Enquanto players tradicionais sofrem com o ritmo de adoção mais lento dos biológicos em meio à ressaca do mercado de grãos, uma iniciativa da Traive e Folio — iniciativa de agricultura orgânica de grãos capitaneada por Luis Barbieri, fundador da Raiar — tenta navegar contra a maré, alavancando as vendas de indústrias de bioinsumos de pequeno e médio porte.
Em parceria, a Folio e a Traive, fintech fundada pelo casal Aline e Fabricio Pezente, estão formatando uma linha de crédito para ajudar na transição para uma agricultura regenerativa. O projeto passa pela capacitação das indústrias de menor porte, aprimorando a qualidade da concessão de crédito e dando acesso a um funding escasso para esse tipo de player.
A linha de crédito também precisa atrair capital filantrópico, um elemento para reduzir os custos do crédito. No jargão do mercado, a linha de crédito funcionaria como um blended finance, com as doações tornando as operações mais acessíveis.
Na semana passada, Traive e Folio comemoraram um primeiro reconhecimento do projeto. A inciativa foi selecionada para o programa da Lab, a aceleradora de finanças climáticas da Climate Policy Iniciative (CPI).
A escolha do projeto dará acesso a uma mentoria da Lab para o desenvolvimento da linha de crédito e a atração dos investidores, um serviço gratuito avaliado em US$ 200 mil.
Em setembro, a operação financeira será apresentada na semana do clima em Nova York. A ideia é que, até lá, o projeto já tenha conseguido atrair os financiadores, indicou Maurício Quintella, diretor de desenvolvimento de negócios da Traive, em entrevista ao The AgriBiz.
Quem pode acessar o crédito
A julgar pelo apetite mais comedido dos investidores para dar crédito à agricultura neste momento de preços baixos dos grãos, as metas são ambiciosas.
Ao longo do primeiro ano, Quintella almeja chegar a US$ 50 milhões. Em dois a três anos, a intenção é alcançar US$ 200 milhões em crédito para financiar a compra dos insumos essenciais para a agricultura regenerativa.
Aproveitando a expertise agronômica e suas conexões com a academia — especialmente a Universidade Federal de São Carlos —, a Folio está incumbida de fazer a seleção das indústrias de bioinsumos que poderão ser contempladas.
De acordo com Quintella, a linha de crédito deve financiar os agricultores que compram bioinsumos em algo entre 10 a 20 empresas de pequeno e médio porte.
Os alvos vão desde companhias de defensivos biológicos até fabricantes de fertilizantes organominerais e sementes e plantas de cobertura. “Tudo o que fortalece a saúde do solo”, resume o executivo da Traive.
Para se enquadrar nos critérios do projeto, as companhias devem faturar até R$ 300 milhões. As maiores companhias de biológicos, como Biotrop e Koppert, ficam de fora do projeto, até porque já têm acesso mais fácil e barato a capital.
Muitos detalhes ainda precisam ser definidos, mas a tendência é que o capital filantrópico — ou catalítico, como também é conhecido — representem em torno de 10% de tudo o que for concedido em crédito. O restante é um crédito convencional, com juros de mercado.
A tecnologia da Traive
Além da expertise agronômica que pode ser oferecida pela Folio, que também vai ajudar a medir o impacto positivo do maior uso de bioinsumos, a iniciativa também precisava de uma ferramenta de análise de crédito.
É justamente aí que a Traive promete oferecer um diferencial para as indústrias de pequeno e médio porto. O software de análise de crédito da fintech é usado por grandes players do mercado de insumos agrícolas, ajudando na análise dos riscos agronômicos e de mercado.
No projeto, as indústrias contempladas terão acesso ao software e a um treinamento para se aprimorarem na análise e concessão de crédito aos agricultores. “Eles vão usar a inteligência da Traive para tomar as decisões de crédito”, disse Quintella.
Para as indústrias beneficiadas pelo projeto, a análise de crédito e o acesso aos recursos pode ser transformador, apostam os envolvidos no projeto.
“Se você tira uma fotografia do balanço dessas empresas hoje, é difícil dar crédito. O que queremos fazer, então, é usar a tecnologia para transferir o risco de crédito delas para o risco do produtor, e com uma lógica de retorno positivo que essas indústrias podem gerar para a saúde do solo”, resume Quintella.
Nos próximos meses, Traive e Folio vão gastar saliva e mentoria para mostrar aos potenciais investidores que o negócio para em pé, trazendo retorno para os credores e o meio ambiente.