Os detentores dos CRAs não se sujeitarão às regras da recuperação judicial, disse uma fonte do grupo. É um alívio e tanto depois de uma semana tensa. No pedido inicialmente enviado à Justiça, a Santa Fé tentou incluir os CRAs no bolo da recuperação judicial.
Os títulos contam com a alienação fiduciária de duas fazendas que somam 1.000 hectares (ao todo, o cultivo de grãos da empresa está presente em cerca de 5 mil hectares).
Juridicamente, a alienação fiduciária é uma garantia extraconcursal, ou seja, as dívidas relacionadas a ela não se sujeitam à recuperação judicial. Mas, como já se viu em outras ocasiões, os produtores tentam incluir esses dívidas na RJ com o argumento da essencialidade do bem.
Esse não foi o caminho tomado por Pedro Merola — ao menos por enquanto. A companhia e o produtor preferiram negociar com os credores do mercado de capitais separadamente, buscando algum prazo ou crédito novo para atravessar a crise. Uma das possibilidades é conceder carência no principal até a venda de algum ativo que ajude a quitar as dívidas.
Ao todo, a Santa Fé levantou R$ 80 milhões com a emissão dos CRAs em 2022. Entre os investidores desses papéis, estão fundos como o RURA11 (Fiagro da Itaú Asset que possui uma exposição de apenas 0,8% ao grupo de Merola) e casas como Vinci e BBM, banco que estruturou os títulos há dois anos.
Cortando na carne
Ao longo dos últimos meses, a Santa Fé vem cortando na carne para sair da crise. O grupo já vendeu três fazendas, levantando R$ 736 milhões para reduzir o endividamento.
Mas os esforços não foram capazes de contornar a situação, agravada durante os momentos de baixa dos preços do boi gordo e pelas margens apertadas nos negócios de grãos.
Desde 2022, a lotação dos confinamentos da Santa Fé caiu pela metade, saindo de 40 mil cabeças de gado para apenas 20 mil. No plantio de soja, a produtividade da soja recuou de 65 sacas por hectare na safra 2022/23 para apenas 47 sacas por hectare na safra 2023/24. O grupo também relatou problemas na produção de tomate e feijão irrigado.
Nesse processo, o Ebitda recuou de R$ 94 milhões para R$ 78 milhões entre 2022 e 2024. No ano passado, o grupo faturou cerca de R$ 250 milhões.