O forte ritmo de crescimento da área de soja no Brasil pode ter ficado para trás, pelo menos nos próximos dois anos. Em 2024/25, a área plantada com a oleaginosa deve apresentar a menor taxa de crescimento em quase duas décadas, quebrando uma série de fortes expansões que levaram o País a superar os Estados Unidos como o maior exportador e produtor mundial da commodity.
Depois de aumentar cerca de 25% nas últimas cinco safras, a área plantada de soja no Brasil deve crescer, no máximo, 1,9% em 2024/25, de acordo com estimativas compiladas por The AgriBiz. Algumas consultorias, como a Agroconsult, chegaram a mencionar uma possível redução de área devido à queda nos preços dos grãos e nas margens de lucros dos agricultores.
É uma mudança de paradigma. Nos últimos cinco anos, a forte expansão de área ajudou a levar a produção brasileira de soja de 120 milhões de toneladas a caminho das 170 milhões de toneladas, reforçando o cenário de oferta abundante que tem pressionado os preços globais das commodities.
“O aumento da área no Brasil vai desacelerar. Ainda veremos um crescimento tímido, mas ele será menor, assim como o apetite dos produtores para investir em suas lavouras será menor”, disse Jefferson Souza, analista de inteligência de mercado da Agrinvest.
A razão para a mudança no comportamento do produtor fica evidente ao analisar o comportamento da renda dos produtores em Mato Grosso, o principal estado produtor. Na região médio norte do estado, as margens de lucro com a soja caíram para 5,6% na última safra de 21,7% em 2022/23, segundo cálculos da Agrinvest.
Além de insumos caros e da queda nos preços das commodities, os produtores tiveram uma quebra de safra, reduzindo ainda mais os lucros. Comparando as margens da última safra com a temporada 2021/22, quando os preços da oleaginosa atingiram um recorde histórico, o tombo é ainda mais impressionante: naquela safra, a margem de lucro ultrapassou 40%.
O bom momento levou os agricultores a intensificar os investimentos em expansão de área, armazenagem, equipamentos e máquinas. “Algumas dessas dívidas ainda não foram quitadas”, lembrou Souza.
Endividados e com lucros menores, os agricultores dificilmente investirão em expansão. “A área de soja provavelmente continuará aumentando porque alguns planejamentos antigos precisam ser concluídos”, disse o analista.
Além disso, grandes grupos agrícolas, capitalizados e com mais acesso a fontes de financiamento, podem aproveitar o momento de queda nos preços dos arrendamentos para aumentar área — os últimos movimentos da SLC comprovam a tese. “Mas, na safra 2025-26, o comportamento dos preços nos dirá o que vai acontecer”, acrescentou.
Para 2024/25, cujo plantio começa em setembro, Souza estima que as margens de lucro dos agricultores possam aumentar para 11,7% ante os 5,6% da safra passada. Ainda assim, continuarão abaixo da média histórica entre 15% e 18%.
“Provavelmente, a lucratividade não será suficiente para pagar as dívidas que os agricultores contraíram nos anos anteriores, desestimulando a expansão da área”, disse Souza. À medida que a perspectiva de baixa para os preços das commodities impacta as receitas dos agricultores, eles devem se concentrar mais do que nunca em melhorar os rendimentos. “Isso é fundamental para aumentar os lucros”, disse ele.
O dilema do Rio Grande do Sul
Enquanto os agricultores em Mato Grosso tentam se recuperar da maior quebra de safra em décadas, no Sul do País os produtores podem enfrentar problemas de plantio após as enchentes que afetaram as lavouras no Rio Grande do Sul, onde a área de soja pode diminuir, disse André Pessôa, sócio da Agroconsult, no mês passado. O Estado é o segundo maior produtor de soja do Brasil.
Como o sul do Brasil enfrentará maiores riscos climáticos na próxima temporada devido à ocorrência de La Niña, que geralmente causa condições mais secas na região, os agricultores devem ser mais cautelosos na expansão da área, de acordo com Luiz Fernando Roque, analista da Safras & Mercado.
A consultoria, que ainda acredita num pequeno aumento de área no Rio Grande do Sul, tem a estimativa mais otimista de crescimento para a área no Brasil entre as cinco consultorias consultadas: 1,9%.
Produção ainda recorde
Mesmo com a menor expansão da área desde 2006, quando os produtores reduziram o plantio, a produção de soja do Brasil deve atingir um novo recorde com a recuperação da produtividade. Embora o La Niña preocupe os agricultores no Sul, o fenômeno climático costuma ser benéfico para as lavouras no centro e norte do Brasil.
As estimativas de produção variam de 165 milhões a 171,5 milhões de toneladas, ante 153 milhões de toneladas colhidas em 2023/24 segundo o USDA, que prevê a produção da próxima temporada em 169 milhões de toneladas.
“Há espaço para as exportações ultrapassarem 100 milhões de toneladas, enquanto o consumo doméstico deve continuar aumentando em meio à forte demanda por ração e biocombustível”, disse a StoneX em um relatório na semana passada. O mandato de biodiesel no País aumentará para 15% de mistura no diesel regular no próximo ano, ante os atuais 14%.
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