André Dias, o poderoso executivo que comandou a Monsanto no Brasil e liderou a intensa estratégia de M&As da Nutrien no País, deixou o sabático para assumir o que muitos na indústria descrevem como um rabo de foguete.
À frente da Agropalma desde 1º de maio, Dias terá o desafio de reerguer a gigante de óleo de palma ao mesmo tempo em que as herdeiras do banqueiro Aloysio Faria — o bilionário deixou como legado um conglomerado que ia do Banco Alfa à C&C — ainda tentam vender o negócio, em um processo conduzido pelo BTG Pactual há quase dois anos.
Nome mais conhecido no Brasil quando o assunto é óleo de palma, a Agropalma possui cerca de 40 mil hectares cultivados no Pará. A extensa área seria suficiente para despertar o apetite de muitos players, mas o negócio sofre com um subinvestimento crônico no palmar e nas extratoras de óleo de palma, localizadas na região de Tailândia (PA).
Tipicamente, a palmeira (ou dendezeiro, como é conhecido no Brasil) possui um ciclo produtivo de quase três décadas. Nos primeiros sete anos, a planta ainda está em fase de crescimento e é naturalmente menos produtiva. O ápice ocorre entre o oitavo e o décimo oitavo ano. A partir daí, o dendezeiro entra no declínio da produtividade, o que exige o replantio.
Na Agropalma, quase metade do palmar já se encontra na fase de declínio do plantio, o que indica uma grave falha no planejamento. Para duas fontes que conhecem a indústria, a companhia sofreu por ser praticamente uma empresa “sem dono” por muitos anos, com o dr. Aloysio já distante dos negócios.
Após a morte do patriarca, as herdeiras também não fizeram os pesados investimentos necessários na renovação do palmar. O custo para replantar os dendezeiros é da ordem de R$ 19 mil por hectare, o que significa que a Agropalma terá de gastar cerca de R$ 340 milhões nos próximos anos para manter o negócio economicamente viável.
Diante de uma necessidade dessas, as negociações com os interessados em assumir a área agrícola da Agropalma naturalmente ficam mais duras. Afinal, qualquer M&A precisa considerar os investimentos necessários para o retorno esperado parar em pé.
Nesse cenário, decidir como gerir o palmar será uma das escolhas cruciais da gestão de Dias, até porque a menor produtividade e os preços mais baixos do óleo de palma já vêm pressionando as margens da companhia. No ano passado, o negócio agrícola teve prejuízo de R$ 8,7 milhões.
Os interessados na Agropalma
No mercado, a chegada de André Dias provocou surpresa e leituras díspares. “Vão trazer um executivo desse porte para vender o negócio?”, perguntou uma fonte, conjecturando sobre a desistência da venda.
Ao longo das últimas quatro semanas, The AgriBiz conversou com diversas fontes do mercado de óleo de palma para compreender o futuro da Agropalma, um negócio que já chegou a faturar mais de R$ 1,5 bilhão durante o boom dos preços da commodity.
Ao contrário do que a contratação de Dias poderia sugerir à primeira vista, a venda da Agropalma não foi descartada pelas herdeiras de Aloysio Faria.
Internamente, Dias é visto como um executivo de perfil ambidestro, que pode ajudar tanto a melhorar a produtividade como conduzir a transição para quem comprar a companhia —ou mesmo assumir por mais tempo se a venda não chegar a um desfecho favorável. Procurado pela reportagem, o executivo não quis comentar. A Agropalma não respondeu.
Apesar de se arrastar, o processo de venda continua e o negócio atrai interessados, apurou The AgriBiz. Uma das oportunidades para os compradores é explorar a palma para a fabricação de SAF (combustível sustentável de aviação), um produto que tem tudo para decolar.
Fontes que conhecem a Agropalma argumentam que uma transação bem-sucedida provavelmente terminará fatiando o grupo em dois: upstream (área agrícola e as extratoras) e downstream (as refinarias na Grande Belém e Limeira, no interior paulista).
Há pelo menos dois interessados nas refinarias, comenta-se no mercado. A Bunge já demonstrou apetite pela refinaria de Limeira, um ativo de altíssima qualidade. A AAK, companhia sueca de ingredientes especializadas em óleos vegetais e gorduras avaliada em US$ 7 bilhões, também é apontada como uma potencial compradora dos ativos no downstream.
Estima-se que a Agropalma possa obter até R$ 3 bilhões com a venda do negócio como um todo, mas a área agrícola continua sendo um desafio difícil de ser contornado.
A disputa com os Tabarana
Além de necessidade de investimentos para recuperar a produtividade, a Agropalma lida com problemas fundiários, com parte das áreas reivindicadas por quilombolas. No Pará, a família Tabarana também contesta judicialmente a posse de uma área que poderia representar 25% do palmar da Agropalma.
Por causa disso, a companhia sofreu um duro golpe em seu apelo ambiental, perdendo o RSPO, o selo de óleo de palma sustentável. Em entrevista recente ao Agfeed, o diretor comercial da Agropalma, André Gasparini, disse que era uma questão de tempo até recuperar a certificação, uma certeza que desperta muitas dúvidas no mercado.
Para uma fonte familiarizada com a companhia, o problema fundiário não impede uma oferta. “É claro que isso afugenta alguns, mas há companhias acostumadas a operar nesse ambiente”, disse uma fonte.
A paraense Marborges, que cresceu no negócio de palma após comprar os ativos da ADM, também é frequentemente apontada como uma das interessadas no upstream da Agropalma.
Uma das possibilidades é um comprador que sabe navegar nesse tipo de complexidade fundiária. Nessa categoria, desponta a Belém Bioenergia Brasil (BBB), sociedade entre a petrolífera portuguesa Galp, um fundo do Opportunity e a Tauá Brasil Palma.
No passado, a BBB já teve a antiga Petrobras Biocombustíveis como controladora, mas após sucessivos prejuízos a estatal saiu do negócio, dando lugar ao grupo de Daniel Dantas e à Tauá. Para quem acompanha o situação da Agropalma, esse pode ser o desfecho da companhia criada por Aloysio Faria. Falta combinar com as herdeiras.
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Procuradas, Bunge, Marborges e BBB responderam que não comentam rumores de mercado. A reportagem não conseguiu contato com a AAK.