Uma das maiores produtoras de cana-de-açúcar do País, a ACP Bioenergia estreou no mercado de dívida verde. Com experiência de sobra no mercado de dívida local — hoje, 21% do funding da companhia vem de CRAs, — a empresa inaugura uma nova avenida de financiamento a partir de uma operação de R$ 100 milhões financiada pelo Rabobank e pelo fundo holandês Agri3.
O veículo de investimento é o resultado de uma parceria entre o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, o próprio Rabobank, a fundação global IDH e o FMO, banco holandês de desenvolvimento para operações sustentáveis. O principal objetivo é financiar projetos de mitigação dos efeitos das mudanças climáticas e de fomento à agricultura regenerativa.
O dinheiro emprestado à ACP Bioenergia vai dar um gás para a companhia intensificar o uso de práticas sustentáveis, como o uso de insumos biológicos e conversão de áreas degradadas de pastagem, além de apoiar programas de treinamento de pessoas e financiar um programa de monitoramento de gases de efeito estufa.
A dívida é a mais longa já tomada pela companhia, com prazo de vencimento de dez anos — usualmente, o prazo dos empréstimos tomados pela empresa é, no limite, de oito anos. Também é mais barata do que a média das operações estruturadas pela empresa em cerca de 1% a 1,5%. Com base nas demonstrações financeiras de 2023, as taxas dos empréstimos que constam no balanço da empresa variam entre CDI+3% a CDI+4%.
“É um funding subsidiado, em um volume relevante, numa das maiores operações que o Agri3 fez no Brasil. A operação mostra para o mercado que a companhia tem práticas sustentáveis e está pronta para assumir esses compromissos de forma séria, desde que sejam sustentáveis econômica e financeiramente”, diz Caio Marchini, diretor financeiro da ACP Bioenergia, ao The AgriBiz.
O compromisso para cumprir as metas estabelecidas pode ser observado no tempo que a operação levou para sair do papel: cerca de um ano. Não houve complicações para estruturar financeiramente a dívida — trata-se de uma cédula de crédito bancário —, mas o tempo foi necessário para a empresa e o fundo ajustarem os ponteiros no que seria possível entregar.
“O fundo não chegou impondo nada, mas escutou o que nós fazemos e, a partir daí, fomos definindo os critérios para a captação. A operação vai formalizar práticas sustentáveis que já temos, não vamos criar nada do zero”, ressalta Marchini.
Mais grãos
Uma das principais oportunidades no escopo da operação está no aumento da área cultivada de grãos pela ACP Bioenergia. A companhia tem uma longa tradição no cultivo de cana-de-açúcar, atividade que começou há mais de 30 anos no interior de São Paulo. Mas, desde 2019, também atua no cultivo de soja e milho no Tocantins.
Considerando o critério de conversão de áreas degradadas, a companhia vê espaço para chegar em 30 mil hectares em curto prazo, superando esse número ao longo do tempo, é claro — não só com os recursos do empréstimo, mas na própria estratégia de crescimento.
A conversão de pastagens degradadas não será uma exclusividade dos grãos, mas uma tese também para a operação de cana. Hoje, a companhia tem 76 mil hectares de área produtiva, divididos em polos no interior de São Paulo, Mato Grosso do Sul e Goiás. A produção soma quatro milhões de toneladas por ano, vendidas a clientes como Raízen e BP.
Além do plantio, a empresa é responsável pelo corte, carregamento e transporte da cana até as usinas. “Temos espaço para expansão orgânica em todos os nossos polos produtivos, inclusive nos mais maduros”, diz Marchini.
Bioinsumos
A empresa, que já tem biofábricas em todos os polos produtivos, vai intensificar o uso de insumos biológicos e pretende expandir pátios de compostagem e as próprias biofábricas. A criação de um inventário de gases de efeito estufa, com o monitoramento das emissões das máquinas, também está nos planos da empresa.
A companhia vai reportar anualmente a evolução dos KPIs ao Agri3, em todas essas frentes. Não foram divulgados mais detalhes a respeito das metas a serem atingidas ao longo dos próximos anos, mas o horizonte de longo prazo foi um fator decisivo para a captação de recursos.
Em 2023, a companhia cresceu 57% em faturamento, com uma receita de R$ 663 milhões. O Ebitda ajustado aumentou 67%, para R$ 458 milhões e o lucro líquido mais do que quintuplicou, chegando a R$ 36 milhões. A dívida líquida da ACP foi de R$ 746 milhões no último ano, representando 1,6 vez o Ebitda.