
A rentabilidade da produção de ovo mudou de patamar nos últimos anos, o que pode explicar, pelo menos em parte, o frenesi que tomou conta desse mercado — inclusive com M&As internacionais e de grande porte como o anunciado nesta quinta-feira pelo empresário Ricardo Faria.
Atualmente, o spread entre o custo da ração, que responde por 80% do custo de produção, e o preço do ovo ao produtor está em torno de 120%, segundo cálculos da Consultoria Agro do Itaú BBA considerando valores de negociação do interior de São Paulo. O número, que pode ser considerado um indicador da margem bruta da atividade, mais que dobrou desde novembro, quando estava em 51%.
A margem do ovo explodiu mesmo com a alta de 20% no preço do milho no mesmo período — o cereal responde por 65% da composição da ração. Como o farelo de soja, outro componente importante da alimentação animal, caiu, o custo com a ração subiu menos: 12% desde dezembro.
O que fez a diferença para a rentabilidade do produtor foi o preço do ovo, que disparou quase 40% desde dezembro e mais do que compensou a alta de custos, segundo Cesar de Castro Alves, gerente da Consultoria Agro do Itaú BBA.
Quem acompanhou a (polêmica) valorização no preço do ovo nos últimos meses sabe que vários fatores explicam o movimento, como o calor mais intenso do que o habitual, o que reduziu a produtividade nas granjas nos primeiros meses do ano, e o próprio preço do milho, que assustou alguns produtores e acabou diminuindo o ritmo de produção.
Mas nem tudo é pontual. Uma mudança no perfil de consumo está transformando um mercado que, durante muito tempo, era visto como o “patinho feio” das proteínas. “O ovo, cada vez mais, é o queridinho das pessoas”, disse Alves ao The AgriBiz.
Além dos benefícios nutricionais que estimulam o consumo, o patamar elevado dos preços de outras proteínas, como as carnes de frango e a bovina, também acaba deslocando demanda para o ovo, pontuou Alves. Prova disso foi o comportamento do mercado interno no ano passado —a produção brasileira subiu 10% e foi facilmente absorvida internamente. “O mercado está pedindo mais produção”, disse.
Em 2025, cada brasileiro deve consumir 272 ovos, segundo estimativa da ABPA (Associação Brasileira de Proteína Animal), uma alta de 1% em relação a 2024, quando o consumo per capita já atingiu um recorde. Em comparação com 2018, o crescimento é de 28%.
Outro patamar
Mais do que o ganho de margem dos últimos meses, chama a atenção a mudança no patamar da rentabilidade ao longo dos últimos anos. Desde janeiro de 2006, quando tem início a série do ItaúBBA, spread médio do ovo é de 58%. Considerando um período mais curto, desde janeiro 2010, a média é de 67%. Hoje, está em 120%.
“Esse negócio está melhorando ao longo do tempo”, disse Alves, com a ressalva da típica elevada volatilidade desse mercado. “De 2023 para cá, o spread subiu e desceu sempre acima da média histórica. E acredito que vai continuar crescendo porque o consumo vai continuar aumentando”, afirmou.
O novo patamar de rentabilidade (e o seu potencial) explica o interesse de grandes empresas no setor, como a JBS, que em janeiro comprou a Mantiqueira, maior produtora de ovos do Brasil. E é só o começo. A fragilidade dos produtores norte-americanos, que enfrentam uma forte crise devido ao impacto da gripe aviária no plantel, também vem abrindo oportunidades de internacionalização.
“Uma expansão internacional é parte dos nossos planos. Pretendemos fazer no ovo o que fizemos nas outras categorias”, disse o CEO da JBS, Gilberto Tomazoni, em entrevista ao The AgriBiz nesta semana.
Após o acordo com a JBS, o fundador da Mantiqueira, Leandro Pinto, disse ao Brazil Journal que a empresa pretende construir uma planta greenfield nos Estados Unidos, com o objetivo de entrar em operação em dois anos.
A holding Global Eggs, do empresário Ricardo Faria, vai comprar uma das maiores produtoras de ovos dos Estados Unidos, a Hillandale Farms, por US$ 1,1 bilhão. No ano passado, a holding recém-criada iniciou o processo de internacionalização com a compra do grupo Huevo, vice-líder do mercado espanhol.
“Ainda tem muito espaço para consolidação. As empresas brasileiras podem ter muito a ensinar em outros lugares do mundo, inclusive no aspecto de sanidade”, concluiu Alves.