A freada de arrumação que sacudiu a cadeia produtiva de grãos, respingando no crédito concedido por gestores da Faria Lima, ainda vai levar de dois a três anos para ser concluída. A avaliação é de ninguém menos que Paulo Sousa, o executivo que comanda a Cargill no Brasil.
Quando essa fase passar, companhias como a Cargill estarão preparadas para um novo ciclo de investimentos com bons retornos.
“Vamos ter um período de correção. Isso é bom porque vai gerar retorno para a próxima onda de capex, que vai vir em uns dois a três anos”, previu Sousa em uma conversa de uma hora no Futurum Talks, um podcast descontraído apresentado por Daniel Zukerman e Tio Ricco.
À frente de uma das operações mais relevantes para a gigante do trading global de commodities, o zootecnista de 56 anos argumentou que, em geral, as crises no agro ocorrem após a “fartura de crédito”, até porque isso costuma irrigar o bolso de produtores não estavam acostumados a tanta liquidez.
“Tivemos ferramentas novas que entraram no mercado, como o Fiagro. Só que quem nunca comeu mel, quando come se lambuza”, disparou.
Para o CEO da Cargill no Brasil, a Faria Lima ainda não entendeu a melhor formar de atuar no agronegócio. “A oferta de crédito da Faria Lima é pró-cíclica. Quando está tudo bom, tem um monte de dinheiro. Quando o tempo fecha, corta. Mas para o agro isso não funciona”, criticou.
Na conversa, que foi divulgada ontem à noite, Sousa sugeriu que o período de exuberância nos mercados de soja e milho — de 2021 a 2022, especialmente — trouxe muitos novos entrantes para o mercado de crédito, mas nem todos chegaram no momento certo.
“O crédito para o agro se expandiu muito, com muitos novos entrantes. Geralmente, quem chega por último bebe água bem suja. Essa água deu dor de barriga a diversos”, comentou.
Para lidar com esses problemas, é preciso tempo e relação de confiança com o agricultor, o que nem todos esses entrantes tinham. Esse é, aliás, um dos trunfos da Cargill “Temos relacionamentos de longo prazo. Estamos há 60 anos no Brasil”, lembrou.
Nesse processo, os credores precisam saber como ajudar o produtor, ao invés de simplesmente deflagrar um processo de execução de dívida apenas por que um covenant que quebrou.
“É preciso ter a visão de que o produtor está aqui para o longo prazo. Problema de clima acontece, faz parte do negócio. Vai querer cobrar o cara quando ele não tem como pagar? Desculpa, não é assim que funciona! Existem ferramentas, você alonga a dívida… Quem está no ramo sabe. O produtor vai te pagar”, resumiu Sousa, em um recado à Faria Lima.