
A estratégia para adaptar o modelo da operação brasileira da Marfrig aos moldes de sua controlada americana National Beef, verticalizando uma parte relevante do fornecimento de gado para assegurar um nível de utilização de capacidade incomum no Brasil, está praticamente completa.
A dinâmica de utilização de capacidade mudou radicalmente no quarto trimestre, o primeiro após a transferência de 13 frigoríficos vendidos à Minerva — 11 deles no Brasil, um na Argentina e outro no Chile.
De outubro a dezembro, os complexos industriais da Marfrig em Várzea Grande, no Mato Grosso, e Promissão, no interior paulista, beiraram 95% de utilização de capacidade, apurou The AgriBiz. “Antes, as operações ficavam perto de 75%”, disse uma fonte que conhece o negócio.
A intenção é manter esse nível de utilização acima dos 90%, mesmo com a ampliação da capacidade nos dois complexos industriais. Desde que anunciou a venda de um pacote de ativos à Minerva, a Marfrig já ampliou a capacidade de abate dos complexos de Várzea Grande e Promissão em 50%.
Além disso, uma expansão de mais de 20% ainda deve ser concluída ao longo deste ano, com as duas plantas atingindo uma capacidade combinada da ordem de 6 mil cabeças de gado por dia.
O capital de giro necessário
Para manter os níveis de utilização nesses patamares, mesmo com a virada do ciclo pecuário — que pode reduzir a oferta de animais a partir do próximo ano —, a Marfrig fez um investimento significativo em capital de giro para verticalizar o fornecimento de gado.
A maior parte do desembolso ocorreu no ano passado, quando a Marfrig adiantou cerca de R$ 2 bilhões à MFG Agropecuária — companhia que pertence aos mesmos controladores da companhia, o empresário Marcos Molina e a esposa Márcia Marçal dos Santos.
Há duas semanas, a Marfrig também concluiu a compra de oito confinamentos que pertenciam à MFG, por R$ 48 milhões. Com uma capacidade estática para 143 mil cabeças, esses confinamentos estão distribuídos pelos municípios de Campo Novo do Parecis, Campo Verde e Tangará da Serra, em Mato Grosso; Pereira Barreto e Sabino, no Estado de São Paulo; Mineiros, em Goiás; Coxim, em Mato Grosso do Sul; e Cotegipe, na Bahia.
Os investimentos da Marfrig na MFG — a compra de gado e os confinamentos — viabilizaram a verticalização da produção, uma estratégia que se mostrou crucial para garantir a disponibilidade de gado para a Marfrig no fim do ano passado, quando a disparada do gado levou alguns frigoríficos a conceder férias coletivas.
Agora, a Marfrig consegue suprir cerca de 25% das necessidades de abate da companhia com gado próprio, atingindo a meta revelada pelo CEO da companhia, Rui Mendonça, durante uma teleconferência com analistas no ano passado.
Margens suculentas
Com os confinamentos, a Marfrig consegue não apenas melhorar a utilização de capacidades, mas aumentar a estrutura de margens dos negócio.
No quarto trimestre, por exemplo, a margem Ebitda da operação de carne bovina da companhia na América do Sul ficou em 12,8%, acima dos resultados das concorrentes Minerva (8,8%) e Friboi (6,6%). O portfólio de processados, com produção de hambúrguer, contribuiu com as margens.
Em diversos encontros com investidores, executivos da Marfrig argumentaram que o fornecimento de gado próprio significa mais qualidade da carne. Com isso, a companhia assegura um volume mais fácil de ser enquadrado em nichos de maior valor, inclusive para exportação à União Europeia — o gado que fica 90 dias no confinamento está em propriedades habilitadas pelo bloco europeu.
Com essa armação, a ambição de Molina busca replicar a superioridade de margem que a National Beef mantém sobre a concorrência, superando Tyson Foods e JBS USA em quase todos os trimestres.
Controlada pela Marfrig, a quarta maior indústria de carne bovina dos Estados Unidos também supre mais de 20% do gado com os sócios — neste caso, a associação de pecuaristas, que é minoritária no negócio.
No mercado americano, a National é conhecida pela maior proporção de carnes de maior qualidade (Prime e Choice, selos dados pelo USDA), o que faz diferença nas margens.
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Este texto foi atualizado às 17h56 para inclusão dos confinamentos de Coxim, em Mato Grosso do Sul; e Cotegipe, na Bahia, que também foram adquiridos pela Marfrig.