R$ 5,4 bi

BRF faz o maior follow-on da América Latina; Marfrig mantém posição

Dona da Sadia levantou R$ 5,4 bilhões, trazendo um montante substancial para reduzir o endividamento e deixar a companhia preparada para gerar caixa

Lek Trek, o simpático mascote da Sadia, pode sextar sem remorso. No segundo maior follow-on da história da indústria de alimentos na América Latina, a BRF levantou ontem R$ 5,4 bilhões (o equivalente US$ 1,1 bilhão), trazendo um montante substancial para reduzir o endividamento e deixar a companhia preparada para gerar caixa.

A empresa conseguiu demanda suficiente para emplacar o hot issue (lote adicional), emitindo 600 milhões de ações — a oferta base era de 500 milhões de papéis. A oferta saiu a R$ 9 por ação, preço que já era esperado diante dos compromissos firmados pela controladora Marfrig e o fundo saudita Salic.

A adesão ao follow-on mostra que os investidores deram um voto de confiança à gestão de Marcos Molina, presidente do conselho, e Miguel Gularte, CEO. Fosse apenas uma boia de salvação, como alguns chegaram a ironizar, a operação talvez só conseguisse emitir o lote base de ações recorrendo ao compromisso do controlador, que se dispôs a subscrever até 250 milhões de ações.

Na oferta, a Marfrig subscreveu apenas o volume suficiente (200 milhões de ações) para preservar sua participação em 33,27%, investindo quase R$ 1,8 bilhão. A Salic, que também havia assumido o compromisso de até 250 milhões, também subscreveu menos, ficando com pouco mais de 10% do capital da BRF. Se o follow-on não tivesse demanda, Marfrig e Salic poderiam chegar a uma participação de 38% e 16%, respectivamente.

“Tivemos uma participação espetacular da base de acionistas, cobrindo 60% da oferta prioritária”, disse Gularte ao The Agribiz. Também por isso, a companhia estava em condições para emitir o hot issue.

Alavancagem

Na largada, a entrada de R$ 5,4 bilhões reduz o índice de alavancagem (dívida líquida/Ebitda) da BRF em 1,3 ponto, disse Fabio Mariano, vice-presidente de finanças e de relações com investidores. No fim de março, o indicador estava em 3,35 vezes.

A injeção de capital também ajudará a derrubar as despesas com juros. “Muda o ritmo de desalavancagem de maneira estrutural e passa a ter muito mais capacidade de gerar caixa livre”, acrescentou o executivo.

A capitalização chega num ponto de inflexão operacional da BRF, com indicadores de produtividade industrial e agropecuária melhorando e um alívio relevante de custos vindos da ração mais barata.

A BRF vai sentir o benefício do milho e farelo de soja mais barato antes da média da concorrência porque vinha trabalhando com um estoque mais baixo já prevendo a queda dos grãos. “Nos preparamos para esse cenário de grãos extremamente favorável. A BRF encurtou sua compra para ficar posicionada e ter os grãos mais baratos antes”, frisou Gularte.

Venda de ativos

O follow-on também aumenta o poder de barganha da BRF nas negociações para a venda de ativos. Na venda do negócio de pet food, por exemplo, os interessados vinham sinalizando com uma oferta inferior aos R$ 2 bilhões pretendidos pela BRF. Agora, a dona da Sadia tirou a faca do pescoço e aumentou as chances de chegar a um acordo mais vantajoso.

“A gente sempre teve a intenção de desinvestir ao valor que a companhia considerou como justo. Temos um alvo de preços para a divisão pet e para os créditos tributários. Então, isso [o follow-on] aumenta o poder de negociação”, concordou Mariano.

Operação histórica

O follow-on de ontem foi o maior da América Latina em 2023. Em dólares, é o segundo maior de toda a história da indústria de alimentos na região, disse o RI. A operação só perde para a própria BRF, que levantou o equivalente a US$ 2,5 bilhões no follow-on que sacramentou a incorporação da Sadia pela Perdigão, em 2009.

Em reais, no entanto, a oferta de ontem é da mesma magnitude do follow-on feito também pela BRF no início do ano passado (R$ 5,4 bilhões, que na época equivaliam a US$ 1 bilhão), quando a empresa precificou a oferta a R$ 20. A R$ 9, a diluição para quem não acompanhou desta vez foi bem maior.

O J.P. Morgan foi o coordenador líder do follow-on. Bradesco BBI, BTG Pactual, Citi, Itaú BBA, Safra, UBS BB e XP também atuaram como coordenadores da oferta.