Enquanto os banqueiros da Faria Lima sonham com a reabertura da janela de IPOs, algo que não ocorre há dois anos — o Nubank foi o último —, o empresário Ricardo Faria quer ficar distante da bolsa.
O dono da Granja Faria até preparou o balanço da companhia, como costuma acontecer com as empresas que postulam chegar à B3. O movimento despertou muitos rumores sobre o primeiro IPO dos ovos, o que poderia potencializar a consolidação em uma das cadeias produtivas mais pulverizadas do agronegócio brasileiro.
Mas se depender de Faria, as granjas permanecerão um negócio de capital privado. “IPO não é um plano, não é um sonho nosso”, disse Faria. “Ser uma empresa negociada não é algo que nos seduz”, reforçou o empresário em encontro com jornalistas nesta segunda-feira. Para ele, um IPO soa mais como uma “dor de cabeça do que benefício”.
As conversas em torno de um possível IPO parecem estar mais relacionados com o crescente assédio de assessores financeiros e de bancos à companhia, que tem chamado a atenção pelo forte crescimento e ritmo de aquisições —já são 15 desde a fundação, em 2006.
Na Faria Lima, banqueiros até já se debruçaram sobre a tese de crescimento, o que inclui uma vertical relevante de fertilizantes organominerais — com o apelo da economia circular para atrair investidores.
“Tem um monte de gente com pouca profundidade em relação ao nosso negócio, ao nosso momento de investimentos e aos nossos ciclos que começam a dar opinião que pouco contribuem para a melhora da companhia”, disparou o empresário ainda sobre o possível IPO.
Por que as granjas?
O fato de já ser companhia aberta — uma S.A. com publicação de balanço auditado pela KPMG — ajuda a colocar a Granja Faria na lista de possíveis IPOs do agro. Mas o fundador garante que esse movimento foi feito com o intuito de melhorar a governança, e não de listar o negócio.
A aposta no IPO das granjas também tem origem no grande potencial do setor. O consumo de ovos no Brasil cresceu cerca de 3% ao ano na última década, acima da média mundial, em torno de 2%.
O aumento do consumo pelas classes mais altas têm possibilitado o desenvolvimento de novas categorias e margens mais atrativas. “Não faremos menos de 20% (de margem Ebitda)” em 2024, estimou Faria, já considerando uma queda em relação a 2023 devido aos preços mais baixos do ovo e custos de produção mais elevados.
Por fim, o grau de informalidade no setor é grande, assim como a pulverização, o que abre uma grande possibilidade de consolidação. Com uma das maiores do setor, a Granja Faria tem pouco mais de 10% de participação de mercado. Em dez anos, o empresário acredita que pode chegar a 25%.
Aquisições
“Vamos continuar fazendo M&As, esse é o nosso DNA”, garante o empresário. Como a curva de aprendizagem no setor é muito cara, não faz sentido buscar escala por meio de crescimento orgânico, afirma. Entre o início do processo, com a compra do terreno, e a produção do primeiro ovo, são seis anos, diz.
Possíveis focos de aquisição estão no Centro-Oeste, onde a Granja Faria tem presença apenas em Goiás, e no Nordeste.
Nessa corrida, a Granja Faria não está sozinha. Há competição pela liderança. A Mantiqueira, principal rival da Granja Faria, também tem acelerado crescimento. Neste ano, a adquiriu comprou a Fazenda da Toca Orgânicos, então controlada pelo empresário Pedro Paulo Diniz, e as operações de ovos da cooperativa paranaense Lar.
O grupo fundado por Leandro Pinto, que começou na mineira Itanhandu, deve faturar perto de R$ 2 bilhões com ovos neste ano. Ao longo dos últimos anos, a Mantiqueira também estreitou relações com os bancos de investimentos, especialmente XP e Itaú BBA.
Na Granja Faria, o BTG Pactual é o interlocutor preferencial, uma amizade que começou quando Faria comprou os restos de uma mina de fosfato de um grupo de sócios ligado ao banco. No último evento anual de agro promovido pelo banco de André Esteves, Faria foi um dos palestrantes e, durante boa parte do evento, circulou ao lado de Guilherme Paes, um dos principais sócios do BTG.
Aos jornalistas, Faria citou Esteves como uma de suas duas grandes inspirações, ao lado do ex-CEO da Perdigão Nildemar Secches. Este último, aliás, foi quem levou o catarinense Faria, a investir na criação de aves. Antes, ele atendia a Perdigão por meio da Lavebras, lavanderia industrial que criou e vendeu em 2017 por R$ 1,3 bilhão.
Perspectivas
Para bater as metas e as inspirações do empresário, a Granja Faria precisa acelerar. O fundador da produtora de ovos projetou um faturamento próximo de R$ 3 bilhões em 2023, mas fez R$ 1,4 bilhão no acumulado do ano até setembro, de acordo com as últimas demonstrações financeiras.
Uma parte do crescimento deve vir das aquisições. Neste ano, o grupo comprou a BL Ovos (com unidades no Espírito Santo e Goiás) e a Katayama, empresa octogenária do interior de São Paulo que, sozinha, adicionou 2 milhões de ovos à companhia, segundo Faria. No final de setembro, a empresa tinha 12,5 milhões de aves poedeiras em fase de produção (uma galinha produz, em média, 0,8 ovo por dia), conforme o último balanço.
O empresário prevê um bom 2024, apesar de alguns desafios como o preço mais alto do milho —ele vê uma queda de 20% na produção brasileira do cereal devido aos problemas climáticos.
Em termos de receita, os números da Granja Faria devem ficar mais parecidos com os do segundo semestre de 2023 —na primeira metade do ano, os resultados foram beneficiados por um forte aumento nas exportações de ovos devido aos efeitos da gripe aviária em outros países.
Novos negócios
Além de ser conhecido pelos ovos, Faria também é um grande produtor de grãos. Nesta safra, sua empresa agrícola, a Insolo, está cultivando 230 mil hectares na primeira e segunda safras no Matopiba —150 mil hectares com soja, 50 mil com milho e 30 mil hectares com sorgo. Com um crescimento de 35% na área plantada, ele prevê que a receita da empresa vai aumentar 40%, para R$ 2 bilhões.
“Vamos continuar crescendo em área enquanto a nossa capacidade de execução e produtividade dor maior do que a da região”, disse o empresário. Considerando o atual patamar de preço das terras agrícolas no Matopiba, Faria diz que o arrendamento faria mais sentido neste momento.
Nos próximos anos, Faria quer diversificar ainda mais. A Insolo está avaliando investimentos em infraestrutura no porto de Itaqui (MA), que na visão de Faria se tornará o principal hub de exportação de grãos do País em dez anos. A ideia é investir em um novo terminal, berço e shiploader.
Outra possibilidade, não excludente, é a entrada na produção de biocombustíveis, por meio da produção de etanol de milho ou de biodiesel. Faria contou que está em conversas iniciais com dois possíveis sócios para este negócio. “Não dominamos o mercado de distribuição de combustíveis. Por isso, faz sentido ter um sócio estratégico”, diz. “Já no upstream, a iniciativa é nossa e vamos buscar financiamento”.