Num mercado dominado por gigantes globais como Bunge, ADM, Cargill e Louis Dreyfus, dois empresários de Londrina cavaram um espaço para lançar uma nova trading de grãos, comprando milho e soja em regiões onde as ABCDs nem sempre conseguem acessar.
Em menos de um ano de operação, a Gnova Grains movimentou 220 mil toneladas de grãos, fazendo R$ 315 milhões em receita líquida mesmo sem deter qualquer ativo de armazenagem ou logístico — um diferencial das grandes tradings.
“Tivemos um primeiro ano acima do que imaginávamos. Nossa ideia era ficar no zero a zero, mas tivemos um lucro líquido de R$ 2,4 milhões e um Ebitda na casa de R$ 5,3 milhões”, disse Ronan Giuliangeli, CEO e fundador da Gnova, em entrevista ao The AgriBiz.
Ao conseguir estrear sem queimar caixa – a margem Ebitda da Gnova ficou em 1,7% —, a empresa se animou para acelerar. Neste ano, a trading vislumbra dobrar os volumes movimentados, passando de R$ 550 milhões em faturamento.
Os fundadores da Gnova
Sem ativos logísticos, num modelo asset light semelhante ao início da trajetória da AgriBrasil — trading criada pelo ex-Gavilon Frederico Humberg —, a Gnova se vale da rede de relações construída ao longo dos anos pelos fundadores: Giuliangeli e Fernando Oliveira.
Ronan Giuliangeli é um nome bastante conhecido na cena rural de Londrina. Seu pai, Antônio Luiz Giuliangeli, é um dos fundadores da Agro100, uma rede de revendas agrícolas vendida ao Aqua Capital que atualmente faz parte da Agrogalaxy.
Na antiga revenda, Ronan começou a trabalhar aos 15 anos, passando por várias funções até comandar a originação de grãos. Quando a companhia foi vendida, ele se tornou executivo da Agrogalaxy, de onde saiu como diretor corporativo de originação no fim de 2022 para fundar a Gnova.
Oliveira, sócio na empreitada, também trabalhou da área de originação de grãos as Agro100 e foi gerente na Agrogalaxy até 2021. Antes de fundar a Gnova, comprou grãos para a Modo Agrologística, uma trading sediada na paranaense Cambé, vizinha de Londrina.
Além do Paraná
Para montar a trading, Giuliangeli não ficou restrito aos arredores do Paraná. Além da filial em Londrina, a Gnova opera nos estados de Mato Grosso (de onde compra a maior parte dos grãos), Mato Grosso do Sul, Goiás, Pará, São Paulo, Goiás e Paraná.
O relacionamento legado dos tempos de Agro100 e Agrogalaxy o ajudou a atrair a confiança dos agricultores, um elo crucial para tocar um negócio que se vale muito das compras a prazo.
“95% do volume de grãos que compramos foi a prazo. Isso nos deu uma alavancagem saudável, num ano de Selic ainda alta”, reconheceu o CEO da Gnova. A meta da trading é manter o índice de alavancagem (relação entre dívida líquida e Ebitda) abaixo de 2 vezes.
No relacionamento com os produtores, a trading vem oferecendo uma flexibilidade que, em safras tumultuadas como a última, pode ser um diferencial na originação do volume.
“Muitas vezes, o produtor precisa escoar o produto, mas não quer vender. Aí, embarco a mercadoria e depois a fazemos a fixação do preço. Outras vezes, ele está tem o adubo comprado em dólar. Nós compramos a soja em dólar para ele fazer o hedge”, contou.
Memo não possuindo uma estrutura de transportes, a Gnova acredita que consegue oferecer um custo de frete competitivo graças à forma como desenhou os incentivos para a equipe.
“Se você pegar uma trading tradicional, a estrutura logística dela não fica junto com a comercial. Então, cada equipe tem um P&L para entregar. Esse modelo pode criar um conflito, protegendo demais a margem no frete e, com isso, perdendo no comercial. Aqui, toda remuneração é ligada ao nosso lucro líquido”, argumentou.
Terminal no horizonte
No futuro, a Gnova também planeja contar com uma estrutura logística, possivelmente um terminal de grãos no Arco Norte. Para chegar lá, no entanto, a trading ainda precisa ganhar escala, o que ajudaria a atrair investidores para um empreendimento logístico.
“Ainda tem muito mato alto para cortar nesses primeiros anos, mas temos um projeto de longo prazo para ter, no futuro, uma estrutura no porto, com armazenagem. Mas por pelo menos cinco anos podemos operar da maneira como estamos hoje”.
A trajetória traçada por Giuliangeli é semelhante à estratégia da AgriBrasil, o que talvez não seja uma mera coincidência. Depois de começar com uma operação asset light e ganhar escala, Frederico Humberg investiu em um terminal de grãos no porto de São Francisco do Sul.
Acauã Sena, que foi um dos principais executivos de originação da Agribrasil, é um dos conselheiros da Gnova. Se a trajetória de Humberg servir de se exemplo, Giuliangeli pode mesmo criar uma trading que movimenta bilhões de reais por ano.