Amazônia

Do bloqueio à volta ao jogo: JBS requalifica pecuaristas no Pará

JBS vai apoiar o governo do Pará na regularização de mais de 4 mil pequenos produtores por meio de seus Escritórios Verdes

Com os Escritórios Verdes, governo do Pará e JBS pretendem regularizar mais de 4 mil pecuaristas de pequeno porte | Crédito: André Guerra

Há mais de 20 anos atuando como pecuarista em Cumaru do Norte, no Pará, Carlos Lúcio ficou surpreso ao ser bloqueado da lista de fornecedores da JBS, para quem vendia gado desde 2003.

Pequeno produtor e assentado do Incra, Lúcio começou a enfrentar problemas de documentação quando uma outra área de assentamento foi unificada à sua. Sem saber o que fazer para regularizar a sua situação, o produtor ficou um ano e meio sem vender para a maior produtora de carnes do mundo — e a principal compradora em sua região.

“Foi quando eu soube que existiam os Escritórios Verdes”, conta Lúcio, referindo-se ao programa da JBS que apoia pecuaristas na regularização de imóveis rurais com passivos socioambientais. Os técnicos avaliaram todas as áreas com inconformidades no PRODES (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite) e orientaram Lúcio sobre como resolver os problemas.

Depois de 23 dias, ele voltava à lista de fornecedores da JBS, que arcou com os custos financeiros da regularização. O pecuarista também foi orientado sobre o que deveria fazer para regenerar as áreas desmatadas e assumiu um compromisso para executar o plano. Para retomar a venda dos animais, obteve uma Declaração de Legalidade Comercial (DLC), que pode ser renovada depois de um ano. Até lá, todas as áreas que precisam ser regeneradas serão monitoradas por meio de vistorias periódicas e imagens de satélite.

Lúcio, que vende entre 150 e 200 animais por ano, é um dos primeiros pecuaristas requalificados no Pará por meio de uma parceria entre os Escritórios Verdes da JBS e o Sistema de Restauração Florestal (Sirflor) — um programa desenvolvido pelo Ministério Público Federal, pelo governo do Pará e empresas para a reabilitação de produtores.

“O processo todo foi muito rápido, pensei que fosse demorar muito mais”, afirma Lúcio. Por meio do Sirflor, a regularização ganha agilidade porque os produtores conseguem antecipar etapas que fariam durante o processo de análise do CAR (Cadastro Ambiental Rural).

A parceria entre a JBS e o Sirflor, que já recolocou 12 pecuaristas à cadeia formal de fornecimento de gado, incluindo Lúcio, é uma das iniciativas da companhia para melhorar a transparência da cadeia da pecuária no Pará — um compromisso anunciado na COP-28 no ano passado, em Dubai, com investimentos de R$ 43,3 milhões em três anos.

Com a estrutura dos Escritórios Verdes, o governo do Pará e a JBS pretendem regularizar mais de 4 mil pecuaristas de pequeno porte. Desde 2021, quando foram criados, os Escritórios Verdes ajudaram a regularizar mais de 12,5 mil fazendas em todo o Brasil.

Também em apoio aos pequenos pecuaristas, a JBS tem incentivado programas para a adoção de sistemas agroflorestais visando melhorar a produtividade e a rentabilidade dos produtores.

Chip no gado

Uma outra (grande) ação incluída na iniciativa anunciada pela JBS durante a COP é o apoio da empresa à implementação do sistema de rastreabilidade individual de gado no Pará, o que deve ser concluído até 2026 e terá papel complementar ao programa de requalificação.

“O único jeito de enxergar quem realmente produziu o animal nas fases anteriores (cria e recria) é com a rastreabilidade durante a vida inteira”, afirma Fábio Dias, diretor de Pecuária da Friboi e líder de Agricultura Regenerativa da JBS Brasil. “E isso não quer dizer que, uma vez identificado, ele será excluído. Não, ele será trazido para requalificação. Tem porta para todo mundo sair da situação ruim”, diz.

Dias refere-se ao principal gargalo da indústria de carne bovina para assegurar que 100% dos bois abatidos são provenientes de áreas sem desmatamento na Amazônia. Hoje, a JBS consegue monitorar todos os seus fornecedores diretos, mas isso ainda não é possível para os elos anteriores da cadeia.

A empresa tem investido em diversas iniciativas para ampliar o monitoramento dos chamados fornecedores indiretos. No Pará, a empresa vai liderar um projeto piloto para implementação dos chips em fazendas que fornecem gado para abate em sua planta em Marabá.

Virando o jogo

Com 26,7 milhões de cabeças de bovinos, o Pará detém o segundo maior rebanho do País, atrás apenas de Mato Grosso. Na última década, o estado amazônico tem sido protagonista nas discussões em busca de uma pecuária mais sustentável, com iniciativas que vão desde o TAC da Carne, assinado entre o MP e os frigoríficos há 15 anos e, mais recentemente, com ações do Executivo estadual em parceria com o setor privado — como a atual com a JBS.

Para Dias, um zootecnista que trabalhou por mais de cinco anos no estado, o Pará está hoje em uma posição “inimaginável” anos atrás. “O Pará está liderando um processo de transparência e de integridade na pecuária, onde toda a cadeia está conversando para que as coisas deem realmente certo. E está sendo olhado pelo Brasil inteiro não como um problema, mas como uma baita oportunidade. Se der certo aqui, todo mundo vai seguir”, afirma.